Estaline ["Sobre a Situação
Internacional", Setembro de 1924]
Por Harpal Brar
Em Maio de 2000, Harpal Brar, presidente
do Partido Comunista da Grã Bretanha (Marxista-Leninista), apresentou o artigo
"Democracia Burguesa e Fascismo", no Seminário Internacional Primeiro
de Maio, em Bruxelas, organizada pelo Partido do Trabalho da Bélgica (PTB). Em
2013, a URC traduziu esse importante documento, que esclarece o papel histórico
cumprido pela socialdemocracia na ascensão do fascismo no século XX.
1. Fascismo: Crescimento repentino?
Para os que aceitaram como
inquestionável as formas sociais existentes e a sua continuidade, para os que
apostaram pela possibilidade de uma melhora progressista pacífica dentro dessas
formas sociais, e para os que qualificam a alternativa revolucionária como
fantasia de uma minoria, a vitória do fascismo em um país avançado e
industrializado como a Alemanha significou um choque brutal.
Para realizarmos uma análise adequada, é
fundamental estudar o fascismo com relação ao carácter geral do desenvolvimento
social moderno, da qual o fascismo é uma expressão, e apontar as forças
impulsoras da economia e da técnica, as quais chegaram a um ponto que são cada
vez mais incompatíveis as formas capitalistas existentes com o desenvolvimento
da produção e a utilização da técnica.
Há uma luta entre elas – uma deve acabar
com a outra. Ou o avanço das forças produtivas põem fim ao capitalismo, ou a
existência continuada do capitalismo provocará uma progressiva pausa na
produção e na técnica que mergulhará milhões de pessoas do planeta na pobreza,
miséria e guerra.
Estes são os dois únicos caminhos,
capitalismo ou socialismo. Não existe outra alternativa. Todas as esperanças em
uma terceira alternativa, que garantiria a realização do desenvolvimento
pacífico e harmonioso sem a luta de classes, por meio da democracia
capitalista, do capitalismo planificado, etc., são sonhos impossíveis. Esses
sonhos de desenvolvimento pacífico são simplesmente ecos de ideias passadas,
pertencentes à época do capitalismo liberal de livre concorrência, uma época
que desapareceu há cem anos, e que não voltará a existir. O capitalismo de
livre concorrência foi desenvolvido “na época do capital financeiro e dos
monopólios, que trazem consigo, em toda a parte, a tendência para a dominação,
e não para a liberdade. A reacção em toda a linha, seja qual for o regime
político; a exacerbação extrema das contradições também nesta esfera: tal é o
resultado desta tendência.” (Lenine, Imperialismo, fase superior do
Capitalismo).
Em nossos dias, nenhum dos principais
estados imperialistas, por causa de um período de prosperidade e
desenvolvimento económico sem precedentes como consequência das peculiaridades
que se deram após a Segunda Guerra Mundial, é ameaçado por agitações
revolucionárias sérias. Graças a exportação da opressão e a violência ao
estrangeiro o poder mantém as formas democráticas. Porém, a cada vez mais
profunda crise do imperialismo, obriga a classe capitalista dirigente a
complementar essas formas democráticas com novos métodos ditatoriais e
repressivos – concentração dos poderes executivos, redução do parlamento a um
teatro de diálogos vazios, aumento da utilização de poderes extraordinários e
da violência policial, restrição a liberdade de expressão, legislação
antisindical dacroniana, e oposição violenta às greves – como aconteceu com as
greves mineiras de 1984-1985 – e às manifestações. Isso ainda não é fascismo,
mas a tendência inequívoca conduz a formas fascistas de poder em todos os
países capitalistas.
“O desenvolvimento das forças produtivas
do trabalho social” observou Marx, “é a missão histórica e a justificação
histórica do capital. Precisamente assim criam inconscientemente as condições
materiais para uma forma de produção superior” (Marx, O Capital).
Reconhecendo esse papel histórico do
capitalismo, Marx observou as leis internas do desenvolvimento capitalista,
advertindo, há mais de um século, que chegaria uma etapa na qual o capitalismo,
longe de ser quem organiza e desenvolve as forças produtivas, afundaria estas,
cada vez mais, em um círculo vicioso de crises violentas, estancamentos e quedas,
que só poderiam ser resgatadas pelo proletariado. Essa é a essência do
Marxismo. E a sua expressão política é a ditadura do proletariado como condição
para a solução dos problemas da nossa época.
Já antes do fim da Primeira Guerra
Mundial, Lord Leverhulme, o magnata da indústria, afirmou: “Com meios que a
ciência colocou a nossa disposição, poderíamos assegurar alimento, moradia e
roupa para todos nós, com uma hora de trabalho por semana da escola até a
velhice”. Isso foi há oito décadas. A produtividade cresceu infinitamente. E,
apesar de tudo, a humanidade enfrenta a fome e a miséria, a ausência de
condições básicas de higiene e de água potável; doenças e morte.
"Enquanto nas épocas anteriores os
homens morriam por resultado da falta de alimentos, em nossa época, morrem
porque existem em demasia. O capitalismo é o primeiro sistema de produção que
cria na sociedade “ a absurda contradições de que os produtores não tenham nada
para consumir precisamente porque faltam consumidores”. (Engels, Anti-Dühring)
Há muito tempo que o capitalismo
tornou-se historicamente antiquado. Nada poderia expressar melhor a quebra
completa desse sistema do que o fato de que, no meio de uma abundância e de um
poder produtivo sem precedentes, é incapaz de adoptar os meios para explorar
uma crescente proporção da classe operária, vendo-se obrigado a condenar
dezenas de milhões de pessoas capacitadas e dispostas a trabalhar nas sobras
disponíveis. Frente a tal sistema, tão cruel como absurdo, o proletariado “
(...) não tem outra opção a não ser morrer de fome ou rebelar-se” (Engels, A
situação da classe operária na Inglaterra).
As condições objectivas para esta
rebelião proletária já estão maduras no começo do primeiro período do
imperialismo (capitalismo monopolista), e especialmente desde o começo da crise
geral do capitalismo em 1914, que desembocou na Primeira Guerra Mundial. Porém,
com a honrosa excepção do proletariado russo, conduzido pelo Partido
Bolchevique sob a bandeira do marxismo-leninismo, a classe operária da Europa foi
derrotada. O capitalismo utilizou principalmente três armas para afogar a
revolução proletária na Europa e alcançar, temporariamente, sua estabilidade.
A primeira dessas armas foi a
intervenção directa das forças contrarrevolucionárias: a guerra imperialista
contra a nova república proletária russa ou terror branco na Finlândia, Hungria
e Polónia.
A segunda arma empregada pela burguesia
para derrotar a luta da classe trabalhadora pelo poder não era uma novidade: a
socialdemocracia, que já havia traído a classe operária usando a lenda da
defesa da “pátria” no começo da carnificina imperialista que foi a Primeira
Guerra Mundial. Como consequência dessa guerra, a classe operária, demasiado
forte para ser derrotada em uma batalha direta, foi esmagada através do papel
da socialdemocracia, papel que tristemente se desenvolve na atualidade. A
burguesia fazia crer que entregava o poder a classe operária estabelecendo
governos socialdemocratas, encarregados de fazer o trabalho sujo do
capitalismo, como o tempo demonstrou. Em um primeiro momento, concede algumas
das migalhas para a classe trabalhadora: melhoria nos salários, promessas de
nacionalização, fortalecimento da Seguridade Social, redução da jornada de
trabalho, etc. No momento em que burguesia assegura o controle do poder todas
essas concessões são limitadas, fazendo com que as condições de vida dos
operários decaiam até níveis piores do que período do pré-guerra.
A terceira e última arma para
estabilizar o poder burguês era a capacidade do capitalismo europeu para
colocar as mãos nas gigantescas reservas do imperialismo internacional. Os
empréstimos estadunidenses, como aconteceu após o fim da Segunda Guerra Mundial
com o Plano Marshall, tornou possível a reconstrução do capitalismo europeu.
Essa reconstrução, edificada com
materiais tão instáveis, não podia durar muito. A socialdemocracia, longe de
cumprir sua promessa de conduzir a luta pelo socialismo (ainda que fosse pela
via pacífica, gradual, através dos instrumentos “democráticos”), evidenciou
como um instrumento pode levar a cabo a ofensiva dos capitalistas (e por meios
precisamente não “democráticos”). Pelas suas medidas ceoercitivas e
disciplinares contra a classe operária, a socialdemocracia foi provocando cada
vez mais a rejeição e a desilusão. Como consequência, a socialdemocracia foi
descoberta como agente da burguesia frente a classe operária, reduzindo sua
eficácia como arma do capitalismo. Não é estranho, desde já, que neste período
a influência e a base eleitoral da socialdemocracia diminuíram nos países
europeus, enquanto o comunismo avançou. Em segundo lugar, apenas o capitalismo
dos Estados Unidos forneceu as bases para a reconstrução do capitalismo em
escala global, o mundo contemplava a queda estadunidense, arrastando consigo o
conjunto da estrutura do capitalismo. Inclusive os êxitos do período da
estabilização, com o crescimento da produção e da capacidade produtiva,
potencializaram as contradições do capitalismo monopolista retardando a
resolução passo a passo da crise.
Enquanto os gigantescos monopólios
estavam em posição de manter enormes benefícios, inclusive durante os piores
momentos da depressão económica, a classe operária, a pequena burguesia e os
povos coloniais, foram os que padeceram as consequências da crise. A pobreza
das massas, nos estados imperialistas e nas colónias, não fizeram outra coisa
que acentuar os devastadores efeitos da depressão, algo que chegaram a
reconhecer certos sectores da burguesia que começaram a falar da restauração
dos anos 20 como um simples reflexo. A extensão desse reconhecimento dentro do
mundo capitalista marcou a troca na dilecção política para o fascismo.
