August Thalheimer
2 de Dezembro de 1928
Sobre a natureza do reformismo e sobre a
essência do oportunismo. Seria melhor, em primeiro lugar, tratar cada uma por
si e, depois, determinar as relações entre o reformismo e o oportunismo, até
que ponto eles se equiparam e até que ponto não.
Certamente que quem fez a pergunta
entende por reformismo a tão conhecida direção política dentro do movimento
operário. Por isso, podemos abstrair de tratar o reformismo sob outros aspectos.
Reformismo é, literalmente, a luta por
reformas. Reformas são, em relação ao Estado burguês e ao modo de produção
capitalista, mudanças em favor das classes dominadas e exploradas que não
alteram de modo fundamental as relações de troca entre as classes. Permanece,
assim, o facto de que a sociedade se divide em duas classes principais —
capitalistas e trabalhadores assalariados — e que os capitalistas exploram os
trabalhadores assalariados. Permanece também o facto de que a classe
economicamente dominante, simultaneamente, domina o Estado e, além disso,
emprega os meios de poder do Estado para conservar e regular as relações de
exploração e para oprimir as classes não capitalistas.
Em contradição com a reforma está a
revolução. A revolução encerra modificações no Estado e na economia que alteram
a relação fundamental das classes, que desalojam do poder a até então classe ou
classes dominantes e levam ao poder a classe ou as classes até então oprimidas.
No caso especial da sociedade capitalista desenvolvida, trata-se do afastamento
da classe capitalista e de seus apêndices do poder e a tomada do poder pela
classe trabalhadora. O poder no Estado apóia-se em última instância no emprego
de organizações armadas — exército, marinha, polícia, etc. Por isso, o acto
decisivo da revolução é a derrota, a desintegração e a destruição do poder
armado da classe até aí dominante por meio do poder armado da classe até aí
oprimida. Esse é o pressuposto para que a classe dominante possa ser afastada
também dos postos de poder econômico, ou seja, para que lhe seja suprimido o
direito de dispor dos meios de produção.
Por isso toda revolução social efetiva
em uma sociedade de classes é um acto de violência ou uma série de actos de
violência — mas não o contrário. Nem todo acto de violência é revolucionário.
Desse modo, poderia parecer que o
reformismo é aquela direção do movimento operário que se limita às reformas e
que recusa a revolução, enquanto a direção revolucionária tem como objectivo a
revolução e recusa as reformas.
Porém, isso não é assim. A direção
revolucionária luta também por reformas. No entanto, a luta por reformas é
diferente para a direção revolucionária e para a direção reformista, tanto no
objectivo, quanto no conteúdo e na extensão. A direção revolucionária liga a
luta pelas reformas com a luta pela revolução. Ela orienta a luta por reformas
para a revolução, quando, a cada momento mostra a insuficiência de cada reforma
e, assim, deduz a necessidade da revolução. À medida que a direção
revolucionária conduz as lutas e reformas para o limite que corresponde à força
da classe operária, ela está preparada em cada momento, havendo força
suficiente, para fazer a luta por reformas transitar para a luta revolucionária
pelo poder.
O reformismo é totalmente diferente.
Quando ele luta por reformas é para a conservação — e não para a superação — da
sociedade existente, é para evitar a revolução. Seu objectivo é, por isso, o
oposto. O que tem consequências também para o conteúdo e a extensão das
reformas, bem como para a maneira como a luta é conduzida. Ele ajusta o
conteúdo das reformas não ao interesse e à força dos oprimidos, mas sim ao da
classe dominante. Daí, ele limita a extensão da reforma ao que é permitido
pelas classes dominantes. Ele interrompe a luta por reformas quando essa luta
ameaça colocar em perigo o domínio das classes possuidoras ou quando elas
apenas supõem que seu domínio esteja perigosamente ameaçado. Assim, o
reformismo conduz a luta por reformas apenas na estreita e limitada extensão
que o interesse de classe capitalista permite. Ele se empenha em exagerar o
significado da reforma mais discreta e mutilada. Ele não impele para frente a
massa do povo em sua luta por reformas; ele a detém. E ele procura limitar os
métodos de luta àqueles que a legalidade burguesa permite. O reformismo é
obrigado até a travestir medidas reacionárias com a aparência de reformas, a
fim de torná-las mais palatáveis às massas.
