quinta-feira, 9 de agosto de 2018

"A caridade dos burgueses"da obra de Paul Lafargue, em "Porquê crê em Deus a burguesia".

"A caridade dos burgueses"

A burguesia, para aumentar a sua fortuna — que é uma acumulação de espólios cometidos à custa do trabalho salariado — tem necessidade de poder dispor duma numerosa população de operários livres, desorganizados, sem nenhuma proteção e suficientemente pobres para se verem obrigados a vender por vil preço a sua força de trabalho. A burguesia dividiu sistematicamente os trabalhadores da opressão feudal, destruiu as suas organizações cooperativas e desfez algumas vantagens que lhe oferecia a religião: — os dias feriados da igreja católica, que, com os 52 domingos elevavam a 90 as festas do ano, durante as quais, no antigo regime, não era permitido trabalhar, o que constituía um obstáculo para a exploração do operário, e bem assim a distribuição de sopa e viveres que continuavam praticando alguns conventos, e que traziam de certo modo, aos operários necessitados, um complemento dos seus salários.

O protestantismo, para dar satisfação aos burgueses industriais, que eram muito numerosos nas suas filas, condenou a esmola em nome da religião e aboliu os santos do céu para achar motivo na supressão dos dias feriados na terra.

A revolução de 1789 fez mais. A religião reformada tinha conservado o domingo, mas os burgueses revolucionários, achando que um dia de descanso em cada sete dias era demasiado, substituíram a semana pela «década», e, afim de enterrar definitivamente a memória dos dias feriados, substituíram no calendário republicano os santos por nomes de metais, de plantas e de animais. A lei de 24 de Setembro declarou delito a esmola.

A economia política, esta outra expressão intelectual dos interesses materiais da classe burguesa, secundou a religião reformada em seus atentados contra as instituições de previsão da classe operária: — os aprovisionamentos de trigo feitos pelas municipalidades, a regulamentação do preço de viveres e a «Casa Annonaria» êste modelo das instituições de previsão legado pelo paganismo ao papado, foram objeto de críticas acerbas dos Fisiocratas, de Condorcet, do abade Galiani e de outros, que se tinham convertido nos predicadores da liberdade do comércio dos trigos, que Necker comparava à maior mesa de jogo que possa estabelecer-se, pois «com um só milhão — dizia — se poderia fazer um povo faminto».

Sem embargo, a produção moderna, que para desenvolver-se deve achar trabalho em abundância e a preço reduzido — para o qual os revolucionários burgueses transformaram as condições de vida dos operários e aboliram as corporações e as instituições de previsão do antigo regime — tinha criado, desde o seu aparecimento, um excesso de população operária à qual não podia garantir trabalho, seu único modo de vida.

O número de vagabundos e de mendigos, uma das incuráveis chagas da civilização, passara a ser tão considerável, que, a partir do século XVI, a França teve que adoptar penas terríveis contra eles: — eram condenados ao látego, a ser marcados e a ser enforcados. Estas penas foram modificadas durante o período revolucionário do século XVIII. A lei de setembro, do segundo ano, anteriormente citada, obrigava o mendigo a residir na sua terra natal, a qual devia organizar oficinas para ocupá-lo. Se se atrevia a abandonar a sua população, era condenado à prisão e a trabalhos forçados, e, em caso de reincidência, à deportação para a ilha de Madagáscar.

Durante o reinado de Luiz XV, abriram-se depósitos para os mendigos, que eram verdadeiras prisões onde se maltratava os vagabundos para fazê-los aborrecer a vida errante. O mesmo fenômeno de excesso de população se produzira na Inglaterra, e, como apesar da bárbara repressão, as hostes dos vagabundos e mendigos — lançados pela transformação das terras aráveis em terras de pastagens aumentavam incessantemente — teve-se, neste país da reforma protestante, de completar os castigos por caridade. Com efeito, durante o reinado de Isabel, decretou-se as «Poor-laws» (leis dos pobres), que impunham a cada paróquia o sustento dos seus. Estas leis estão, todavia, em vigor e contribuem para este paradoxal resultado de caridade burguesa: — que o sustento dos pobres corre a cargo dos mesmos pobres. Assim, por exemplo, as paróquias ricas de Londres, de onde o elevado custo dos alugueis afugenta os indigentes, não satisfazem o imposto, enquanto que, nos distritos operários, onde se amontoam, se veem forçados a fazer grandes sacrifícios para atendê-los. A burguesia criava os pobres para dar-lhes trabalho a preço reduzido, mas, quando aqueles recebiam o número que podia ocupar com proveito seu, recambiava-os para as cidades, restituíam-nos às povoações de origem e condenava-os ao cárcere e aos castigos corporais. Fazia crime da miséria que não lhe produzia riquezas.