A etapa transitória de estabilização
provocou toda uma enxurrada de mitos e ilusões (como acontece actualmente com
as bolsas de valores do imperialismo que geram essas mesmas infundadas
afirmações, ilusões e mitos) que falam de uma nova era (“novo paradigma”, no
jargão actual) de “perpétua” prosperidade capitalista e de um desenvolvimento
capitalista “harmonioso”, encontrando a sua última expressão no
“ultraimperialismo”, conceito segundo o qual o desenvolvimento capitalista
conduz inexoravelmente a criação de um único “trust” mundial, que acabará com a
rivalidade interimperialista e provocará a chegada de uma era de produção
racional e prosperidade universal. Segundo a teoria defendida pelo
“ultraimperialismo”, o capitalismo estadunidense, já na primeira metade do
século XX, representava um “novo tipo” de capitalismo que conseguia evitar a
crise e as contradições do velho capitalismo, resolvendo o ciclo comercial e
descobrindo o segredo da prosperidade eterna para a classe trabalhadora vinda
das mãos benéficas dos capitalistas.
Indubitavelmente, os líderes e os chefes
de estado do capitalismo, cegos pelo avanço da produção durante o período de
estabilização, compartilharam essas ilusões. Por isso não nos é estranho a
proclamação que o presidente Hoower realizou em 27 de Julho de 1928: “A
perspectiva actual do mundo é, de longe, a maior expansão comercial na
história”. Insistiu nessa ideia em 11 de Agosto de 1928, no discurso da sua
reeleição como candidato à presidente dos Estados Unidos representando o
Partido Republicano: “O desemprego entendido como uma praga está desaparecendo
(...) Na América de hoje, estamos mais perto do triunfo sobre a pobreza que em
nenhuma outra época da história em nenhuma parte do mundo. A miséria nos lares
está desaparecendo entre nós. Ainda não alcançamos a meta, mas se temos a
oportunidade de continuar com as políticas dos últimos 8 anos, logo, com a
ajuda de Deus, veremos chegar o dia em que não exista mais pobreza nesta nação”
(New York Nation, 15 de Junho de 1932).
Como não poderia ser de outro jeito, o
principal instrumento para transmitir essas ilusões às massas da Europa e
América foi a socialdemocracia. Foram enviados aos Estados Unidos delegações de
trabalhadores, com gastos pagos pelos governos capitalistas da Grã Bretanha,
Alemanha e muitos outros países europeus, com o único objectivo de pregar o
novo testamento da Terra Santa do Capitalismo. Esta pequena nobreza
socialdemocrata, na sua volta, pronunciou diligentemente o triunfo do
capitalismo sobre o marxismo. Com seu controle das organizações operárias,
especialmente sobre os sindicatos, a máquina socialdemocrata, apoiada pelos
poderosos e persuasivos instrumentos da propaganda burguesa, louvou as
grandezas do capitalismo americano, o fordismo, a racionalização, a era do
capitalismo, etc., com a única intenção de desmoralizar a classe operária,
acabando com as esperanças de um futuro socialista, e semeando ilusões sobre um
futuro promissor sob o capitalismo.
O subsequente colapso económico, e o
colapso de todas as teorias e ilusões do período de estabilização, provocaram
uma grande desilusão entre a pequena burguesia e certos sectores da classe
operária. Enquanto, confrontados com a contradição básica do capitalismo que se
estabelece entre as forças produtivas e as relações de produção, vendo-se
obrigada a reconhecer a realidade de que o avanço da técnica supera as formas
existentes da organização social, os líderes do capitalismo tiveram que optar
entre desfazer as formas existentes da organização social (ou seja, a
propriedade privada dos meios de produção) já que são incompatíveis com avanços
tecnológicos; ou manter os interesses de um sistema historicamente antiquado,
limitando a técnica, restringindo a capacidade produtiva para rebaixar o nível
de consumo das massas empobrecidas, suprimir a luta de classes, intensificar a
opressão de classe, e apostar na guerra como única saída do impasse.
Em outras palavras, a destruição das
forças produtivas, a rebelião contra as máquinas, contra a ciência, contra a
democracia parlamentar, e a guerra comercial seguida por uma autêntica guerra
como solução final. Sabemos que opção escolheu a burguesia na defesa de seus
interesses egoístas de classe. Optou pela segunda das alternativas. No final do
período de estabilização abriu o caminho para a nova fase, a mais completa e
consistente expressão do que é o fascismo. “Como a Cama de Procrusto, o
capitalismo moderno, na sua etapa de decadência extrema, busca encaixar o corpo
torturado da humanidade” (R. Palme Dutt, Fascism and Social Revolution).
2. O que é o fascismo?
Longe de ser uma teoria independente
criada em oposição ao capitalismo, ou uma ideologia independente da pequena burguesia
hostil tanto ao proletariado quanto ao capitalismo monopolista, o fascismo é,
pelo contrário, a mais consumada expressão, em certas condições de extrema
decadência, das principais tendências políticas do capitalismo em sua etapa
imperialista.
O fascismo é a resposta prática da
burguesia imperialista à ameaça da revolução proletária. É um movimento de
massas contrarrevolucionário que, contando com o apoio total da burguesia, que
põe em prática uma mistura de demagogia social e métodos terroristas com o
objectivo de esmagar a revolução e fortalecer a ditadura do capital financeiro.
Para definir o fascismo e situa-lo em sua realidade concreta, há de se expor a
sua base de classe, em qual sistema de relações de classe em que nasce e no
qual funciona, e o papel de classe que lhe atribui o capital financeiro e que
tão bem o cumpre. Qualquer tentativa de separar o fascismo do seu progenitor –
a ditadura burguesa – só pode nos conduzir a afirmações absurdas, como as que
escreve o Daily Herald, órgão oficial do Partido Trabalhista e da T.U.C., no
mesmo dia no qual os Nazistas tomam e sequestram os sindicatos na Alemanha.
“O nacional-socialismo, cumpre lembrar,
chama-se socialista, assim como Nacional. O seu socialismo não é o socialismo
do Partido Trabalhista, ou de nenhum outro partido socialista reconhecido em
outros países. Mas, em muitos pontos, é um credo que repugna os grandes
proprietários, os grandes industriais e os grandes financeiros. E os líderes
nazistas estão obrigados a seguir a vertente socialismo do seu programa.”
As linhas citadas acima, sem dizer nada
sobre o “socialismo” dos nazistas, revelam muito sobre o “socialismo” do
Partido Trabalhista e o T.U.C., assim como também o forte respaldo à linha dos
líderes do imperialismo, segundo o qual o fascismo é meramente uma vertente do
socialismo – uma vertente muito pouco ortodoxa, mas não por isso um “perigo
para os grandes proprietários, os grandes industriais e os grandes
financeiros”, que, por mais estranho que possa parecer, o financiaram generosamente
antes de finalmente coloca-lo no poder no período em que a oficina
governamental foi assumida pelos fascistas, assim como também durante a etapa
da ditadura fascista. Em nenhum país o fascismo conquistou o poder. Foi
alimentado e permitido crescer, foi salvo da extinção em seus estágios iniciais
nas mãos do movimento da classe trabalhadora, e finalmente posto no poder,
graças ao apoio directo da burguesia. Pode contar com a assistência da maior
parte da máquina estatal – o corpo de oficiais do exército, da polícia e do
Judiciário, que enquanto empregavam a máxima severidade contra a oposição
proletária, tratavam os fascistas com leniência benigna.
Graças a sua demagogia social, o
fascismo podia construir uma base de massas mais ampla apelando especialmente a
pequena burguesia (também esmagada pelo capital monopolista), assim como ao
lumpenproletariado e aos sectores mais desmoralizados da classe operária,
ajudados pelos grandes barões das finanças e indústria, assim como os grandes
magnatas, todos esses deram o suporte financeiro e a direção política. Porém,
uma vez no poder, o fascismo realizou os ditames implacáveis do capital
monopolista e sem piedade virou a máquina do Estado contra aqueles partidários
que foram crédulos o suficiente para esperar políticas anticapitalistas dos
nazistas.
Já no poder, abandonando a sua retórica
anticapitalista, o fascismo revelou-se em suas verdadeiras cores de “ditadura
terrorista do grande capital” (Programa da Internacional Comunista, 1928).
“O fascismo aparece quando um poderoso
movimento da classe operária atinge uma etapa de crescimento que
inevitavelmente levanta questões revolucionárias, mas é controlado pela ação
decisiva das lideranças reformistas... O fascismo é filho do reformismo” (R.
Palme Dutt, Labour Monthly, julho de 1925).
3. Itália, então um país atrasado
Passar de uma linha política de métodos
liberais à uma política fascista não é uma mudança repentina. São as duas
metades de uma mesma política. Enquanto as forças da burguesia não estão
preparadas, utilizam dos líderes reformistas para rechaçar a ofensiva
revolucionária, ao mesmo tempo em que preparam secretamente a eliminação
directa, pelas armas, do movimento proletário. Enquanto enganam as massas com
falsas concessões, racham a sua unidade por meio dos bons serviços da
socialdemocracia, e os “liberais” e “democráticos” governantes equipam e armam
secretamente o fascismo. Quando essa etapa se completa, com as forças
proletárias suficientemente debilitadas, a violenta contrarrevolução tem o caminho
aberto. A furiosa ofensiva do fascismo (na Itália e em outros países) foi
executada sob a benévola protecção dos governos liberais e socialdemocratas
(Giolitti e os seus sucessores na Itália).
A experiência italiana permite-nos ver
uma demonstração clássica de transição da democracia burguesa ao fascismo, da
qual podemos tirar três conclusões principais que apresentam importantes
revelações:
O movimento revolucionário estava
ferido, não pela burguesia nem pelo fascismo, mas sim pelas pobrezas e
carências internas da direcção revolucionária, consequência do seu reformismo.
O fascismo aparece em cena para jogar o
papel de herói (sob a protecção militar e policial) para acossar e massacrar um
exército já em retirada, depois que o avanço do proletariado fora quebrado por
dentro, e estendeu no seu interior a desilusão, graças aos Turatis e D'Aragonas
do reformismo italiano.
A transição para uma clara ditadura
fascista, longe de ser uma transformação brusca na política burguesa, foi, ao
contrário, a continuação da política burguesa através de outros meios e em
novas condições.