Enquanto a direção revolucionária — ou
partido — concebe tanto a luta por reformas quanto a luta pela revolução e
subordina a luta pela reforma à luta pela revolução. Assim, um partido ou
direção reformista só pode conduzir a luta por reformas de uma maneira limitada
e atrofiada.
Apenas quem está preparado para levar
adiante a luta por reformas, com a correspondente força da classe operária, até
a revolução, apenas este está apto a ir até o fim na luta por reformas. Quem
não está preparado para isso, acaba ficando, a cada instante, no meio do
caminho ou fica horrorizado diante de uma luta por reformas. Neste último caso,
quando as classes dominantes contrapõem-se a determinadas reformas, que de
forma alguma suprimem a ordem social dominante. Assim, o direito de greve não é
nada que não seja conciliável com a ordem capitalista. Apesar disso, por exemplo,
na Alemanha, o reformismo concordou com a sua limitação (pela "ordem de
arbitragem") e opôs-se até mesmo à eliminação dessa restrição, etc.
O oportunismo no movimento operário
compreende o mesmo objectivo do reformismo, mas visto por outro lado. Ele
significa a renúncia ao objectivo final socialista como directriz para a luta
cotidiana, para a luta por reformas para a classe operária. Em seu lugar, entra
o interesse de classe burguês como a última e decisiva instância para a luta
cotidiana. O anarquismo é o pólo oposto do oportunismo. Sua essência consiste
na renúncia à luta cotidiana como meio para a preparação da luta em torno do
objectivo final socialista.
A política revolucionária da classe
operária movimenta-se no meio do caminho entre esses dois pólos: ela consiste
na conservação do objectivo final socialista como meta e ponto final em todas as
lutas cotidianas. Ela une ambos os lados, que tanto o oportunismo quanto também
o anarquismo separam.
Como se comportam, enfim, o reformismo e
o oportunismo como direções no movimento operário, um em relação ao outro? Eles
descrevem a mesma coisa, mas apresentam diferentes características principais e
podem ser vistos por lados e ângulos diferentes.
Ambas as descrições, tomadas em separado
ou juntas, dão apenas uma imagem da coisa geral, abstrata e sem vida. Para se
conseguir uma imagem concreta, distinta e vivaz, deve-se recorrer ao movimento
real designado por esses rótulos, e deve-se também compreender esse movimento
em seu processo histórico, em seu desenvolvimento e no seu contexto histórico.
Para se entender a essência do
reformismo no movimento operário deve-se perguntar: o que ele significa, do
ponto de vista de classe? A questão deve parecer primeiramente estranha, até
mesmo ininteligível ao trabalhador confuso com o reformismo. Ele responderá: é
apenas uma determinada concepção no interior da classe operária. Com isso,
responde-se apenas à questão da classe na qual o reformismo tem seguidores. Mas
se se trata de uma determinada concepção política, deve-se colocar ainda uma
questão mais além e essencial, a saber, qual interesse de classe corresponde a
essa concepção? E aí a experiência histórica mostra que ambas as questões podem
muito bem exigir respostas opostas. É um fato histórico bem conhecido que a
classe trabalhadora esteve por longo tempo sob influência de concepção
burguesa, antes de ela desenvolver sua própria concepção de classe. Esta última
só apareceu de forma cientificamente fundamentada através de Karl Marx e
Friedrich Engels nos anos quarenta do século passado. Examinando-se se sob esse
ângulo, o reformismo expressa interesses de classe burgueses; ele é a
representação de interesses de classe burgueses no interior da classe operária.
