sábado, 17 de março de 2018

Trotskismo ou Leninismo?

Por: J. V. Stálin

19 de novembro de 1924

Camaradas:

Pouco me resta dizer depois do detalhado informe de Kamenev. Limitar-me-ei, portanto, a acabar com algumas lendas propaladas por Trotski e pelos seus correligionários sobre a insurreição de Outubro, sobre o papel desempenhado por Trotski na insurreição, sobre o Partido e a preparação de Outubro etc. Ademais, falarei do trotskismo, como uma ideologia peculiar, incompatível com o leninismo, e das tarefas do Partido em relação com os últimos escritos de Trotski.

1 - A verdade sobre a insurreição de Outubro

Antes de tudo, sobre a insurreição de Outubro. Difunde-se, com insistência, entre os membros do Partido o boato de que todo o CC estava contra a insurreição em outubro de 1917. Costuma-se dizer que, a 10 de outubro, quando se tomou a decisão de organizar a insurreição, o CC, na sua maioria se manifestara contrário, mas que, então, irrompeu no local onde se realizava a reunião um operário, que teria dito: "Vós vos manifestais contra a insurreição, mas eu vos digo que a insurreição virá, apesar disso". E, depois desta ameaça, o CC, como se tivesse ficado intimidado, teria novamente discutido o problema da insurreição e decidido organizá-la.

Isso não é um simples boato, camaradas. Disso fala no seu livro "Dez Dias..." o conhecido John Reed, que, estando muito longe do nosso Partido, não podia certamente saber a história da nossa reunião clandestina de 10 de outubro e por isso mordeu a isca das calúnias postas em circulação pelos Sukhanov. Essa lenda foi reproduzida e repetida numa série de folhetos saídos da pena dos trotskistas, entre eles um recente, da autoria de Sirkin, sobre Outubro. Tais boatos são persistentemente alimentados pelos últimos escritos de Trotski.

Não creio que seja necessário demonstrar que todas essas lendas árabes e outras semelhantes não correspondem à realidade, que na realidade nada ocorreu nem poderia ocorrer de semelhante na reunião do CC. Sendo assim, bem poderíamos passar por cima desses tumores absurdos, pois são tantos os boatos inventados nos escritórios dos oposicionistas ou de indivíduos distanciados do Partido! E desse modo vínhamos agindo até agora, não dando importância, por exemplo, aos erros de John Reed, sem nos preocuparmos com a sua correção. Mas, depois dos últimos escritos de Trotski não mais podemos manter silêncio diante dessas lendas, pois com tais lendas se procura hoje educar a juventude e, infelizmente, nesse esforço já se colheram alguns resultados. Por isso, devo opor a estes boatos absurdos os fatos reais.

Tomo as atas da reunião do CC do nosso Partido de 10 (23) de outubro de 1917. Estão presentes: Lênin, Zinoviev, Kamenev, Stálin, Trotski, Sverdlov, Uritski, Dzerzhinski, Kolontai, Bubnov, Sokolnikov e Lomov. Discute-se a situação política e a insurreição. Após, submete-se a votos a resolução do camarada Lênin sobre a insurreição. A resolução é aprovada por maioria de 10 votos contra 2. Parece que está claro: o CC, por maioria de 10 votos contra 2, toma a decisão de passar ao trabalho prático imediato para organizar a insurreição. O Comitê Central elege na mesma sessão o centro político para dirigir a insurreição, ao qual dá o nome de Birô Político. Compõem-no Lênin, Zinoviev, Stálin, Kamenev, Trotski, Sokolnikov e Bubnov.

Esses são os fatos.

Estas atas destroem de um golpe várias lendas. Destroem a lenda de que o CC, na sua maioria, era contrário à insurreição. Destroem também a lenda de que o CC, na questão da insurreição, esteve a ponto de cindir-se. As atas evidenciam que os adversários da insurreição imediata - Kamenev e Zinoviev - passaram a integrar o órgão de direção política da insurreição ao lado dos partidários desta. Não se falou, nem se podia falar, de cisão de espécie alguma.