O fascismo foi alimentado e se
desenvolveu dentro das condições da democracia burguesa; e quando as condições
amadureceram, foi colocado na posição de poder exercer a ditadura terrorista do
grande capital sob a classe operária e outras camadas intermediárias.
4. Alemanha, a traição da
Socialdemocracia
Em Novembro de 1918, a classe operária
alemã derrotara o velho Estado e a sua vitória era total:
“Em Novembro de 1918, a revolução era o
único trabalho do proletariado. O proletariado conquistou uma posição tão
poderosa que os elementos burgueses, em um primeiro momento, nem tentaram
resistir” (Kautsky, A Revolução Proletária, 1931)
Como foi possível que esta situação de
vitória do proletariado, em 15 anos, mudar totalmente? A socialdemocracia é a
resposta.
Ainda que a socialdemocracia alemã
tivesse do programa revolucionário marxista e tivesse uma longa e gloriosa
tradição, na era do imperialismo, o oportunismo, o cretinismo parlamentar, a
corrupção, e as políticas economicistas do sindicalismo tinham uma força cada
vez maior dentro do partido. O começo da Primeira Guerra Mundial em 1914
completou este processo, com o Partido Socialdemocrata da Alemanha (SPD) aberta
e desavergonhadamente ao lado do Kaiser Wilhelm, do militarismo alemão e da
burguesia. Adotando o lema “defesa da pátria” em uma predatória guerra
imperialista, a socialdemocracia alemã, como seus homólogos em outros países
europeus (a única e honrosa excepção foram os bolcheviques na Rússia), traiu a
classe operária e enterrou a bandeira do internacionalismo proletário. A
Revolução de novembro de 1918 foi organizada por elementos revolucionários
dispersos que se juntaram, nas mais complicadas condições de censura de guerra
e censura de partido, na ilegal Liga Espartaquista (fundada em 1916) e no
Partido Socialista Independente (fundado em 1917).
O SPD não jogou nenhum papel na
vitoriosa Revolução de 1918. Pelo contrário, se opôs à revolução desde o
primeiro momento. Em Berlim, Scheidermann declarava:
“A acusação de que a socialdemocracia
buscou ou preparou a Revolução de Novembro é uma ridícula e estúpida mentira
dos nossos opositores” (R. Palme Dutt).
Quando estourou a revolução, os líderes
socialdemocratas ocuparam posições ministeriais no Governo de coalizão do
Príncipe Maximilian von Baden. No período crítico, o seu executivo declarou a
população que não apoiava a revolução. Mas com o triunfo da revolução em 9 de
Novembro, os líderes socialdemocratas correram à Liebneckt e aos Independentes
para mendigar um posto no comando da revolução vitoriosa e formar um governo de
coalizão. Sem levar em conta o conselho de Liebneckt, os Independentes morderam
o anzol em nome da unidade e formaram uma coalizão com os socialdemocratas,
isto quer dizer, com os inimigos da revolução, os agentes da burguesia. Foi
assim que a influência burguesa foi restaurada no coração do novo regime pela
socialdemocracia traidora.
Longe de destruir a velha máquina
estatal – o exército, a polícia, o judiciário e a burocracia reacionária – o
governo socialdemocrata protegeu o velho regime com cada medida que tomou. Ao
invés de armar o proletariado para a defesa da revolução, não só ordenou o
desarmamento dos trabalhadores, como também armou um corpo especial contrarrevolucionário,
sob o comando de oficiais monarquistas ultrarreacionários. E foram estas tropas
da Guarda Branca que afogaram a revolução proletária em sangue. Liebneckt e
Rosa Luxemburgo foram assassinados brutalmente. Os seus assassinos, impunes,
regozijaram-se do seu crime debaixo da protecção do governo socialdemocrata.
Firme e sistematicamente, com a aplicação de um terror ilimitado, a resistência
dos trabalhadores foi quebrada do final de 1918 até 1919. Com o fracasso da
Revolução de 1918 motivado pela actuação da socialdemocracia, a base foi
colocada para o subsequente ascenso do fascismo.
Longe de ser cegueira, loucura ou
estupidez, como os seus apologistas querem nos fazer acreditar, os líderes
socialdemocratas atuaram assim somente para cumprir seu ardente desejo de
“salvar a Alemanha do bolchevismo”, isto é, salvar o capitalismo. Para alcançar
este objectivo, a socialdemocracia estava preparada para cometer qualquer
crime, qualquer ultraje, contra o proletariado.
Enquanto os corpos armados
contrarrevolucionários ilegais foram protegidos e tolerados pela
socialdemocracia e pela Entente, a tentativa de autodefesa dos trabalhadores
com a organização de uma Frente Vermelha foi reprimida brutalmente pelo
socialdemocrata Ministro do Interior em 1929. Assim foi construída a República
de Weimar, que existiu de 1918 até 1932, sob a base de uma coalizão entre a
burguesia e a socialdemocracia. Durante a maior parte destes anos, a
socialdemocracia fez parte do Governo Federal (de 1918 a 1925, com a
presidência de Friedrich Ebert, e de 1928 a 1930, no gabinete de Hermann
Müller). A polícia estava nas mãos de políticos socialdemocratas. Em vista
disso, não é exagerado dizer que o fascismo subiu ao poder sob a protecção da
socialdemocracia.
Embora no papel, a República de Weimar
fosse “a melhor democracia do mundo”, na realidade era um instrumento para a
manutenção das instituições reacionárias do velho regime. A República de Weimar
apelou aos monarquistas e generais para defendê-la dos comunistas, e assim a
violenta repressão contra os trabalhadores, com frequente uso da Lei Marcial e
leis de emergência contra o proletariado. Por isso, um famoso jornalista
burguês estadunidense, Mowrer, que não tinha nenhum sentimento revolucionário,
teve que disser sobre esta “república democrática”:
“Uma virginal República que apela aos
antigos monarquistas e generais para defendê-la dos comunistas!...
Que podemos dizer de uma república que
permite que as suas leis sejam interpretadas por juízes monárquicos; o seu
governo é administrado por antigos funcionários fiéis ao velho regime; que
assiste passivamente como os professores reaccionários ensinam aos rapazes a
desrespeitar a liberdade actual em favor de um pretensioso passado feudal; que
permite e incentiva o renascimento do militarismo, que foi o principal
responsável pela sua humilhação anterior?
O que se pode dizer de democratas que
subsidiam antigos príncipes que atacam o regime; que fazem o ex-imperador o
homem mais rico em deferência a supostos direitos de propriedade...? Esta República
pagou generosas pensões a milhares de ex-oficiais e funcionários que não
escondem o desejo de derrubá-la.” (Edgar Ansel Mowrer, Germany puts the clock back,
citado em R. Palme Dutt).
Eram estas, precisamente, as condições
nas quais o fascismo utilizou o descontentamento generalizado, as dificuldades
económicas e raiva universal contra o humilhante Tratado de Versalhes e o seu
tributo. Isto só pode ser feito, no entanto, por que a socialdemocracia alemã,
que tinha a liderança sobre a maioria da classe trabalhadora, longe de actuar
sobre essas questões, estava completamente identificada com o capitalismo, com
o regime de Versalhes e com a repressão das massas proletárias. Para coroar tudo
isso, a regime “democrático” burguês ajudou o fascismo a construir seus corpos
armados, protegendo-o de cima e auxiliando-o directamente com a máquina estatal
– polícia, judiciário e grandes capitalistas – até colocá-los finalmente no
poder.
O fascismo alemão não tinha nenhuma
possibilidade de chegar às massas e construir assim uma ampla base de massas
sem a pretensão de levantar a bandeira do “socialismo”. Nessa época a
propaganda nazista caracterizava-se por uma mistura eclética de demagogia
contraditória e pouco escrupulosa, antissemitismo visceral, retórica
anticapitalista selvagem e denúncia chauvinista do Tratado de Versalhes. Em seu
Mein Kampf, em um parágrafo suprimido desde a 12ª edição, em 1932, Hitler
afirmava:
“O alemão não tem a mínima noção de como
de como se deve enganar um povo se é a adesão das massas que é buscada”. O
modelo de Hitler era a propaganda de guerra britânica, que era objecto de sua
admiração como o melhor exemplo de mentira demagógica.
O dramático avanço do fascismo alemão de
1930 até 1932 explica-se pelo fato de que a crise económica mundial não só
minou toda a base da estabilização e da República de Weimar, como também minou
a posição da socialdemocracia, que estava intimamente associada a estes. A
crise económica e o regime de forme de Heinrich Brüning expuseram finalmente a
falência total das promessas e dos contos de fadas da socialdemocracia sobre o
progresso democrático pacífico e a prosperidade do capitalismo. Com a
propagação da desilusão com a socialdemocracia, os trabalhadores conscientes de
sua classe passaram ao comunismo, enquanto os elementos atrasados entraram para
o campo fascista. Entre 1930 e 1932, a socialdemocracia perdeu 1.338.000 votos,
o Partido Comunista ganhou 1.384.000. Com a Socialdemocracia enfraquecida e
desacreditada já não capaz de frear o crescente avanço do comunismo e a
consequente polarização da sociedade em dois pólos hostis claramente definidos,
o capitalismo alemão necessitava novos métodos e novos instrumentos. Diante de
uma crise económica sem precedentes, a burguesia precisava desesperadamente
acabar com as conquistas sociais da Revolução de 1918 no campo dos salários,
horas de trabalho e legislação social, que até então constituíam os pilares da
influência da socialdemocracia entre o proletariado. Ao invés das concessões
dos primeiros anos após a revolução, o capitalismo tinha que colocar em prática
medidas draconianas de privações económicas para a classe trabalhadora. Para
atingir esse objectivo, tendo em vista a existência de um poderoso Partido
Comunista, com uma forte e crescente influência sobre a classe operária, e o
declínio da socialdemocracia, o capitalismo alemão precisou de uma nova – e nua
– forma de ditadura. Sem cerimónia, a socialdemocracia foi posta de fora do
Governo Federal e substituída pela ditadura de Heinrich Brüning no verão de
1930, que governou sem parlamento por meio de decretos de emergência, mas com
apoio socialdemocrata. Foi a partir deste período – no tempo da ditadura de
Brüning – quando a esmagadora maioria dos capitalistas e proprietários alemães
transferiu completamente a sua fidelidade ao Nacional-Socialismo, até então
apoiado parcialmente como instrumento de sua ditadura terrorista. Se a
socialdemocracia buscasse uma aliança com os comunistas para construir uma
resistência conjunta à feroz ofensiva da ditadura de Brüning, é perfeitamente
razoável supor que a ofensiva capitalista não teria sucesso. Porém, em nome da
política do “mal menor” a socialdemocracia apoiou a ditadura de Brüning e os
seus ferozes ataques à classe trabalhadora. Com isso fortaleceu o capitalismo,
enfraquecido diante dos trabalhadores, desorganizou as fileiras proletárias e
fez o jogo do fascismo. Esta desorganização das forças do proletariado no
período crítico de 1930-1932 significou que os ganhos políticos da fome
generalizada, que deveria ter fortalecido o campo proletário, ao invés disso,
passou para o fascismo.