Ele significa a subordinação dos interesses da classe operária à classe
capitalista. O reformismo é, portanto, um produto híbrido, ele é uma
contradição contínua, no qual a concepção da classe antagônica, a classe capitalista,
é enxertada na classe operária. A partir disso surgem algumas importantes
conclusões:
Primeiro: para as parcelas da classe
operária que apoiam o reformismo, esse apoio pode ser apenas temporário,
passageiro. Com a intensificação das lutas de classe, a concepção de classe
proletária ou revolucionária deve penetrar também nessa parcela.
Segundo: há, entretanto, uma determinada
classe, que ocupa econômica e socialmente um lugar intermediário entre a classe
operária e a classe capitalista, a pequena burguesia. A pequena burguesia é,
assim, a portadora natural do reformismo, a líder natural do movimento
reformista, a mediadora natural das concepções de classe burguesas na classe
operária. Apesar disso, os líderes do reformismo, como Marx já notou, não são
geralmente de origem social pequeno burguesa. Para os ideólogos
pequeno burgueses do reformismo é característico que eles em suas idéias não
possam ultrapassar a fronteira que a pequena burguesia socialmente não é capaz
de ultrapassar. O desenvolvimento econômico criou um elemento na aristocracia
operária, que parcialmente se aproxima da pequena burguesia, com ela se
mistura, e que, na época do imperialismo, fornece principalmente os líderes e
os quadros para o reformismo.
No entanto, em virtude de sua posição de
classe, esses líderes e quadros do reformismo estão a ele vinculados
firmemente, de forma totalmente diferente das amplas massas de trabalhadores
que os seguem. O distanciamento dos trabalhadores do reformismo expressa-se,
organizatoriamente, pela cisão entre esses líderes e seus seguidores
proletários. Essa ruptura pode assumir formas variadas, de acordo com as
circunstâncias históricas.
A França é o país no qual a maioria dos
fenómenos políticos foram primeiramente identificados em sua forma clássica. A
característica que Marx no "Dezoito Brumário" dá ao Partido
Social-democrata pequeno-burguês dos anos 40, alcança os traços essenciais do
reformismo em geral. Marx descreveu assim a conduta desse partido em 1849:
Quebrou-se o aspecto revolucionário das
reivindicações sociais do proletariado e deu-se a elas uma feição democrática;
despiu-se a forma puramente política das reivindicações democráticas da pequena
burguesia e ressaltou-se o seu aspecto socialista (...) [O caráter peculiar da
social-democracia resume-se no facto de exigir] instituições
democrático-republicanas como meio não de acabar com dois extremos, capital e
trabalho assalariado, mas de enfraquecer seu antagonismo e transformá-lo em
harmonia. Por mais diferentes que sejam as medidas propostas para alcançar esse
objetivo, por mais que sejam enfeitadas com concepções mais ou menos
revolucionárias, o conteúdo permanece o mesmo. Esse conteúdo é a transformação
da sociedade por um processo democrático, porém uma transformação dentro dos
limites da pequena-burguesia.(1)
A social-democracia alemã, o Labour Party
inglês, os mencheviques russos, eles todos enquadram-se nessas características
gerais, apesar das diferenças locais e temporais que possam ter essas manifestações,
nas quais o caráter básico se expressa. É com essas formas de manifestações do
reformismo sob diferentes condições de classe em geral e em variadas situações
das lutas de classes que vamos agora rapidamente nos ocupar.
Comecemos "em casa", na Alemanha.
A socialdemocracia do pré-guerra uniu dois objetivos: a luta contra a monarquia
agrária (dos junker), burocrática e militar — portanto, por reformas
democráticas — e a luta pelo socialismo. Esse é o fundamento objectivo que
conservava a direção reformista e a revolucionária na classe operária até a
guerra, ainda em um mesmo partido. A guerra mundial quebrou essa unidade, na
medida em que criou uma situação revolucionária. Assim, a guerra obrigou o
reformismo a uma decisão: pelo imperialismo ou pelo socialismo, pela revolução
ou contra ela. O reformismo decidiu-se pelo imperialismo e contra a revolução.