A questão dos pobres adquiriu um carácter agudo após os primeiros dias da Revolução de 1789. Bailly, que acabava de ser eleito vereador de Paris, para aliviar as misérias dos trabalhadores que a crise política deixava sem ocupação, reuniu-os em número de 18.000, nas alturas de Montmartre. Os vencedores da Bastilha guardavam-nos com canhões, de mechas acesas.

Esta conduta dos burgueses revolucionários, empreendendo a luta pela «emancipação da humanidade», segundo diziam, indicava à classe operária o tratamento que devia esperar da burguesia vitoriosa.

Quando, porém, para resistir às monarquias europeias coligadas, fora preciso fazer um chamamento ao valor das massas populares, os burgueses revolucionários usavam outra vez da força para impor-lhes respeito, prometendo, solenemente, distribuir aos soldados da República mil milhões dos bens dos emigrados. Então, acariciaram os pobres com as declarações demagógicas dos padres da igreja e dos bispos de Constantinopla e de Alexandria. Oito meses depois de ser votada a lei de setembro, ano segundo, a qual não se atreveram a aplicar, Barrere, em 22 de maio do mesmo ano, leu em nome do Comitê de Saúde Pública — na convenção, — uma memória sobre a extirpação da mendicidade..., a qual constituo uma acusação e uma denúncia flagrante contra o governo... « O quadro da mendicidade, não tem sido, até agora, sobre a terra, mais do que a história da conspiração dos proprietários contra os proprietários». Enquanto os membros da Convenção, davam como ração aos pobres a mera fraseologia filantrópica, iam-se apoderando dos bens do clero e dos hospícios que pertenciam aos deserdados e distribuíam aos proprietários os bens comuns, cuja supressão fez aumentar nos campos o número de trabalhadores reduzidos à mendicidade.

Se a guerra não tivesse alistado e lançado nas fronteiras milhares de operários e aldeões sem trabalho e sem meios de vida, teria havido, possivelmente, um levantamento em toda a França, nas cidades e nos campos.

A guerra era um meio mais eficaz de desembaraçar-se dos pobres que amontoá-los em Montmartre, assestando sobre eles os canhões dos vencedores da Bastilha, metamorfoseados, convertidos em cães de fila da ordem burguesa que nascia.

A revolução imprimiu uma marcha acelerada ao movimento industrial. A burguesia, aproveitando-se da liberdade conquistada com a supressão dos jurados, das corporações e dos entraves de todos os gêneros que o regime deposto oferecia ao comércio e à indústria, estabelecia fábricas e desenvolvia as já existentes.

Não tardou, por isso, a lutar-se com falta de carne de trabalho, o que se explica por a guerra ter ceifado um número considerável de operários válidos e adultos. Havendo falta de homens, lançou-se mão às crianças, cujo emprego industrial as corporações então extintas tinham proibido. Antes da revolução, os meninos menores de 14 anos não podiam ser explorados nas fábricas, e, acima desta idade, eram poucos em número. O emprego de muitos menores de 14 anos na fábrica de papeis pintados de Réveillon, excitara a cólera dos artistas do arrabalde de Saint Antoine, os quais a incendiaram enquanto se procedia, em Paris, à eleição dos deputados para os estados gerais de 1789.

A questão do trabalho, tal como a da miséria, foi pleiteada desde os começos da revolução. Não bastando os filhos dos operários e dos artistas para as necessidades do consumo industrial, lançou-se mão dos órfãos e das crianças recolhidas pela caridade pública.