Antes dos nazistas subirem ao poder, o
Partido Comunista junto à RGO (Oposição Sindical Revolucionária) publicaram
chamados ao Partido Socialdemocrata e à Conferederação Sindical Geral Alemã
(Allgemeinen Deutschen Gewerkschaftsbund - ADGB) para a unidade de acção de
todas as organizações operárias contra o iminente corte de salários (Abril de
1932), contra a política de decretos de emergência e pela dissolução das tropas
de assalto (20 de Julho de 1932). Estas duas petições foram rejeitadas sob a
desculpa esfarrapada de que o apelo à greve geral constituía uma provocação, e
que a eleição era o único instrumento válido contra o fascismo. Uma terceira
chamada para a formação de uma Frente Única foi publicada pelo Partido
Comunista em 30 de Janeiro de 1933, após Hitler ter sido nomeado Chanceler.
Este chamado teve tamanho apoio popular que o SPD, ainda que não tenha
respondido oficialmente, teve que explicar a resposta negativa em suas próprias
publicações. Rejeitando expressamente toda acção conjunta contra Hitler, uma
vez que ele tinha alçado ao poder legalmente, o Partido Socialdemocrata propôs
ao Partido Comunista um “pacto de não agressão”, isto é, abstenção da crítica
verbal mútua. O quarto chamado para constituir uma frente única, em 1º de Março
de 1933, depois do incêndio do Reichstag quando se desencadeou o desenfreado
terror nazista, também ficou sem resposta dos líderes socialdemocratas, então
ocupados em chegar a um entendimento com os hitleristas para que a
socialdemocracia fosse tolerada sob o fascismo. Ignorantes reforçam a crítica
de que a ênfase dada pelo Partido Comunista sobre a “frente única pela base” e
sua falha em não apelar directamente para a liderança socialdemocrata alemã e
sindicatos antes que 1932 contribuíram para o fracasso da classe trabalhadora
na tentativa de frear o avanço do fascismo. Essa crítica é totalmente
infundada, já que não leva em conta as condições concretas da Alemanha naquela
época. Quando o socialdemocrata, Karl Severing, em sua condição de Ministro do
Interior, mandou disparar contra as manifestações dos trabalhadores no 1º de
Maio de 1929, seria absurdo propor à direcção socialdemocrata uma frente única
para defender os trabalhadores. Porém com a expulsão de Otto Braun e Karl
Severing do governo por Von Papen, a situação se modificou, e o Partido
Comunista enviou sua proposta ao SPD e à ADGB. A categórica negativa destas
duas organizações à proposta dos comunistas garantiu a vitória do fascismo.
Assim, a construção de uma frente única
da classe operária, única possibilidade de derrotar os nazistas, foi
impossibilitada pela obstinada recusa da socialdemocracia em cooperar com os
comunistas, uma resposta negativa que preparou o terreno para a vitória do
fascismo. Essa atitude da socialdemocracia vai ao encontro com sua linha de
colaboração de classe com a burguesia e a sua confiança no Estado burguês – uma
linha política seguida inclusive durante a ditadura de Hinderburg, Brüning e
Von Papen, declarando que eram um “mal menor” comparado com a vitória absoluta
do fascismo. Longe de ser um mal menor, estas formas de ditadura apenas
preparam o terreno para a vitória completa do fascismo, destruindo, passo a
passo, a resistência da classe operária. Com o seu trabalho concluído,
entregaram aos hitleristas. Hinderburg foi empossado como presidente com o
apoio da socialdemocracia. E após um ano, ele nomeou Hitler como Chanceler.
Mesmo depois da vitória hitlerista, a Socialdemocracia recusou a se opor, pela
razão de que o fato de terem chegado ao poder “legalmente”, foi um “mal menor”
do que um terror nazista “ilegal”.
Sem êxito em seus esforços para garantir
a cooperação da socialdemocracia em uma frente única da classe operária contra
os ataques do capital e os regimes ditatoriais, o Partido Comunista foi capaz
de construir uma frente parcial, possibilitando o aumento da resistência da
classe operária, que culminou na greve dos transportes em Berlim em Novembro de
1932. A greve foi liderada pela opositora RGO, depois que os funcionários do
sindicato oficial se negarem a apoiar a greve que fora votada majoritariamente
pelos trabalhadores. Paralelamente a isso, as eleições de Novembro de 1932
demonstraram a crescente resistência da classe operária: enquanto os votos
nazistas caiam em 2 milhões e os votos socialdemocratas em 700 mil, o Partido
Comunista aumentava em 700 mil, chegando a quase 6 milhões. No dia 17 desse
mesmo mês de novembro, Von Papen é obrigado a renunciar a seu cargo, e esta
demissão foi seguida de longas negociações entre Hindenburg e Hitler. Diante da
crescente militância da classe trabalhadora, considerou-se inoportuno nomear
Hitler como Chanceler e assim foi designado von Schleicher. Este ofereceu
algumas poucas concessões à classe operária, recebendo o aplauso das direcções
do Partido Socialdemocrata e do sindicato oficial, e assim conseguiu diminuir a
resistência da classe operária que estava sob a nociva influência da
socialdemocracia. Uma vez que as condições necessárias foram preparadas, Hitler
foi nomeado Chanceler em 30 de Janeiro de 1933. O refluxo da maré fascista que
se evidenciou nas eleições de Novembro de 1932, longe de sinalizar o começo de
seu fim, como assim propagandeava a socialdemocracia, simplesmente convenceu a
burguesia de que deveriam acelerar a ascensão do fascismo ao poder antes que
fossem irremediavelmente afundados e que os comunistas subissem ao poder.
"Depois da derrota dos
Nacional-socialistas nas eleições do Reichstag de Novembro, os grandes homens
de negócios alemães decidiram que o perigo imediato estava na desintegração
demasiada rápida do Partido Nazista” (Hoover, Germany Enters the Third Reich,
citado em R. Palme Dutt)
Então, os grandes capitalistas decidiram
instalar os fascistas no poder com o único objectivo de permitir que utilizarem
o Estado para reconstruir as suas forças e aniquilar toda a oposição.
Enfraquecer a vontade de resistência da
classe operária alemã não foi obra do fascismo mas sim da socialdemocracia,
cujos dirigentes trataram a perspectiva de um governo nazista como uma luz
favorável. Assim, em Abril de 1932, Karl Severing afirma: “O Partido
Socialdemocrata, tanto quanto o Partido Católico, está inclinado a ver os
nazistas compartilharem as responsabilidades do governo”. (R. Palme Dutt).
Ao chegar ao poder, Hitler armou as suas
Tropas de Assalto, incorporando-as ao corpo de polícia auxiliar, com a
atribuição especial de policiar as eleições marcadas para o dia 5 de Março.
Suprimiu toda a imprensa socialdemocrata e comunista, prendeu os seus
principais líderes, proibiu todas as reuniões da classe trabalhadora e
propaganda operária, desencadeou um regime de terror e realizou as eleições
nestas condições. Estas eleições, realizadas “sob os grilhões do vil
terrorismo”, como correctamente comentou o Daily Herald de 4 de Março de 1933,
e acompanhadas por irregularidades graves (em alguns distritos, os números de
votos excedeu o número do eleitorado) dificilmente reflectiam os desejos do
povo alemão. Ignorando tudo isso, a Socialdemocracia recorreu ao argumento de
que agora Hitler tinha um “mandato democrático”, e que não era justificável
opor-se a ele, a não ser como “uma oposição parlamentar leal”. Levando o
cretinismo parlamentar até o extremo de apoiar um regime terrorista fascista
por que tinham maioria no Parlamento, sem ter em conta que essa maioria foi
conquistada na ponta da baioneta em eleições realizadas sob terror, Stampfen, o
antigo editor de Vorwärts, escreveu:
“A vitória dos partidos do governo
tornou possível governar respeitando estritamente a Constituição".
"Eles só tem que agir como um
governo legal, para que nós sejamos, naturalmente, uma oposição legal, se eles
optam por usar sua maioria para as medidas que permanecem no âmbito da
Constituição, iremos nos limitar ao papel de seus críticos justos."
Por sua vez, Kautsky, contemporâneo do
líder da Segunda Internacional e considerado como o melhor teórico marxista
depois da morte de Marx, mas que desde muito tempo defendia posições totalmente
degeneradas, escrevia:
“A ditadura conta com o respaldo das
massas”.
Kautsky percorrera um longo caminho
desde 1906, quando publicou o seu famoso O Caminho do Poder. Começando com o
oportunismo nas questões das tarefas da revolução proletária diante do Estado
burguês, através do seu apoio a imperialista Primeira Guerra Mundial e sua
oposição à revolução proletária na Rússia, ele rolou para o fundo da sarjeta,
escrevendo peças que embelezavam o regime hitlerista como fundado com apoio das
massas.
William Norman Ewer do Daily Herald,
escreveu que o triunfo de Hitler era “...uma vitória da democracia” por que ele
“chegou ao poder por meio do mais estrito respeito à constituição... É claro
que houve certos actos de intimidação. Sempre existem... As estatísticas são a
prova de que as eleições foram praticamente livres” (“Why Hitler Triumphed,
Plebs, Abril de 1933, citado em H. Palme Dutt)
Desta maneira a socialdemocracia tentou
esconder o seu servilismo ao fascismo, primeiro ignorando as condições de terror
sob as quais a eleição de 5 de Março foi realizada, em seguida, usando o engodo
de que a vitória na eleição dava legitimidade democrática para o regime
fascista.