Na eclosão da Revolução de Novembro, à qual o reformismo se opusera até o fim,
veio à tona a questão: conservação da revolução nos limites burgueses ou sua
continuação no sentido da revolução socialista, democracia burguesa ou ditadura
do proletariado, república burguesa ou república dos conselhos. A decisão de 4
de agosto de 1914 determinou a de novembro de 1918. A social-democracia
tornou-se o pólo, o ponto de encontro, o esteio activo da contra-revolução.
Com o estrangulamento provisório da
revolução proletária, a conclusão da revolução burguesa, a consolidação da
república burguesa e a superação da crise do pós-guerra modifica-se novamente a
forma de manifestação do reformismo na Alemanha — mantido o seu caráter
fundamental.
Novas contradições se desenvolvem sobre
os novos fundamentos burgueses. De fato, acalmaram-se, por enquanto, as ondas
revolucionárias, a luta de classe se reduz por ora a meras lutas cotidianas por
reivindicações parciais e reformas. No entanto, permaneceu a crise geral do
capitalismo. A república burguesa está aí. Entre a república burguesa e a
república dos conselhos não há mais nenhum degrau burguês intermediário. As
lutas cotidianas da classe operária na república burguesa devem conduzir,
assim, em seu desdobramento e por causa de abalos sociais profundos,
directamente para a revolução socialista. Se, na época crítica da revolução, da
luta imediata pelo poder entre o proletariado e a burguesia, o que valia para o
reformismo era derrotar activamente a parte revolucionária do proletariado,
agora a tarefa do reformismo é a de reter a luta cotidiana da classe operária
nos limites burgueses e evitar as novas explosões da luta pelo poder. Disso
deriva que a tarefa geral do reformismo no tempo presente, entre duas
revoluções, é a de represar, impedir e truncar as lutas cotidianas, quebrar seu
ápice revolucionário, isto é, manter o mais baixo possível o fogo da luta de
classes.
Também nessa área é impossível para o
reformismo na Alemanha o retorno para a posição de antes da guerra, que se
expressava na palavra-de-ordem: "A esse sistema nenhum homem e nenhum
vintém". "Esse sistema" tornou-se o mesmo ao qual se associa o
reformismo.
As perspectivas futuras do reformismo no
solo alemão resultam claramente da perspectiva da luta de classes na Alemanha.
Essa perspectiva geral é a revolução proletária. Ela somente é possível se o
reformismo desarraigar-se da classe operária, se sua influência for reduzida à
insignificância. Dito de modo distinto: se o comunismo ganhar a maioria da
classe operária para seus princípios e objectivos, para a ditadura do
proletariado e para os conselhos e a maioria dos trabalhadores for por ele
liderada. Que papel terá o reformismo no futuro imediato das lutas pelo poder
do proletariado, mostra-nos tanto o seu papel nas lutas recentes pelo poder na
Alemanha, quanto o papel do menchevismo russo no processo da revolução russa.
Ele se tornará, em primeiro lugar e novamente,
o ponto de encontro de todas as forças da contrarrevolução, e se tornará, no
final, um apêndice do pólo extremo da contrarrevolução, dos guardas brancos da
grande burguesia, dos junker, dos clérigos, de seus generais brancos e
pretendentes à coroa.
Essa é a perspectiva do reformismo em geral.
As formas do processo de liquidação do
reformismo ninguém pode hoje prever ou predizer em suas particularidades.
Apenas é claro que elas podem se tornar variadas e múltiplas, de uma forma que
ninguém hoje pode saber, e que a liquidação desse colosso de pés de barro não
se dará sem grandes cisões, destruições, etc.
Isso dependerá, por um lado, da marcha
concreta das lutas de massa, que conduzem à revolução proletária, e, por outro
lado, da táctica do partido operário revolucionário, do Partido Comunista, assim
como do próprio reformismo.
(1) MARX, Karl. O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann,
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