segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Viva o centenário da Revolução Bolchevique! As raízes históricas do leninismo I.V. Stáline1 1924

O leninismo cresceu e tomou a sua forma definitiva nas condições do imperialismo, quando as contradições do capitalismo chegaram a um ponto extremo, quando a revolução proletária se tornou uma questão prática imediata, quando o antigo período de preparação da classe operária para a revolução terminou e se transformou no período de assalto directo contra o capitalismo. 

Lénine qualificava o imperialismo de «capitalismo agonizante». Porquê? Porque o imperialismo leva as contradições do capitalismo até últimas marcas, até aos limites extremos, após os quais começa a revolução. 

Três destas contradições devem ser consideradas as mais importantes. A primeira contradição é a que existe entre o trabalho e o capital. O imperialismo é a omnipotência dos trusts e dos monopólios, dos bancos e da oligarquia financeira nos países industriais. Os métodos habituais da classe operária para lutar contra esta omnipotência – os sindicatos e as cooperativas, os partidos parlamentares e a luta parlamentar – revelaram-se totalmente insuficientes. Ante as massas de milhões de proletários, o imperialismo coloca a questão da seguinte forma: ou se entregam à mercê do capital, vegetando como antigamente e deixando-se degradar, ou lançam mão de novas armas. O imperialismo conduz a classe operária à revolução. 

A segunda contradição é a que existe entre os diferentes grupos financeiros e potências imperialistas na sua luta pelas fontes de matérias-primas e por territórios alheios. O imperialismo é a exportação de capitais para as fontes de matérias-primas, a luta furiosa pela posse monopolista destas fontes, luta pela repartilha de um mundo já partilhado, a luta, conduzida com particular exasperação por parte dos novos grupos financeiros e das novas potências em busca de «um lugar ao sol», contra os velhos grupos e potências, que se agarram tenazmente às suas conquistas. Esta luta furiosa entre os diversos grupos capitalistas é digna de nota na medida em que encerra, como elemento inevitável, as guerras imperialistas, as guerras pela conquista  dos territórios alheios. Por seu turno, esta circunstância é também digna de nota na medida em que conduz ao mútuo enfraquecimento dos imperialistas, ao enfraquecimento das posições do capitalismo em geral, à aproximação do momento da revolução proletária e à necessidade prática desta revolução. 

A terceira contradição é a que existe entre um punhado de nações «civilizadas» dominantes e as centenas de milhões de pessoas dos povos colonizados e dependentes do mundo. O imperialismo é a mais descarada exploração e a mais desumana opressão de centenas de milhões de habitantes das vastas colónias e países dependentes. O objetivo desta exploração e desta opressão é a extorsão de super lucros. Mas para explorar esses países, o imperialismo é forçado a construir neles caminhos-de ferro, empresas industriais, centros de comércio e indústria. Os resultados inevitáveis desta «política» são o surgimento da classe dos proletários, o nascimento de uma intelectualidade local, o despertar da consciência nacional, o recrudescimento do movimento de libertação. Isto é atestado com clareza pelo recrudescimento do movimento revolucionário em todas as colónias e países dependentes sem excepção. Esta circunstância é importante para o proletariado na medida em que mina pela raiz as posições do capitalismo, transformando as colónias e os países dependentes de reservas do imperialismo em reservas da revolução proletária.

 Estas são, em geral, as contradições principais do imperialismo, que transformaram o antigo capitalismo «florescente» em capitalismo agonizante. A importância da guerra imperialista desencadeada há dez anos reside, entre outros, em ter juntado num só novelo todas estas contradições e as ter lançado no prato da balança, acelerando e facilitando as batalhas revolucionárias do proletariado. Por outras palavras, o imperialismo levou não só a que a revolução se tornasse uma inevitabilidade prática, como também a que se criassem as condições favoráveis para o assalto direto à fortaleza do capitalismo. Esta foi a situação internacional que gerou o leninismo. Dir-nos-ão que tudo isto está certo, mas a que propósito surge aqui a Rússia, uma vez que não era nem podia ser um país clássico do imperialismo? A que propósito surge aqui Lénine, que trabalhou sobretudo na Rússia e para a Rússia? Porque é que foi precisamente a Rússia o lar do leninismo, a pátria da teoria e da tática da revolução proletária? 