A desprezível e vergonhosa linha da
socialdemocracia continuou depois das eleições em um vã tentativa de agradar os
fascistas. O discurso do líder socialdemocrata, Otto Wels, na abertura do
Reichstag de 23 de Março, foi uma expressão importante desta linha. Ele, como
líder do partido, renunciou abertamente a formar parte do Comitê Executivo da Segunda
Internacional, acusando esta de propagar “histórias de atrocidades” contra os
fascistas. A direcção sindical declarou sua disposição a colaborar com os
nazistas, aclamando em sua imprensa a “revolução” fascista, como uma triunfante
“continuação da Revolução de 1918”.
Ele ressaltou que o inimigo era o
comunismo, e que o "socialismo" nazista era um “assunto alemão”
(Sozial Demokratischer Pressedient de 9 de Março de 1933, citado por R. Palme
Dutt). Rebaixado as profundezas da degradação e da traição à classe
trabalhadora, com base nisso, o comité executivo dos sindicatos fez uma
convocação oficial para que os trabalhadores participassem dos actos
hitleristas do Primeiro de Maio.
“Os líderes sindicais selaram a sua
reconciliação com o novo poder da Alemanha”, podia-se ler no Daily Herald do
dia 24 de Abril de 1933.
A intenção dos reformistas
socialdemocratas de jogar o papel de um adjunto reconhecido pelo fascismo
fracassou, em parte pelo fato de que um enorme número de trabalhadores das
grandes fábricas rejeitaram a convocação de seus líderes e não participaram dos
desfiles nazistas do Primeiro de Maio. Uma vez que ficou demonstrado com
clareza que os líderes socialdemocratas não podiam controlar os trabalhadores
para servir aos fins fascistas, imediatamente em 2 de maio, os nazistas
apreenderam os sindicatos, inserindo-os em sua própria Frente do Trabalho,
colocou os líderes na prisão e em seus lugares nomearam funcionários nazistas.
“Os Leipart e os Garassmanns”, declarou
Robert Ley, líder da Frente do Trabalho nazista, “podem professar a sua devoção
à Hitler, mas estão melhores na prisão” (citado em R. Palme Dutt).
Por sua vez, o Partido Socialdemocrata,
depois de sua trajectória de humilhação, degradação e capitulação, partiu para
a dissolução. Em 17 de Maio todos os seus membros no Reichstag votaram a favor
do governo fascista e participaram da aclamação unânime à Hitler. De pouco
valeu a sua total submissão! Todas as propriedades do SPD foram confiscadas, e
em 22 de Junho a própria organização foi declarada “dissolvida”.
Assim, a burguesia obrigava a
socialdemocracia a seguir a sua obra em condições de ilegalidade – as condições
em que poderia ser mais útil para a classe dominante em caso de levante
revolucionário do que se fossem próximos e abertamente identificados com o
fascismo.
A honra de ser a única oposição
consistente à burguesia, e particularmente ao fascismo, cabe ao Partido
Comunista. O equilíbrio de forças entre classes que se deu durante o período em
discussão impossibilitou que coroassem os seus esforços com sucesso, porém o
fato é que a sua linha foi correcta, e que a seguiu dentro do movimento da
classe trabalhadora sem medo – disto, não se pode haver a menor dúvida.
Diante do que foi exposto, podemos
enumerar as causas decisivas da vitória temporária do fascismo:
Estrangulamento da Revolução de 1918 em
nome da “democracia” por parte da socialdemocracia e dos sindicatos, e a
restauração do poder dos capitalistas, dos proprietários e das velhas
instituições reacionárias;
O apoio da socialdemocracia e dos
sindicatos aos regimes ditatoriais que antecederam a tomada do poder pelos
nazistas;
A rejeição dos socialdemocratas e da
direção sindical à criação da frente única operária;
A recusa da socialdemocracia e da
direcção sindical em resistir a ascensão de Hitler ao poder ou no começo do
terror nazista;
Como assinalou corretamente Palme Dutt:
“A experiência na Alemanha de 1918 até 1933 é a clássica demonstração diante da
classe operária internacional de como uma revolução operária pode ser destruída
e cair no abismo da submissão da classe trabalhadora. É a demonstração, diante
da classe operária internacional, de que o caminho da democracia burguesa
conduz, passo a passo, à sua derrota inexorável”.
Na Áustria também “a vitória da
revolução proletária... estava totalmente nas mãos da classe trabalhadora em
1918-1919, e só foi evitada pela socialdemocracia”. Esta era a opinião
generalizada, e admitida pelos próprios líderes socialdemocratas. Otto Bauer
retrata a situação n final da guerra em seu livro A Revolução Austríaca de
1918:
“Havia uma tremenda agitação nas
barricadas do exército popular. O exército popular sentia que era o portador da
revolução, a vanguarda do proletariado... Os soldados, com armas na mão,
esperavam uma vitória do proletariado... ‘Ditadura do proletariado! Todo o
poder aos Soviets!' era tudo que se escutava nas ruas”.
Continua:
“O governo burguês não poderia ter
lidado com essa tarefa. Teria sido desarmado pela desconfiança e desprezo das
massas. Teria sido derrubado em uma semana por um levante de rua e desarmado
por seus próprios soldados”.
“Somente os socialdemocratas podiam
manejar com segurança uma situação tão difícil e sem precedentes, por que
gozava da confiança das massas operárias... Somente os socialdemocratas podiam
deter pacificamente as tempestivas manifestações por meio da negociação e
persuasão. Somente os socialdemocratas podiam dirigir o exército popular e
conter as aventuras revolucionárias das massas trabalhadoras... O profundo
abalo da ordem social burguesa foi expresso naquele governo burguês, um governo
que sem a participação dos socialdemocratas, teria sido simplesmente
impensável”.
“O papel da socialdemocracia austríaca
foi, de fato, o mesmo que o da socialdemocracia alemã. A força da revolução dos
trabalhadores foi destruída deliberadamente pela socialdemocracia em nome da
“democracia” burguesa”. (R. Palme Dutt)
O desenvolvimento do fascismo na Itália,
Alemanha e Áustria revela com clareza que o papel da socialdemocracia é crucial
na ascensão do fascismo ao poder. Sem compreender esta interrelação entre a
socialdemocracia e o fascismo, é impossível compreender a política capitalista
desde o fim da Primeira Guerra Mundial, que marcou o abandono aberto da
socialdemocracia, o que representa a ida de setores significativos do movimento
da classe operária, especialmente dos sindicatos e liderança parlamentar, em
todos os países imperialistas para o lado da burguesia.
Os partidos socialdemocratas jogaram um
papel fundamental na destruição das revoluções operárias nos anos imediatamente
posteriores à Primeira Guerra Mundial, na ascensão do fascismo nos anos
seguintes, e na luta contra o comunismo desde a Segunda Guerra Mundial.
5. A socialdemocracia aos olhos dos
capitalistas
Se quisermos conhecer a visão clara,
racional e fria que o capital financeiro tem do papel que a socialdemocracia e
o fascismo têm na manutenção do capitalismo, temos que fazer uma rápida
referência ao Deutsche Führerbriefe (Cartas aos líderes), o boletim
confidencial da Federação da Indústria Alemã (FGI) durante o crucial ano de
1932. Publicado para circular confidencialmente entre os chefes do capital
financeiro agrupados na FGI, os números 72 e 75 incorporaram o estudo “The
Social Reconsolidation of Capitalism”, notável pela sua sinceridade e clareza.
A tese básica do autor dessas
comunicações confidenciais é a de que a manutenção do sistema capitalismo
reside na divisão da classe trabalhadora; que o único perigo importante para o
capitalismo é a uma classe operária unida, contra a qual é inútil qualquer
força armada por maior que seja; que, portanto, o capitalismo precisa de uma
base social que vá além de suas estreitas fileiras que não “demasiado pequenas
para sustentar o seu poder sozinhas”, após a Primeira Guerra Mundial, esta base
social foi providenciada pela socialdemocracia, que ofereceu ao capitalismo o
“seu serviço indispensável para ancorar seu domínio sobre o povo, e desse
jeito, ser o portador atual e final deste poder”.
Se a socialdemocracia permitiu se
assentar as bases para a manutenção do capitalismo dividindo a classe operária,
como provocou esta divisão? Qual, em outras palavras, é a base social da
socialdemocracia? A resposta que o representante do capital financeiro dá a
esta importantíssima questão apresenta uma notável semelhança com a análise
leninista quanto às razões da divisão da classe operária nos países
imperialistas, nomeadamente, as condições privilegiadas, baseadas em
concessões, das camadas superiores da classe trabalhadora – a aristocracia operária.
Com a sua influência e controle sobre os sindicatos, a socialdemocracia,
enquanto paralisava o potencial revolucionário da classe operária,
“acorrentava-a com rapidez ao estado burguês”. O fim da estabilização e o
início da crise econômica, no entanto, obrigou a burguesia acabar com as
concessões anteriores feitas à classe trabalhadora, e com isso minou a
Socialdemocracia, abrindo as portas para a influência e a vitória do comunismo.
Com o enfraquecimento da Socialdemocracia graças à crise capitalista, “... a
dominação burguesa foi confrontada com a necessidade do estabelecimento de uma
ditadura militar. Essa fase marca o início da fase da doença incurável da
dominação burguesa. O único meio possível de salvar a dominação burguesa deste
abismo é dividir a classe operária e subordiná-la ao Estado por meios mais
directos. Estas são as possibilidades positivas e as tarefas do
nacional-socialismo”.
Em outras palavras, as condições
modificadas fizeram necessária uma troca na forma de estado. Se o encadeamento
da classe operária ao Estado burguês, organizado pela socialdemocracia, precisa
de uma forma parlamentar de governo, a destruição das bases da
socialdemocracia, consequência da retirada das concessões à classe operária,
obriga o capitalismo a passar para uma forma não parlamentar – uma forma de
poder coercitivo – o fascismo.