Afirma Trotski que, nas pessoas de Kamenev e Zinoviev, tínhamos, em Outubro, a ala direita do nosso Partido. Seriam quase social-democratas. Em tal caso, não se compreende como o Partido pode evitar a cisão; como as divergências com Kamenev e Zinoviev só duraram alguns dias e como foi possível que estes camaradas, não obstante as divergências, fossem colocados pelo Partido nos postos mais importantes, eleitos membros do centro político da insurreição etc. É bastante conhecida no Partido a atitude implacável de Lênin em face dos social-democratas; o Partido sabe que Lênin não teria consentido, por momento sequer, em ter no Partido, principalmente em postos de maior importância, camaradas de mentalidade social- democrata. Como se explica que o Partido pode evitar a cisão? Explica-se pelo fato de que, não obstante as divergências, esses camaradas eram velhos bolcheviques e se situavam no terreno comum do bolchevismo. Em que consistia esse terreno comum? Na unidade de vistas a respeito dos problemas essenciais: o caráter da revolução russa, as forças motrizes da revolução, o papel dos camponeses, os princípios de direção do Partido etc. Se não existisse esse terreno comum, a cisão teria sido inevitável. Se não houve cisão e se as divergências duraram apenas alguns dias, foi exclusivamente porque tínhamos em Kamenev e em Zinoviev leninistas, bolcheviques.

Passamos agora à lenda sobre o papel particular de Trotski na insurreição de Outubro. Os trotskistas propalam com insistência rumores de que o inspirador e o único dirigente da insurreição de Outubro teria sido Trotski. Tais rumores, são postos em circulação, com particular insistência, por Lenzner, o assim chamado redator das obras de Trotski. O próprio Trotski, ignorando sistematicamente o Partido, o CC do Partido e o Comitê de Petrogrado, silenciando sobre o papel dirigente dessas organizações na insurreição e impingindo-se insistentemente como figura central da insurreição, contribui voluntária e involuntariamente para difundir os boatos sobre um papel particular que teria desempenhado na insurreição. Estou longe de negar o papel sem dúvida importante de Trotski na insurreição. Mas devo dizer que Trotski não teve nem podia ter nenhum papel particular na insurreição de Outubro e que, como presidente do Soviete de Petrogrado, não fez senão seguir a vontade das instâncias competentes do Partido, que guiavam todos os seus passos. Aos filisteus do tipo de Sukhanov tudo isso pode parecer estranho, porém os fatos, os fatos reais, confirmam por completo esta minha afirmação.

Tomemos as atas da reunião seguinte do CC, realizada a 16 (29) de outubro de 1917. Estão presentes os membros do CC, além de representantes do Comitê de Petrogrado e de representantes da organização militar, dos comitês de fábrica, dos sindicatos e dos ferroviários. Afora os membros do CC, compareceram também Krilenko, Chotman, Kalinin, Volodarski, Chliapnikov, Lacis e outros. Ao todo, 25 pessoas. Discute-se a insurreição, do ponto de vista exclusivamente prático e de organização. Aprova-se a resolução de Lênin sobre a insurreição, por maioria de vinte contra dois votos, e três abstenções. Elege-se o centro prático para dirigir a organização da insurreição. Quem passa a integrar esse centro? São eleitos cinco camaradas: Sverdlov, Stálin, Dzerzhinski, Bubnov e Uritski. Tarefas do centro prático: dirigir todos os órgãos práticos da insurreição, de acordo com as diretivas do Comitê Central. Como vedes, nesta reunião do CC, ocorreu qualquer coisa de "horrível", isto é, no centro prático, incumbido de dirigir a insurreição, "estranhavelmente" não entrou o "inspirador", a "figura principal" o "único dirigente" da insurreição, Trotski. Como conciliar isso com a opinião difundida sobre o papel particular de Trotski? Não é verdade que tudo isso é um tanto "estranho", como diria Sukhanov, ou como diriam os trotskistas? Todavia, nada há de estranho nisso, pois, no fundo, Trotski, pessoa relativamente nova para o nosso Partido, no período de Outubro, não tinha nem podia ter papel particular algum; nem no Partido nem na insurreição de outubro. Como todos os dirigentes responsáveis, Trotski não passava de um executor da vontade do CC e dos seus órgãos. Quem conhece o mecanismo de direção do Partido bolchevique compreenderá, sem grande esforço, que não podia ser de outro modo: bastaria que Trotski deixasse de acatar a vontade do CC para perder toda influência sobre o curso dos acontecimentos. A tagarelice sobre o papel particular de Trotski não passa de lenda propalada por complacentes comadres "do Partido".