Porque a Rússia era o ponto nodal de todas estas contradições do imperialismo. Porque a Rússia, mais do que qualquer outro país, estava prenhe da revolução e, em virtude disto, só ela estava em condições de resolver estas contradições pela via revolucionária. A começar logo pelo facto de a Rússia tsarista ser o foco de todos os tipos de opressão – capitalista, colonial e militar – que assumiam as suas formas mais bárbaras e desumanas. Quem ignora que a omnipotência do capital se fundia na Rússia com o despotismo tsarista, a agressividade do nacionalismo russo, com as atrocidades do tsarismo para com os povos não russos, a exploração de regiões inteiras – Turquia, Pérsia, China – com a ocupação destas regiões pelo tsarismo, com as guerras anexionistas? Lénine tinha razão quando disse que o tsarismo era o «imperialismo militar-feudal». O tsarismo concentrava os aspetos mais negativos do imperialismo, elevados ao quadrado. Mais. A Rússia tsarista era a reserva mais importante do imperialismo ocidental, não só na medida em que dava livre acesso ao capital estrangeiro, que detinha ramos tão decisivos da economia nacional russa como os combustíveis e a metalurgia, mas também na medida em que podia colocar milhões de soldados do lado dos imperialistas ocidentais. Recordemo-nos do exército russo com 14 milhões de homens que verteu o seu sangue nas frentes imperialistas para assegurar lucros fabulosos aos capitalistas anglo-franceses. Mais. O tsarismo não era apenas o cão de guarda do imperialismo no Leste da Europa, era também uma rede de agentes do imperialismo ocidental, que extorquia centenas de milhões à população para o pagamento dos juros dos empréstimos que Paris, Londres, Berlim e Bruxelas lhe concediam. Finalmente, o tsarismo era o mais fiel aliado do imperialismo ocidental na partilha da Turquia, da Pérsia, da China, etc. Quem ignora que a guerra imperialista foi conduzida pelo tsarismo enquanto aliado dos imperialistas da Entente e que a Rússia era um elemento essencial dessa guerra? Eis por que os interesses do tsarismo e do imperialismo ocidental se entrelaçavam, fundindo-se, ao fim e ao cabo, numa rede única de interesses do imperialismo.

 Poderia o imperialismo ocidental resignar-se com a perda de uma escora tão poderosa no Oriente e de uma reserva tão rica em forças e recursos como era a velha Rússia tsarista e burguesa, sem pôr à prova todas as suas forças numa luta de morte contra a revolução na Rússia, a fim de defender e conservar o tsarismo? Claro que não podia! Mas daqui decorre que quem quisesse atacar o tsarismo teria inevitavelmente de levantar-se contra o imperialismo, quem se sublevasse contra o tsarismo teria de se sublevar também contra o imperialismo, uma vez que quem derrubasse o tsarismo, teria de derrubar também o imperialismo, caso pensasse realmente não só em derrotar o tsarismo, mas também em acabar com ele completamente. Deste modo, a revolução contra o tsarismo aproximava-se e teria que transformar-se numa revolução contra o imperialismo, numa revolução proletária. Entretanto, irrompia na Rússia uma grande revolução popular, à frente da qual estava o proletariado mais revolucionário do mundo, que dispunha de um aliado tão importante como o campesinato revolucionário da Rússia.