“Um regime burguês baseado em uma
constituição liberal não deve ser apenas parlamentar; deve contar com o apoio
da socialdemocracia e lhe permitir conquistas adequadas. Um regime burguês que
destrói esta forma liberal deve sacrificar a socialdemocracia e o
parlamentarismo, deve criar um substituto para a socialdemocracia, e deve
caminhar para uma constituição social restrita” – fascismo, em linguagem
simples.
O autor do Deutsche Führerbriefe
encontra um paralelo marcante entre o papel da socialdemocracia entre 1918 e
1930 e o do fascismo depois de 1930:
“O paralelismo é realmente
impressionante. A socialdemocracia (1918-1930) e atualmente o nazismo
desempenham funções semelhantes, ambos se apresentam como coveiros do sistema
anterior, e então, ao invés de conduzir as massas para a revolução proclamada
por eles, levou-as para uma nova forma de dominação burguesa. A comparação que
tem sido muitas vezes feita entre Ebert e Hitler também é válida sobre este
aspecto, pelo apelo a desejos de emancipação anticapitalistas; ambos prometem
uma nova ‘social' ou ‘nacional' comunidade”.
A sua conclusão é: “O paralelismo
demonstra por si mesmo que o nazismo substituiu a socialdemocracia na tarefa de
conseguir o apoio das massas ao poder da burguesia na Alemanha”.
A análise anterior, embora contenha
muitos aspectos válidos, necessita ser corrigida e complementada. O autor das
caras fala como se o fascismo assumisse o papel (de fornecer apoio das massas
ao poder burguês) que antes era exercido pela socialdemocracia, com o fascismo
e a socialdemocracia exercendo papeis idênticos em períodos e condições
diferentes, e consequentemente, com formas de governo e métodos distintos. Isto
é demasiado simplista. O fato é que eles coexistem, cada um desempenhando um
papel concreto, complementando-se mutuamente. Enquanto o fascismo se apoia em
uma base social composta principalmente pela pequena burguesia,
lumpenproletariado e trabalhadores atrasados, a socialdemocracia apoia-se nos
sectores privilegiados da classe operária organizada. Mesmo após a vitória do
fascismo, a influência, a ideologia e as tradições da socialdemocracia seguem
no seu papel nefasto e desorganizador, impedindo o surgimento de uma frente
unida da classe operária para enfrentar e derrotar o fascismo. Além disso, se
mais adiante a ditadura fascista perde força, então a socialdemocracia está na
espera para agir no resgate do capitalismo.
O que é indubitável é que tanto a
socialdemocracia quanto o fascismo são agentes do capitalismo monopolista;
ambos lutam com unhas e dentes contra a emancipação social da classe operária.
Os seus métodos são, porém, diferentes.
Enquanto o fascismo quebra as organizações da classe operária de fora,
opondo-se a todos os seus princípios e propondo uma alternativa ideológica de
carácter “nacional”, a socialdemocracia enfraquece-as de dentro, desviando-as
para os canais do reformismo burguês. Enquanto o fascismo baseia-se
principalmente na coerção, juntamente com o engano, a socialdemocracia
baseia-se principalmente no engano, juntamente com a coerção. Seus objetivos
são idênticos, apenas seus métodos são diferentes. Tendo em vista isso, não
podemos deixar de concordar com a observação de Estaline, feita no começo de
1924, que a “socialdemocracia representa objectivamente a ala moderada do
fascismo.” (Sobre a situação internacional, Obras Completas, vol. 6, p. 294)
O fascismo é um produto da crise geral
do capitalismo após a Primeira Guerra Mundial. De fato, é “consequência do aborto
consequente do malogro da revolução proletária” (Palme Dutt, op. cit., p. 157).
Desde 1914, quando a socialdemocracia
abandona o marxismo e o internacionalismo (com excepção do Partido Trabalhista
Britânico, que nunca foi marxista e sempre foi chauvinista), começou a
desenvolver uma tendência ideológica semelhante ao fascismo. Defesa da unidade
dos interesses da classe operária e do capitalismo monopolista, abandono total
do internacionalismo, “socialismo” – inclusa a fraseologia revolucionária que empregava
para disfarçar a sua total subordinação ao capitalismo -, oposição decisiva as
lutas de libertação nacional contra a exploração e opressão imperialista e
hostilidade completa ao marxismo, a ideologia do proletariado moderno. Estes
princípios da socialdemocracia não são muito diferentes dos princípios básicos
do fascismo. E mais, prepararam o terreno ideológico para a ascensão do
fascismo.
A socialdemocracia emergiu da Primeira
Guerra Mundial com o duplo objectivo de derrotar a revolução proletária e
reconstruir a estrutura parcialmente destruída do capitalismo. De fato,
realizaram muito bem estas vergonhosas tarefas. Nenhum crime foi demais para
ela para derrotar a revolução – assassinato de líderes revolucionários,
encarceramento de milhares de revolucionários e repressão generalizada. Assumiu
responsabilidades governamentais e empreendeu a tarefa de acabar com os
operários mais militantes, fez algumas concessões para pacificar alguns
sectores, tudo isso com o objectivo de salvar a pele do capital financeiro.
Quando a revolução foi derrotada e foi
iniciado o período de reconstrução e estabilização, a socialdemocracia
adicionou um novo ingrediente à sua ideologia contrarrevolucionária. Sustentou
que o colapso do capitalismo não era do interesse da classe trabalhadora; que
pelo contrário, a classe trabalhadora precisava de um capitalismo próspero como
um meio para avançar para o socialismo (“é inútil socializar a miséria”,
escreveu Kautsky); que, longe de estar em sua fase final, o desenvolvimento capitalista
avançava para uma nova era do “capitalismo organizado” e que, portanto, era o
dever da classe operária cooperar e ajudar neste novo desenvolvimento, pela
participação económica por meio dos sindicatos (mondismo, etc.) e
politicamente, por meio dos partidos socialdemocratas, em coalizões e
participações nos governos capitalistas.
Tarnov, o líder do principal sindicato
alemão, declarou:
“O marxismo como ideologia principal do
movimento da classe operária sobreviveu. Mas um movimento realmente de massas
não pode existir sem a sua correspondente ideologia, portanto, os líderes
sindicais devem criar esta nova ideologia”.
Esta nova ideologia de que falava
Tarnov, era, de fato, muito antiga e pré-marxista, isto é, a unidade de
interesses da classe operária e da classe capitalista exploradora.
O Conselho Geral do TUC, no seu informe
ao Congresso de Swansea em 1928, apostou abertamente no Mondismo e na
colaboração de classe, afirmando:
“A política final do movimento pode
encontrar mais vantagens em uma indústria eficiente do que em uma decadente, e
os sindicatos podem utilizar o seu poder para promover e dirigir a organização
científica da indústria, bem como obter vantagens materiais desta
reorganização” (citado em Palme Dutt, op. cit. p. 159).
“A socialdemocracia é um elemento
indispensável do estado”, declarou Hilferding no Congresso do Partido
Socialdemocrata Alemão em Kiel.
Esta miserável situação consiste na
incorporação da socialdemocracia e dos sindicatos à estrutura estatal do
capitalismo monopolista, com o único propósito de consolidar este último,
enquanto qualificam essa actividade vergonhosa como avanço do “socialismo”.
Neste sentido, o líder socialdemocrata
alemão, Diffman, no Congresso do seu partido em Magdeburg, continuou a
proclamar:
“Nós já não estamos vivendo sob o
capitalismo; estamos vivendo no período de transição ao socialismo,
economicamente, politicamente, socialmente... Na Alemanha temos dez vezes mais
conquistas socialistas para defender do que se tem na Rússia”.
E quando a crise económica mundial
desferiu um golpe devastador nesta fantasia aconchegante, longe de rectificar,
a socialdemocracia adaptou a sua teoria oportunista, declarando que agora o
trabalho da classe operária era salvar o capitalismo do perigo e do caos da
revolução proletária.
“Devemos ser os médicos do capitalismo
doente”, foi o apelo do Partido Socialdemocrata Alemão no Congresso de Leipzig,
em 1931.
Vandervelde, o presidente da Segunda
Internacional, em 1932, levou à Câmara dos Deputados da Bélgica esta súplica
desesperada do imperialismo:
“O sistema capitalista está rachando por
todas as partes. Só se pode salvar com medidas sérias e urgentes. Estamos na
última hora. Tenhamos cuidado para que o proletariado, como Sansão, não bote
abaixo as colunas do templo”.
Montel, o socialista francês, já em 1928
antes do começo da crise, proclamara: “O Partido Socialista se apresenta como o
único partido capaz de salvar a sociedade burguesa” (citado em Palme Dutt, op.
cit. 161).
Esta linha teórica de propaganda deixa
claro que a socialdemocracia fazia objectivamente todos os preparativos
necessários para a ideologia fascista e assim facilitar sua ascensão ao poder.
Inclusive, depois da vitória fascista na Alemanha, o líder sindical alemão,
Leipart, propôs uma aliança à sanguinária ditadura hitlerista.
A essência da socialdemocracia é a ideia
e a prática da colaboração de classe com o capitalismo e o estado capitalista.
Além disso, apresenta essa linha como o avanço seguro, pacífico, harmonioso,
“democrático” e progressista para o socialismo – em contraste com os perigos de
uma revolução proletária violenta. A experiência, porém, demonstra que, longe
de ser um avanço ao socialismo, essa linha teórica e prática conduz a violência
sem precedentes contra o proletariado, consolida a ditadura capitalista em
geral, e tem o seu ponto culminante, em certas circunstâncias, com a vitória do
fascismo e a guerra imperialista.
O comunismo e a revolução proletária
oferecem a saída do inferno e carnificina imperialista, da opressão e
exploração capitalista.
Comunismo ou fascismo?, essa é a escolha
que se apresenta à classe operária. A terceira via oferecida pela
socialdemocracia só conduz, em última análise, ao beco sem saída do fascismo.