«.La Décade»— «o órgão filosófico, literário e político» dos ideólogos e dos economistas, assinala como um triunfo da filantropia o que Boyer-Tondedre, irmão do convencionalista, «proprietário de uma importante fábrica de Toulouse, tenha sido autorizado para escolher 500 meninos dos hospícios e empregá-los nas suas oficinas.... Deste modo, associou à sua fábrica os hospícios de Toulouse, Montpellier, Carcassone e dos povos que a rodeavam». (20 de Março, ano sexto). A exploração industrial da criança e da mulher, que desfez a família operária, é um dos triunfos da filantropia.

Nutrir barato os trabalhadores, para reduzir os salários, era uma das preocupações filantrópicas dos fabricantes e dos economistas do século XVÍII. O trigo era, segundo a sua opinião, um meio excessivamente caro para nutrir os operários:— acolheram, por isso, com júbilo, a batata, de Parmentier. J. B. Say, fê-la melhor: — encontrou a banana [1].

«La Décade», de 10 de Abril do ano oitavo aconselhava, para nutrir o povo economicamente, substituir «o pão de trigopor um pão que se fabricaria com farinhas de cevada, aveia, milho, favas, batatas e de castanhas».

Quando os franceses estudaram a revolução com sangue-frio e sem prejuízos de classe, aperceberam-se de que as ideias que lhe imprimiram o carácter de grandeza eram provenientes da Suissa, onde a burguesia já se tinha apoderado do poder. Foi de Genebra que Candolle. importou as «cozinhas económicas», que tanto furor fizeram em Paris revolucionário, porque proporcionaram aos pequenos artistas um alimento são e agradável...» «Os diretores de fábricas — escreve «La Décade» —deveriam estabelecer em suas oficinas uma caldeira para cozinhar, com evidente vantagem duns e doutros... Não é só o homem sensível que participa das vantagens desta instituição; a política vê que, assegurando ao pobre uma nutrição pouco dispendiosa, tem segura a tranquilidade do Estado».

O conde de Runford, que se apelidou o ministro da humanidade, achava-se à frente dum comité que estabelecia cozinhas económicas nos arredores de Saint Antoine e noutros bairros de Paris. O seco e enrugado Volney não podia deixar de enternecer-se a contemplar «esta reunião de homens de honrosa posição cuidando duma panela de sopa» («Décade», 10 de nivox (Dezembro) ano décimo).

Eis aqui o que destruía as promessas e a fraseologia demagógica da convenção. A filantropia, cujo nome não apareceu em língua francesa até meados do século XVIII, fazia a sua entrada triunfal na França revolucionária para substituir a caridade -cristã.

***
A revolução preparava o terreno social para o advento da produção mecânica, que encontrava abundantemente e a baixo preço os trabalhadores que necessitava para desenvolver-se e enriquecer a classe capitalista.

O proletariado, a classe produtora, é de criação moderna. Esta classe distingue-se das classes oprimidas e exploradas dos tempos passados. O proletário é um cidadão que disfruta, pelo menos em teoria, de direitos políticos, mas não possui propriedade nem garantia social de espécie alguma: — vive durante o dia do seu salário, que é o preço em troca do seu trabalho.

Se o capitalista deixa de ter necessidade desta força de trabalho, deita-a para a rua, sem que se importe com a sorte do operário ou da sua família.

Se, no começo da indústria capitalista, esta carecia de braços, como a agricultura dos nossos, dias, a máquina-ferramenta fez desaparecer este inconveniente tornando possível o emprego industrial da mulher e da criança e originando um excesso de população que Engels designa com o nome de exército de reserva do trabalho. O capitalista já não receia as exigências operárias; faz a lei para os proletários, fixa despoticamente os salários e as horas de trabalho, afixa os regulamentos da fábrica e impõe as multas e os despedimentos. O pauperismo da sociedade capitalista torna-se igualmente distinto do pauperismo das sociedades anteriores.

As classes deserdadas das cidades antigas dividiam-se em três categorias: — os escravos, os artistas e trabalhadores manuais e os pobres; a maioria destes últimos não conhecia ofício algum, nem queria exercer outro que não fosse o das armas. O Estado e os ricos cuidavam deles. Primeiro, por um sentimento de fraternidade e depois pelo medo dos seus tumultos. Todavia não os exploravam industrialmente.

