sábado, 6 de maio de 2023

Primeiro de Maio. Romper o bloqueio!

 Colocar a luta de classes no centro da acção, contrapondo os interesses próprios dos trabalhadores aos interesses da burguesia capitalista, é o factor indispensável para estimular e dar rumo à resistência de massas. Apenas a partir de uma clara posição de defesa de interesses de classe podem os trabalhadores conduzir um movimento capaz de travar a sua despromoção na escala social, cortar caminho ao novo fascismo, reverter o rumo político do país.

Editor  — "jornalmudardevida.net"

5 Maio 2023 

 

Falemos dos últimos 48 anos, decorridos desde o fim do PREC em novembro de 1975. 

                         Primeiro de Maio. Romper o bloqueio!

De governo em governo, o ataque aos trabalhadores foi sempre aumentando. Não obstante a resistência das greves, dos protestos e das manifestações, apesar do esforço de militantes, de sindicalistas e activistas diversos, esta evolução não pôde ser invertida. O curso dos acontecimentos contribui para espalhar a ideia de que não há alternativa à força do capitalismo, dos patrões, dos políticos que os servem.

No quadro das instituições 

A actual correlação de forças entre Trabalho e Capital coloca em causa a acção tradicional da esquerda de conformar a luta dos trabalhadores aos limites da ordem vigente.

Não está à vista, com efeito, a possibilidade de eleger, no actual “Estado de direito democrático”, um governo que defenda os trabalhadores. Mesmo fazendo apelo ao sentimento de unidade das massas populares, não será a aposta numa solução parlamentar, no quadro das instituições, que conseguirá alterar a balança das forças políticas e sociais. 

A experiência recente do apoio dado pela esquerda parlamentar aos dois primeiros governos de António Costa assim o comprovam. A recuperação apenas parcial das tremendas perdas sofridas durante o anterior governo PSD-CDS-troika aliviou pontualmente algumas das condições de vida dos trabalhadores, alimentou uma esperança passageira de mudança — mas não conseguiu criar uma tendência nova que revertesse o rumo da austeridade, que travasse a perda de direitos dos assalariados e, menos ainda, que conferisse maior poder político ao povo.

Quase oito anos depois do afastamento do bando Coelho-Portas, o grosso das receitas do Estado serve para pagar a colossal dívida privada, com prejuízo dos serviços públicos. Os milhões do PRR alimentam empresários ávidos de dinheiro fácil que nada se preocupam com as necessidades de quem trabalha. O país foi arrastado para uma guerra ditada por interesses alheios, obedecendo sem réplica à UE e aos EUA e dispondo-se a aumentar gastos socialmente inúteis. A direita fascista, contando com a tolerância das instituições democráticas, encontra campo para se reorganizar e explorar o descontentamento popular.

Romper o bloqueio

Para poder tomar medidas contra o grande capital, rejeitar o rumo ditado por Bruxelas, desligar o país das guerras da NATO, deter a fascização das instituições, o movimento popular precisa de romper o bloqueio que o tem limitado. Esse bloqueio é a sua sujeição voluntária à ordem capitalista. 

Para poder travar a ofensiva do capital e ter hipóteses de inverter o rumo político do país, a luta de massas tem de ter por alvo o regime capitalista, em todos os seus aspectos: económico, social, institucional, moral. Para isso, é preciso renovar o interesse dos trabalhadores pela política, renovar a convicção de que só pela sua própria intervenção as condições da sua vida poderão mudar. 

Foi esse o sinal de partida dado pelo gigantesco Primeiro de Maio de 74: os trabalhadores decidiram entrar na política e atacar, por sua própria iniciativa, os problemas que os afectavam como classe. 

Foi essa disposição para agir que lhes permitiu derrotar os dois primeiros golpes reaccionários de setembro de 74 e de março de 75 intentados pela burguesia organizada em torno da ala direitista das Forças Armadas. Foi essa disposição — assumida pelo operariado mais consciente do seu papel político e mais disposto para a luta — que empurrou para a frente o sector do MFA mais próximo das aspirações populares e fez paralisar os hesitantes. Foi assim que o movimento popular em conjunto conseguiu, a partir daí, ter uma palavra determinante nas transformações sociais conseguidas durante quase todo o ano de 75.