6. Fascismo e Demagogia
Despojado de todo subterfúgio e
verborragia, de toda a sua embalagem mística e absurda, o fascismo é a
tentativa violenta do capitalismo decadente de derrotar a revolução proletária
e retardar a sua própria morte. O fascismo usa demagogia, pois não ousam
declarar abertamente os seus objectivos, já que não conseguiriam nenhum apoio
das massas baseado nos seus objectivos reais.
“O bolchevismo está batendo à nossa
porta. Não podemos permitir que entre. Devemos nos organizar contra ele, botar
nossos ombros juntos à porta e resistir. Devemos manter a nossa América unida,
segura e intacta. Temos que manter os trabalhadores longe da literatura
comunista e artimanhas vermelhas; devemos nos assegurar que suas mentes
permaneçam sãs” (Al Capone).
O apelo deste ladrão e gangster pela
manutenção da ordem social existente contra a ameaça bolchevique – revolução
proletária – é uma introdução apropriada à ideologia do fascismo. Nenhum dos
dois, bandidos e fascistas, por razões óbvias, aberta e honestamente proclamar
as suas verdades intenções, que não são outras senão a defesa dos interesses do
capitalismo monopolista. Com a sua hipócrita moral permitem-se manter a
sociedade actual “intacta” e manter as mentes dos trabalhadores “saudáveis”. As
façanhas dos gangsters acompanhadas de uma propaganda recheada de tons morais
elevados é característica de uma classe dominante de uma sociedade decadente
que perdeu sua utilidade histórica. Plekhanov corretamente observou:
“Marx disse acertadamente que quanto
maior é o antagonismo entre as crescentes forças de produção e a ordem social
existente, mas permeada de hipocrisia está a ideologia da classe dominante.
Além disso, quanto mais eficaz a revelação do carácter falso desta ideologia,
tanto mais a linguagem utilizada pela classe dominante se torna sublime e
virtuosa...” (Problemas Fundamentais do Marxismo, edição inglesa, 1929, p. 82).
Com o advento do fascismo, a hipocrisia
e a falsidade nota por Marx atinge proporções demagógicas extremas. A tarefa do
fascismo de construir um movimento de massas, popular com forma e conteúdo
reacionário, se caracteriza pela manipulação dos sentimentos atrasados e dos
mais baixos instintos humanos, pela falta de escrúpulos do seu programa que
apela pela união a cada setor da sociedade sem demonstrar preocupação de
coerência e pela falta de vergonha em fazer mudanças bruscas e rejeitar a sua
própria plataforma.
“A demagogia”, como correctamente
observou Palme Dutt, “é a arte de aproveitar-se das esperanças e medos, das
emoções, da ignorância e do sofrimento do pobre para beneficiar o rico e o
poderoso. É a pior das artes. É a arte do fascismo” (op. cit., p. 188)
Basta comparar o programa fascista com o
fascismo em ação para compreender o significado da demagogia. Limitemos-nos à
Alemanha. Aqui, nas circunstâncias concretas, o fascismo teve que apelar ao
“socialismo” e aos sentimentos anticapitalistas da classe operária para poder
subir ao poder e assim servir o capital financeiro. Por isso, os Krupps, a
Thyssen, a Deterdings e os Hohenzollern distribuíam grandes quantias de
dinheiro aos nazistas para a realização de sua propaganda “socialista”, sabendo
muito bem da sua natureza enganosa. Assim, o programa nazista de 25 pontos inclui
itens como a abolição das rendas da propriedade, confisco de todos os lucros de
guerra, nacionalização dos trustes, confisco de terras sem nenhuma compensação
financeira para projectos comunais, participação estatal nos lucros de todos os
grandes negócios e pena de morte para agiotas e especuladores.
Diz-se que quando os devotos do
nacional-socialismo, crentes em cada palavra do programa nazista, se
aproximaram a Goebbels para que lhe explicasse como iria aplicar o princípio de
“quebra de interesses”, receberam a brutal resposta de que provavelmente a
única coisa que iriam “quebrar” seria o crânio de quem se esforçasse para
entender isso.
Enquanto os astutos chefes do capital
financeiro permaneciam totalmente imperturbáveis diante da ameaça do programa
nazista de “nacionalizar todos os trustes”, os estúpidos latifundiários
ficaram, evidentemente, alarmados pelo ponto do programa que falava do
“confisco de terras sem indemnização”. Para acalmar os infundados receios de
tais idiotas, os nazistas inseriram explicações em seu programa tornando-o
completamente inofensivo para os grandes capitalistas e latifundiários.
De tempos em tempos, os nazistas tinham
que tranquilizar os capitalistas que hesitavam em dar-lhes apoio devido à
propaganda “anticapitalista”. Um exemplo claro da demagogia nazista é fornecido
por uma carta escrita pela liderança do partido em Dresden a um capitalista de
Weimar. Esta carta, que caiu nas mãos dos opositores aos nazistas em 1930, foi
publicada. Isto era o que dizia: “Não se deixe confundir pelo texto em nossos
cartazes... Claro que existem palavras de ordem como ‘abaixo o capitalismo',
etc, mas estes são, sem dúvidas, necessários, já que sob a bandeira do
‘nacionalismo alemão' ou simplesmente ‘nacionalismo', você deve saber, nunca
alcançaríamos nossos objectivos, não teríamos nenhum futuro. Devemos falar a
linguagem dos operários socialistas amargurados... ou então eles se sentiriam
em casa connosco. Nós não apresentamos um programa directo por questões de
diplomacia” (Carta de um líder nazista de Dresden para a Indústria Fritsche em
Weimer, em Mowrer, “Germany puts the clock back”, p. 150, citado em Palme Dutt,
op. cit., p. 191).
Uma vez no poder, os fascistas impuseram
uma disciplina militar e draconiana aos trabalhadores, convertendo-os em
virtuais escravos do capitalismo monopolista. Enquanto a guerra de classes
tinha sido abolida para os trabalhadores, do lado capitalista, a luta de
classes, longe de diminuir, continuou – apenas em um ritmo acelerado. O código
de trabalho alemão, de 1º de Maio de 1934, consagrava o poder autocrático
absoluto do capital sobre o trabalho, nos seguintes termos cínicos e brutais:
“O patrão, como líder da fábrica, e os
trabalhadores e administrativos, como os seus seguidores, trabalham
conjuntamente para promover os objectivos da fábrica e defender assim os
interesses comuns do povo e do Estado. As decisões do líder da fábrica são
vinculativas para todos os seus seguidores em todos os assuntos”.
Por este código de trabalho, todos os
membros dos comités de trabalhadores foram substituídos por outros indicados
pelo patrão, em consulta com o representante nazista na fábrica. Todos os
acordos colectivos foram anulados. Os salários deveriam ser fixados por cada
empregador de acordo com a “rentabilidade” do negócio. A última palavra em
salários e condições de trabalho era dos “comissários do trabalho” designados
pelo governo nazista, cujo carácter pode ser medido pelo fato do grande
industrial Krupp ter sido nomeado para a função para toda a região de Rühr.
A essência da realidade do Estado
corporativo fascista pode ser resumida como a destruição de todas as
organizações independentes da classe operária, a abolição do direito de greve,
a intensificação da exploração e escravização completa dos trabalhadores.
7. Fascismo e Guerra
Como o fascismo é a expressão violenta
do capitalismo financeiro decadente, em sua política exterior, que com sua
propaganda chauvinista buscar expressar o mais obsceno dos “nacionalismos”, o
fascismo significa guerra - uma guerra com propósito de dominação.
“O fascismo não crê nem na possibilidade
nem na utilidade de uma paz perpetua... a guerra traz em sua maior tensão toda
a energia humana e enobrece o povo que tem a coragem de enfrenta-la”
(Mussolini, A doutrina política e social do fascismo).
“Na guerra eterna a humanidade se tornou
grande – na paz eterna a humanidade estaria arruinada” (Hitler, Mein Kampf).
Do exposto não devemos concluir que
estas tendências são exclusivas do fascismo. São, pelo contrário, comum a todos
os estados imperialistas. O fascismo é apenas sua expressão mais acabada. Na
verdade, os Estados não fascistas – os Estados Unidos, Grã Bretanha e França –
gastaram mais em armamentos e tiveram muitas mais histórias de saques e
violência do que os Estados fascistas – Alemanha, Itália e Japão. De fato, uma
das razões para o desenvolvimento de formas fascistas de governo e de uma política
externa agressiva no último grupo foi o fato de que o imperialismo alemão foi
privado de sua parte “legítima” – em proporção a sua força real – de pilhagem
no mundo. O primeiro grupo, por outro lado, era composto por imperialistas
relativamente “saciados”, empanturrados pela pilhagem do mundo, situação
assegurada pelos seus ganhos ilícitos. Assim, enquanto o primeiro grupo
apresentava interesse em questões de “segurança”, o último grupo dos
imperialistas “famintos” estava inclinado a repartir o mundo. A lei do
desenvolvimento desigual do capitalismo, que Lenine havia observado
correctamente em sua notável análise do imperialismo, que levara à Primeira
Guerra Mundial, durante o período em discussão, inexoravelmente conduziu à
Segunda Guerra Mundial.
Mas, apesar do perigo que representava
os estados fascistas para os estados imperialistas não fascistas, estes eram
extremamente suaves com aqueles. E isto, por três razões:
A primeira era que eles consideravam o
fascismo um baluarte contra o comunismo e a revolução proletária. Um discurso
sincero feito por Lloyd George em 22 de Setembro de 1933 foi relatado nos
seguintes termos:
“Se os poderes conseguissem derrubar o
nazismo na Alemanha, o que viria a seguir? Não um regime conservador,
socialista ou liberal, senão um regime de comunismo extremo. Certamente não
poderia ser seu objetivo. A Alemanha comunista seria infinitamente mais
formidável do que uma Rússia comunista. Os alemães saberiam como dirigir o seu
comunismo de forma mais eficaz. Foi por isso que todos os comunistas do mundo,
da Rússia até a América, oravam para que as nações ocidentais intimidassem a
Alemanha rumo a uma revolução comunista. Ele [Lloyd George] suplicou ao governo
para que procedesse com cautela.” (The Times, 23 de Setembro de 1933).