Depois do século IV, antes de Jesus Cristo, estes pobres, muito numerosos na Grécia, encontram-se guerreando em todos os exércitos na qualidade de mercenários; vendiam até os seus serviços aos bárbaros (persas, cartagineses, etc), para combater os gregos. Após a conquista da Ásia por Alexandre, e da Grécia pelos romanos, espalharam-se por todo o mundo, exercendo as funções de soldados rheteurs, filósofos, médicos, administradores e parasitas.

Os pobres da sociedade capitalista, fisiologicamente empobrecidos por um trabalho monótono, anti-higiênico e prolongado até ao esgotamento das suas forças, por uma alimentação insuficiente e má e pelo alcoolismo, tuberculose, raquitismo, etc, não possuem o vigor físico, a cultura intelectual e o ardor combativo dos pobres da sociedade antiga; bastam, por isso, as forças da polícia, relativamente fracas, para contê-los. A docilidade e a mansidão que se observam no proletariado, são contemporâneas: — datam apenas de meio século, aproximadamente.

As penúrias frequentes da segunda metade do século XVIII, motivadas pelo rápido crescimento das populações urbanas, pela falta de caminhos e pela imperfeição dos meios de transporte, provocaram tumultos que prepararam o povo dos campos para a revolução.

Um déficit sensível na colheita de cereais era, ainda na primeira metade do século XIX, susceptível de produzir agitações populares. A má colheita de 1847 foi uma das causas ocasionais da revolução de 1848. Os pobres inspiravam então terror às classes governantes. A sua nutrição era uma das preocupações dos homens de Estado. Os governos mais reacionários não vacilavam, quando a colheita fora má, em suspender as tarifas alfandegárias e em estimular as importações estrangeiras para deter a alta do preço do pão. O medo aos pobres está hoje desvanecido, e os ministros e os deputados votam tranquilamente os direitos protetores para fazer o pão caro... Os chefes da indústria, que no segundo império reclamavam, não obstante a entrada franca de cereais e de gado, a fim de que os operários pudessem alimentar-se a preços reduzidos, têm tamanha confiança em poder manter os salários na sua expressão mais ínfima — qualquer que seja o preço dos víveres — que já não se interessam pela alimentação operária, fazendo até causa comum com os agrários, interessados em impor direitos elevados à entrada da carne e dos cereais.

As classes ricas, sentem-se de tal forma protegidas contra qualquer revolta dos pobres — pelo costume e pela resignação destes à sua sorte miserável — que nem sequer se preocupam.

Estas classes temem só as reivindicações individuais e anarquistas, ou sejam os roubos e os assassinatos. Todavia, negam-se a investigar acerca das causas dos delitos e dos crimes, cujo número aumenta à medida que a civilização progride, ante o receio de ter que reconhecer que a ordem social de que eles beneficiam, é a única responsável da sua origem. Os legisladores que votam as leis e os magistrados que as aplicam, estão muito longe de considerar o livre alvedrio, o espiritualismo e o cristianismo como um dogma intangível da justiça e conceituam que o criminoso é o único responsável das faltas cometidas.

Lombroso e a sua escola de farsantes, pretendendo descobrir na organização física do criminoso a causa dos seus delitos, não fizeram outra coisa senão pôr a descoberto uma aparência de falsa ciência anatómica para os confirmar em sua opinião. Sem embargo, há três quartos de século, Quetelet chamou a atenção sobre as relações que existem entre o número de delitos e de crimes cometidos e o preço do trigo. Quando Quetelet realizava as suas estatísticas comparadas, o preço do pão estava sujeito a grandes variações, que podiam constituir um principal factor do brusco crescimento da criminalidade. Há meio século, porém, particularmente depois da enorme produção de cereais dos Estados-Unidos, que data de 1880, o preço do pão oscila debilmente em volta de um preço médio, o que não impede que a criminalidade aumente sem cessar e que durante determinados anos este aumento adquira ainda maiores proporções. Admitindo ainda que o preço do pão constitua uma causa constante da criminalidade, precisa, todavia, do aceleramento momentâneo de alguma coisa mais do que o preço do pão.