Isto não significa, naturalmente, que a insurreição de Outubro não teve o seu inspirador. Não, teve o seu inspirador e chefe. Mas este foi Lênin, e ninguém mais, o mesmo Lênin cujas resoluções foram aprovadas pelo CC, quando se discutiu o problema da insurreição; o mesmo Lênin ao qual a ilegalidade não impediu de ser o verdadeiro inspirador da insurreição, contrariamente a tudo quanto afirma Trotski. É néscio e ridículo tentar agora esconder, com tagarelices sobre a ilegalidade, o fato incontestável de que o inspirador da insurreição foi o chefe do Partido, Lênin.

Tais são os fatos.

Admitamos que seja assim, dizem-nos, porém não se pode negar que Trotski lutou bem no período de Outubro. Sim, é certo, Trotski lutou bem no período de Outubro. Mas no período de Outubro não só Trotski lutou bem; não combateram mal nem mesmo homens como os social-revolucionários de esquerda, que então marchavam ombro a ombro com os bolcheviques. Em geral, devo dizer que em período de insurreição vitoriosa, quando o inimigo está isolado e a insurreição em pleno desenvolvimento, não é difícil combater bem. Em semelhantes momentos até aqueles que andam sempre a reboque se tornam heróis.

Mas a luta do proletariado não representa uma ofensiva ininterrupta, uma cadeia ininterrupta de êxitos. A luta do proletariado tem também as suas duras provas, as suas derrotas. O verdadeiro revolucionário não é aquele que se revela corajoso no período da insurreição vitoriosa, mas o que, sabendo lutar bem durante a ofensiva vitoriosa da revolução, sabe também dar provas de coragem no período da retirada da revolução, no período da derrota do proletariado; aquele que não perde a cabeça nem se acovarda diante dos reveses da revolução, diante dos êxitos do inimigo: aquele que não se deixa tomar de pânico, nem se abandona ao desespero no período de retirada da revolução. Não combateram mal os social-revolucionários de esquerda no período de Outubro, apoiando os bolcheviques. Mas quem não sabe que esses "denodados" combatentes se deixaram dominar pelo pânico no período de Brest-Litovsk, quando a ofensiva do imperialismo alemão os fez cair no desespero e no histerismo? É muito lamentável, mas é incontestável o fato de que Trotski, que lutou bem no período de Outubro, não conseguiu, no período de Brest-Litovsk - no período dos reveses temporários da revolução, no momento difícil, dar provas de suficiente firmeza, e não seguir as pegadas dos social-revolucionários de esquerda. Não há dúvida, o momento era difícil, tornava-se necessário dar provas de grande coragem e de extraordinária serenidade, para não perder a cabeça, retirar-se a tempo, aceitar em tempo a paz, subtrair o exército proletário, aos golpes do imperialismo alemão, conservar as reservas camponesas e, obtida assim uma trégua, atacar em seguida o inimigo com novas forças. Mas, naquele momento difícil, faltaram a Trotski esta coragem e esta firmeza revolucionárias.

Segundo a opinião de Trotski, a lição essencial da revolução proletária consistiu em "não deixar-se dominar pelo medo" em Outubro. Não é certo, pois esta afirmação de Trotski contém apenas uma partícula da verdade sobre os ensinamentos da revolução. Toda a verdade sobre os ensinamentos da revolução proletária consiste em "não deixar-se dominar pelo medo", não somente nos dias da ofensiva da revolução, mas também nos dias da sua retirada, quando o inimigo obtém vantagens e a revolução, sofre reveses. A revolução não se limita a Outubro. Outubro é apenas o começo da revolução proletária. É mau deixar-se dominar pelo medo na fase ascendente da insurreição. Pior ainda é acovardar-se no momento das duras provas da revolução, depois da tomada do Poder. Saber manter o Poder, logo após a revolução, não é menos importante do que conquistar o Poder. Se Trotski se tornou presa do medo, no período de Brest, no período das duras provas da nossa revolução, quando por pouco não se chegou à "entrega" do Poder deve ele compreender que os erros cometidos por Kamenev e Zinoviev, em outubro, nada tem a ver com isso.

Eis o que há quanto às lendas sobre a insurreição de Outubro.


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