 Será preciso demonstrar que tal revolução não poderia parar a meio caminho, que, em caso de êxito, teria de prosseguir em diante, erguendo a bandeira da insurreição contra o imperialismo? Eis porque a Rússia tinha que se tornar o ponto nodal das contradições do imperialismo, não só na medida em que era precisamente na Rússia que estas contradições se revelavam com maior facilidade, em virtude do seu carácter especialmente hediondo e intolerável, e não só porque a Rússia era o mais importante esteio do imperialismo ocidental, que ligava o capital financeiro do Ocidente às colónias do Oriente, mas também porque só na Rússia existia uma força real capaz de resolver as contradições imperialistas por via revolucionária. Mas daqui decorre que a revolução na Rússia não podia deixar de se tornar proletária, não podia deixar de adquirir, desde os primeiros momentos do seu desenvolvimento, um carácter internacional, e não podia, portanto, deixar de abalar os próprios alicerces do imperialismo mundial. Poderiam os comunistas russos, num tal estado de coisas, limitar a sua actividade ao âmbito estritamente nacional da revolução russa? Claro que não! Pelo contrário, toda a situação, tanto a interna (profunda crise revolucionária), como a externa (a guerra), impelia-os a ultrapassar esse âmbito, a levar a luta ao plano internacional, a pôr a descoberto as chagas do imperialismo, a demonstrar a inevitabilidade da falência do capitalismo, a destroçar o social-chauvinismo e o social-pacifismo e, por fim, a derrotar o capitalismo no seu país e forjar uma nova arma de luta para o proletariado: a teoria e a tática da revolução proletária, com o fim de facilitar aos proletários de todos os países a tarefa do derrubamento do capitalismo. Os comunistas russos não poderiam agir de outro modo, pois só por esta via se podia esperar certas alterações na situação internacional, que pudessem dar garantias à Rússia contra a restauração do regime burguês. Eis porque a Rússia se tornou o lar do leninismo e o líder dos comunistas russos, Lénine, o seu criador. 

Com a Rússia e com Lénine «aconteceu» mais ou menos o mesmo que havia acontecido com a Alemanha e com Marx e Engels nos anos 40 do século XIX. Como a Rússia dos princípios do século XX, a Alemanha estava, então, prenhe de uma revolução burguesa. Nessa época, Marx escreveu no Manifesto Comunista: «Para a Alemanha dirigem os comunistas a sua atenção principal, porque a Alemanha está em vésperas de uma revolução burguesa e porque leva a cabo esta revolução em condições de maior progresso da civilização europeia em geral e com um proletariado muito mais desenvolvido do que a Inglaterra no século XVII e a França no século XVIII, porque a revolução burguesa alemã só pode ser, portanto, o prelúdio imediato de uma revolução proletária.» Por outras palavras, o centro do movimento revolucionário tinha-se transferido para a Alemanha. Dificilmente se poderá duvidar de que foi precisamente esta circunstância, assinalada por Marx na passagem citada, a razão provável de a Alemanha se ter tornado o berço do socialismo científico e os líderes do proletariado alemão, Marx e Engels, os seus criadores.

 O mesmo se pode dizer, ainda com mais propriedade, em relação à Rússia dos princípios do século XX. Neste período, a Rússia encontrava-se em vésperas de uma revolução burguesa, que deveria levar a cabo em condições que eram as mais progressistas na Europa e com um proletariado mais desenvolvido do que o da Alemanha dos anos 40 do século XIX (sem falar, sequer, da Inglaterra e da França); sendo que tudo indicava que esta revolução iria ser o fermento e o prólogo da revolução proletária. Não se pode considerar um acaso que ainda em 1902, quando a revolução russa apenas começava, Lénine tenha escrito no livro Que Fazer? estas palavras proféticas: «A história coloca-nos hoje (isto é, diante dos marxistas russos) uma tarefa imediata, que é a mais revolucionária de todas as tarefas imediatas do proletariado de qualquer outro país.  O cumprimento desta tarefa, a destruição do baluarte mais poderoso, não só da reacção europeia, mas também (podemos hoje dizê-lo) da reacção asiática, tornaria o proletariado russo a vanguarda do proletariado revolucionário internacional». Por outras palavras, o centro do movimento revolucionário deveria transferir-se para a Rússia. 

É sabido que o desenvolvimento da revolução na Rússia justificou de sobejo esta predição de Lénine. Será de estranhar, depois disto, que o país que realizou uma tal revolução e que dispunha de um tal proletariado tenha sido o berço da teoria e da táctica da revolução proletária? Será de estranhar que o líder deste proletariado, Lénine, tenha sido ao mesmo tempo o criador desta teoria e desta táctica do proletariado internacional?

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