Colocar a luta de classes no centro da acção, contrapondo os interesses próprios dos trabalhadores aos interesses da burguesia capitalista, é o factor indispensável para estimular e dar rumo à resistência de massas. Apenas a partir de uma clara posição de defesa de interesses de classe podem os trabalhadores conduzir um movimento capaz de travar a sua despromoção na escala social, cortar caminho ao novo fascismo, reverter o rumo político do país.

Reerguer a luta contra o Capital

Só por ingenuidade, ou por ignorância acerca da natureza da crise que o país e o mundo atravessam – e acerca dos meios postos em marcha pela burguesia para a debelar – se pode pensar que o caminho para resolver os conflitos sociais está na busca de uma fórmula de equilíbrio que concilie todos os interesses em presença. Os trabalhadores não podem alimentar a esperança de inverter o rumo de penúria e de marginalização política para que são empurrados sem tocar nos interesses do Capital. 

Toda a vida social está a ser conduzida numa via de retrocesso. Perante isso, a luta de massas, para dar frutos, tem de atacar as bases do regime. É o sistema de exploração que tem de ser posto em causa — não há ganhos para ambos os lados entre Capital e Trabalho. 

Muitas camadas sociais são atingidas pela crise económica. Multiplicam-se por isso os protestos e as acções de rua, cresce o descrédito nos governos e nas instituições. 

Mas os efeitos da austeridade não são uniformes. As consequências mais violentas abateram-se e abatem-se em primeiro lugar sobre a classe operária produtiva e sobre os empregados pobres, na forma de despedimentos colectivos, salários não pagos, emprego precário, horários prolongados, cortes nos apoios sociais, carestia da alimentação e da habitação. 

As lamentações oficiais sobre os sacrifícios impostos “às classes médias”, que são efectivos e justificam a sua revolta, não passam — na boca dos órgãos do poder e dos profissionais da caridade —  de uma tentativa para comprar a tolerância destas camadas e disfarçar a natureza de classe do ataque aos trabalhadores.

Para conduzir as acções de massas a patamares superiores é preciso que o operariado e as faixas mais pobres dos trabalhadores assalariados tenham na luta um papel preponderante.

Mas se os trabalhadores não combaterem a situação a partir dos seus interesses próprios — fustigando o Capital, as suas instituições e as suas podridões — serão a direita e a extrema-direita a capitalizar o descontentamento das massas populares com o sistema político e todas as taras em que ele é pródigo.

Classe contra classe

Debilitados política, ideológica e organizativamente por mais de quarenta anos de retrocesso social e derrotas políticas, os trabalhadores portugueses não encontram ainda saída que os liberte dos custos da crise económica e social. Mas, para um número crescente, não é a confiança no capitalismo que os leva a aceitá-lo — é antes a noção real de que não há um programa político coerente que o substitua, e de que não há força organizada que o possa deitar abaixo.

À medida, porém, que a brutalidade das medidas de austeridade tornam num inferno a vida de milhões de famílias impõe-se a conclusão de que a luta só será eficaz se ferir os interesses do Capital. Reclamar medidas que empurrem os custos do descalabro social para cima dos capitalistas é a única via de o movimento de resistência acumular a força que lhe permita travar a ofensiva do poder. 

Reerguer a luta contra o Capital não é, portanto, nas condições actuais, uma utopia, nem representa um estreitamento do campo de apoio à luta de massas. Pelo contrário, é a condição de fazer despertar o sentido de classe dos trabalhadores, de os colocar na dianteira da acção e de alargar o campo da resistência popular.

Justamente nas épocas de crise como a que estamos a viver, em que o antagonismo entre Capital e Trabalho se exacerba e fica mais claro, torna-se não só necessário mas obrigatório atacar o próprio sistema de exploração.

A defesa do que resta das conquistas de Abril — isto é, das conquistas arrancadas durante os dezanove meses do PREC — soará como frase vazia se não for parte de uma acção apontada para o futuro, que faça frente ao capitalismo de hoje e ao seu cortejo de misérias actuais. É no curso dessa acção que podem ter sucesso as diversas reivindicações levantadas por diferentes sectores: mulheres, jovens, imigrantes, minorias, moradores, ecologistas, etc. 

Nada de novo se fará em Portugal sem que o proletariado se torne politicamente independente e ouse levantar as suas exigências de classe contra os interesses do Capital.

 

(Extraído e adaptado do manifesto Enfrentar a crise, lutar pelo socialismo – uma perspectiva comunista, dezembro 2012)

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