Ainda que os Marxistas deem crédito ao
capitalismo por ter sido um avanço econômico em comparação com o feudalismo,
expõem ao mesmo tempo as brutais desumanidades através das quais este acumulou
primeiramente seu capital. A acumulação primitiva do capital é explicada em O
Capital, mas seu foco é o capitalismo industrial, quando a produção de
mercadoria se torna dominante na sociedade.
A semente do capitalismo cresceu em meio
à crise da sociedade feudal. Com uma economia predominantemente natural,
dependente sobretudo da terra, a produção de mercadorias desenvolveu-se
gradualmente por um longo período.
Antes de a produção de mercadorias, sob
a forma do capitalismo industrial, ter se tornado o modo de produção dominante
no século XIX, atravessou duas etapas: a etapa artesanal; e a etapa manufatureira,
que durou por centenas de anos na Europa.
As corporações de ofício eram as
unidades básicas de produção nas cidades que emergiram durante as Idades
Médias. Sob a direção do mestre de ofício numa pequena unidade produtiva, cada
um dos artesãos fabricava por si só o produto completo com instrumentos manuais
que eles próprios possuíam.
Foi no final das Idades Médias,
particularmente na Itália do século XIII, que a manufatura pré-industrial
começou a desenvolver-se. A base era ainda artesanal, mas as manufaturas
trouxeram um nível maior de produtividade através da divisão do trabalho. No
dia a dia, grupos de operários cumpriam apenas partes limitadas de todo o
processo. A produção era mais rápida e maior que aquela que havia sob as
corporações.
À medida que se desenvolviam as
manufaturas, as corporações de ofício eram dissolvidas. Os artesãos perdiam
seus instrumentos e eram compelidos a trabalharem nas linhas de produção do
sistema fabril.
A manufatura amadureceu e começou a se
tornar capitalismo industrial no final do século XVIII. A indústria capitalista
moderna foi impulsionada por invenções como o tear mecânico e a máquina a
vapor.
As etapas artesanal e manufatureira
podem ser colocadas conjuntamente como o período da acumulação primitiva do
capital. As origens históricas da classe capitalista industrial e da classe
operária remontam a este período. O capitalista manufatureiro despojou o
artesão de suas ferramentas e acumulou capital por meio das formas mais
desumanas de exploração.
O período da acumulação primitiva de
capital não significou simplesmente a adoção de meios mais eficientes de
organização produtiva. Há toda uma expansão da exploração desumana perpetrada
pelo manufatureiro e o comerciante.
No sistema fabril, homens, mulheres e
crianças eram obrigados a trabalhar de 16 a 18 horas por dia, e até mesmo 20
horas em casos extremos. Até a primeira metade do século XIX, as horas de
trabalho eram prolongadas. Os salários eram tão baixos que até mesmo crianças
de menos de dez anos de idade tinham de trabalhar. Os ambientes de trabalho
eram insalubres a ponto de os operários poderem ser facilmente mortos ou
feridos pelas máquinas. Castigos físicos eram impostos sobre os operários, que
viviam em alojamentos semelhantes a chiqueiros.
O crescimento da manufatura
pré-industrial levou ao movimento dos cercamentos. Camponeses foram expulsos
das terras que eram transformadas em pasto para as ovelhas (para a produção de
lã como principal produto) e a produção especializada de lavouras comerciais
(algodão, beterraba, batata, etc.). À medida que os camponeses eram expulsos
das terras, tinham de competir pelos empregos disponíveis nas manufaturas.
Havia sempre muitos para poucos empregos, depreciando assim as condições
salariais. O pauperismo e o banditismo disseminaram-se no século XVI. Imensas
rebeliões camponesas também ocorreram no século XVII.
A classe manufatureira e a monarquia
feudal cooperaram na condução da política mercantilista. O manufatureiro tinha
interesses na consolidação do mercado nacional contra os concorrentes de outros
países, e também se colocava contra os barões feudais que cobravam taxas pelas
passagens das mercadorias pelas estradas e rios. O interesse do manufatureiro
coincidia com os interesses do rei na consolidação de seu poder e no apoio
financeiro por parte dos manufatureiros e comerciantes às guerras.
O mercantilismo foi também o principal
motivo econômico das expedições coloniais do século XVI. Num primeiro momento,
o objeto de interesse das colônias era o ouro, especiarias e outros produtos
exóticos.
Posteriormente, as metrópoles decidiram produzir lavouras comerciais
nessas colônias para seu próprio benefício.
Não apenas os povos nativos foram
forçados a cultivar lavouras comerciais como tabaco, cana de açúcar, algodão,
pimenta e demais, mas também dado que no sul e no norte da América havia
escassez de índios nativos para trabalhar sob o chicote, escravos tiveram de
ser trazidos à força da África pelas potências coloniais.
Incidentalmente, até
mesmo isso foi uma desculpa para catequizar os negros. Os jesuítas portugueses
enriqueceram muito com o comércio de escravos, principalmente após terem
causado a morte de milhares de indígenas no Brasil, ao colocarem-nos em campos
de concentração.
1981-1982
Escrito por José M. Sison
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