Utilizando as estatísticas publicadas de 1826 a 1880 pelo Ministério da Justiça, analisei a ação que podiam ter sobre a criminalidade os conflitos do comércio e da indústria, que se traduzem por quebras e que precedem e acompanham as reduções de salários e «chômage»; descobri que o número de delitos e de crimes aumentava bruscamente quando o das quebras aumentava, para diminuir quando os negócios se reanimavam. Os assassinatos não pareciam sofrer a influência das quebras; os atentados ao pudor eram, em razão inversa, mais numerosos durante os anos de prosperidade, quando as quebras diminuíam. Durante a época de quebras persistentes e de intensa crise de trabalho, os pobres, privados deste e por conseguinte dos meios de subsistência, não tinham outros meios senão os de procurar recursos no roubo, «este direito outorgado pela natureza», disse Carlos Fourier.

A classe capitalista, que se desinteressa das causas da criminalidade que a civilização provoca, interessa-se, todavia, na repressão dos delitos e dos crimes, afim de proteger os seus membros contra as reivindicações individuais e anarquistas dos pobres. Os homens políticos, os moralistas e os filantropos têm-se dedicado a aperfeiçoar o regime penitenciário, e de tal forma o têm conseguido, que o seu desenvolvimento pode ser tomado como medida de civilização dum povo. Há um século, têm-se multiplicado os cárceres, os presídios e as colônias penitenciárias, importando-se dos Estados Unidos a espantosa prisão celular. A exploração burguesa não perde os seus direitos sobre os presos, os quais constituem uma fonte de receita para os que fazem trabalhar e um meio de reduzir os salários do trabalho livre.

Não conseguindo a repressão brutal reduzir o número crescente dos criminosos que a sociedade capitalista forja, viu-se obrigada a imitar a Inglaterra de Isabel e estabelecer instituições de caridade, assistência pública, fatia de pão, hospitais que proporcionam aos estudantes e aos doutores meios de prática e de estudo, asilos que durante a noite limparam a rua de vagabundos perigosos para os passeantes, etc.... O medo é a mãe da caridade pública. Os burgueses puseram em moda a caridade, quer praticando a filantropia a 6% com os alugueis operários, quer abrindo subscrições públicas em que tomam parte ou como mero passatempo. Para as senhoras do capitalismo, a caridade é um pretexto para intrigar em comissões organizadoras de festas deste gênero, para bailar, flertar, comer pasteis e beber «champagne» nos bazares de caridade. Os pobres servem para tudo: — os senhores capitalistas tiram deles proveito, e prazeres as senhoras. Os pobres são, para eles, uma bênção do bom Deus. Só por Jesus ter dito: «haverá sempre pobres entre vós», creriam na sua divindade.

A classe capitalista que, sistematicamente, empobrece e desorganiza a classe trabalhadora, julga-se segura contra toda a reivindicação coletiva, pela sua falta de coesão, pela sua miséria econômica e fisiológica e pelos sabres e baionetas dos polícias e dos soldados. Porém, o admirável valor, a inquebrantável resistência e a formosa disciplina, da qual os trabalhadores têm dado prova em algumas grandes greves, que duram semanas e meses, são demonstrações inegáveis da energia indomável que vive latente nas massas do proletariado e que um acontecimento político ou uma crise econômica geral pode despertar e desencadear.

A classe capitalista verá então quanto pesam na balança duma revolução social a polícia e o exército que protegem a sua dominação econômica e política. O proletariado sublevado varrerá toda a resistência, nacionalizará os meios de produção e estabelecerá a comunidade de bens. Então, como na época do comunismo primitivo, a humanidade não conhecerá a degradante caridade. Não haverá ricos para distribui-la, nem pobres para recebe-la.

1906
Escrito por Paul Lafargue, em "Porquê crê em Deus a burguesia".

Nota
[1] J. B. Say expõe com, grande satisfação, na sua «Economia Política» (Livro I e XVII) a superioridade da banana. Um mesmo terreno produz 106.000 quilogramas de bananas, 2.400 quilogramas de batatas e 800 de trigo. Uma média de um hectare semeado de bananas, do México, pode nutrir mais de 60 indivíduos, enquanto que o mesmo terreno, semeado de trigo, na Europa, nutre apenas duas pessoas. A batata cultivada na Itália e na Inglaterra, a partir do século XVII, não entrou no consumo popular até à primeira metade do século XIX.


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