Em segundo lugar, o desejo das potências
imperialistas “democráticas” de usar os estados fascistas como ferramenta de
agressão contra a URSS, para o fim duplo de derrotar o socialismo na União
Soviética e saciar a fome de colónias do imperialismo alemão à custa da URSS ao
invés das custas dos estados imperialistas “democráticos”. Foram encorajados
enormemente para seguir esta política pelo próprio Hitler, que havia escrito:
“Nós paramos a eterna marcha para o sul
e oeste da Europa e voltamos os olhos para a terra do leste... Se falamos de
terra na Europa hoje, só podemos pensar, em primeiro lugar, na Rússia e nos
seus estados fronteiriços” (Mein Kampf, p. 743).
Terceiro, ao desencadear uma guerra
entre Alemanha e União Soviética, os imperialistas “democráticos” acreditam
enfraquecer os dois países ao ponto de exaustão, altura em que esperavam
intervir – no “interesse da paz”, obviamente – e impor-lhes uma paz
paralisante.
Esta política não funcionou de acordo
com o plano. As contradições e as rivalidades interimperialistas se mostraram
mais fortes que o ódio comum a URSS e ao comunismo. A Segunda Guerra Mundial
começou como uma guerra interimperialista. Quando terminou, a Alemanha fascista
havia sido esmagada e democracias populares foram estabelecidas em uma série de
países da Europa Central e Europa Oriental. Logo depois China, República
Democrática Popular da Coréia e República Democrática do Vietnã juntaram-se ao
campo socialista. Todas estas vitórias dos povos do mundo foram à custa do
imperialismo. E todas estas vitórias foram desperdiçadas criminosamente pela
vitória do revisionismo kruschovista no Partido Comunista da União Soviética,
que levou à queda do socialismo e à desintegração da outrora gloriosa URSS.
8. As bases das liberdades democráticas
nos Estados Imperialistas
As “liberdades democráticas” nos redutos
do imperialismo são edificadas sobre o fundamento da escravidão colonial e
saque imperialista. Mas quando esta base é enfraquecida pelos movimentos
revolucionários anti-imperialistas e pela crise económica do capitalismo, com a
consequente diminuição dos lucros, a burguesia desses países é obrigada a
atacar a classe trabalhadora, retirar as concessões, acabar com as verdadeiras
reformas e introduzir “reformas” que acabam com as conquistas da classe
operária no pós Segunda Guerra, contribuindo assim para a intensificação da
luta de classes e para o despertar revolucionário da classe operária. Com o
colapso da União Soviética e das democracias populares da Europa Oriental, a
burguesia se sentiu encorajada a intensificar esses ataques. Em alguns países,
por exemplo, Grã-bretanha, Alemanha, França e Itália, esses ataques estão sendo
realizados por meio de agência dos governos socialdemocratas, que estão
ajudando a expor a Socialdemocracia, ainda mais do que antes, como o agente da
burguesia que tem sido desde 1914. Se o aprofundamento da crise económica e as
acções da socialdemocracia a serviço do imperialismo causam uma desilusão
generalizada no proletariado, ajudando a impulsionar as massas em algum momento
desde que haja uma verdadeira vanguarda marxista-leninista, a burguesia destes
estados imperialistas, por exemplo, a Grã-bretanha, considerada até agora como
modelo de “democracia”, seria obrigada a buscar novas formas de assegurar a
manutenção do seu poder. No caso de surgir tais circunstâncias, a burguesia sem
muita hesitação avança para métodos abertamente terroristas e ao fascismo. Ela
se afastará de formas parlamentares que, esgotadas e desacreditadas, não lhe
seriam úteis.
9. São Estados como Grã-bretanha, França
ou Estados Unidos alheios ao fascismo?
Aqueles que dizem que o fascismo é
alheio aos Estados Unidos, Grã-bretanha, França, etc., por causa das raízes
profundas das suas instituições parlamentares ou que a peculiaridade do
“carácter nacional” do fascismo destes estados impedia o êxito fascista nesses
países, exibe uma ignorância total do sistema do imperialismo e das
contradições inerentes a ele. A força subjacente das instituições
“democráticas” e a singularidade do “carácter nacional” de países como EUA,
Grã-bretanha e França, são explicadas pela sua riqueza e pela posição
privilegiada ocupada durante muito tempo. Explica-se pelo espólio causado pela
superexploração imperialista, que possibilitou à burguesia desses países fazer
concessões à classe trabalhadora, e assim, retardar o crescimento de um
movimento operário revolucionário. Com o desaparecimento desta posição
privilegiada, as classes dominantes desses países, em circunstâncias adequadas,
são tão propensas a jogar no lixo as suas tradicionais instituições
democráticas parlamentares, até então sagradas, e abraçar o fascismo, como foi
caso das burguesias alemã, austríaca, italiana e japonesa.
Basta olhar para a campanha incessante
realizada pelos governos, bem como os partidos burgueses de oposição de todos
os países imperialistas, por meio da imprensa “livre”, contra os imigrantes e
as pessoas que buscam asilo para perceber que estas não são acções de governos
e instituições “democráticas”, nem de uma imprensa livre, cujo “carácter nacional”
proibiria tal propaganda xenófoba. Pelo contrário, essas acções são delírios
dos representantes de um sistema extremamente decadente e moribundo – o
capitalismo monopolista – que, sem o menor escrúpulo de consciência, afogariam
em sangue milhões de pessoas para assim retardar artificialmente a morte que se
aproxima para este sistema imundo, que por tanto tempo tem atormentado a
humanidade e arrastando-a na lama e sangue, e que, durante o Século XX, ceifou
a vida de 100 milhões de seres humanos através dos matadouros das guerras
imperialistas, além dos 20 milhões que mata indirectamente a cada ano por meio
de desnutrição, doenças e fome. Além disso, basta conhecer a história da
Grã-bretanha nos últimos três séculos, da França e dos EUA ao longo dos últimos
dois séculos, para perceber que na arte do uso da violência sangrenta, em casa
e no exterior, as classes dominantes desses países não têm nada a aprender com
a classe dominante de qualquer outro país, a Alemanha fascista inclusa. O
massacre do povo vietnamita e coreano por essas potências imperialistas,
especialmente os Estados Unidos, o bombardeio feito ano passado na República
Jugoslava e o bombardeio continuo do Iraque dez anos após o fim da Guerra do
Golfo – para nos limitar a apenas três exemplos – fazem os crimes nazistas, por
mais ultrajantes e terríveis que tenham sido, pequenos em comparação. Afirmar
que as classes dominantes que cometeram esses tipos de carnificina não poderiam
recorrer ao fascismo é viver no paraíso dos tolos, divorciado da realidade.
Os principais representantes destas
classes dominantes supostamente democráticas, longe de repudiar movimentos e
regimes fascistas, os receberam com cordialidade e entusiasmo. Pouco tempo
depois de dirigir o golpe de Estado em 1923, Mussolini foi homenageado pela
coroa britânica com a Ordem do Grande Comandante de Bath, como reconhecimento
dos seus serviços para a contrarrevolução. Chamberlain teve relações estreitas
com Mussolini. Churchill, que foi embalado pela máquina de propaganda burguesa
com o mito de “lutador antifascista”, falando em 1927 em Roma, expressou seu
apoio ao fascismo com as seguintes palavras:
“Se fosse italiano, tenho certeza de que
teria estado inteiramente contigo do início ao fim na luta vitoriosa contra os
apetites bestiais e as paixões do leninismo” (Churchill, “Adress to The Roman
Fascist”, Janeiro de 1927, citado em Salvemini, The Fascist Dictatorship, p.
204 e reproduzido em R Palme Dutt, op. cit. p. 260).
Também Sir Alfred Mond, fundador da
Imperial Chemical Industries e autor dos Informes Mond-Turner para a
colaboração de classes, fez uma explícita defesa do fascismo em uma entrevista
em Roma:
“Admiro o fascismo porque é bem sucedido
em trazer a paz social. Trabalhei durante anos para alcançar a mesma paz no
sector industrial da Inglaterra... O fascismo caminha para a realização dos
meus ideais políticos, ou seja, para fazer as classes colaborarem legalmente”.
(Daily Herald, 12 de Maio, 1928).
Era este o amante do fascismo (Monde)
admirado pela liderança do Trades Union Congress. Inclusive, Citrino chegou ao
disparate de não só defender o direito de Monde ser fascista como também a
necessidade de uma aliança do sindicato com ele.
O barão da imprensa, Lord Rothermere,
defendia a União Britânica de Fascistas (BUF) de Mosley pela razão de que esta
podia representar “um partido bem organizado, capaz de assumir os assuntos
nacionais com a mesma franqueza de propósito e com os mesmos métodos enérgicos
que Hitler e Mussolini exibiram” (Rothermere, Daily Mail, 15 de Janeiro de
1934).
É altamente significativo que a BUF de
Mosley, o partido fascista da Grã-bretanha, tenha sua origem directa no Partido
Trabalhista. Quando deixou o Partido Conservador, Mosley se juntou ao Partido
Trabalhista em 1924. Possuidor de uma vasta riqueza e de conexões influentes, o
que sempre ajuda em partidos burgueses, teve ascensão meteórica. Em 1927, foi
eleito para o Comité Executivo do Partido Trabalhista e nomeou um ministro no
governo trabalhista em 1929. Em 1930, renunciou devido a passividade do governo
trabalhista diante do desemprego. Em sua capacidade ministerial havia produzido
o Memorando Mosley, que continha um primeiro esboço para uma política fascista
para a reconstrução do capitalismo britânico.
Como o governo, caracterizado pela sua
passividade – e não por causa do conteúdo não socialista do Memorando Mosley –
não respondeu favoravelmente a ele, Mosley apelou à Conferência do Partido
Trabalhista em 1930, onde ele conseguiu 1.046.000 votos contra 1.251.000 da
Executiva. Ainda assim foi reeleito para o Executivo, e depois passou
directamente da Executiva do Partido Trabalhista para a organização do seu novo
partido, na primavera de 1931. Este partido, em 1932, abraçou abertamente o
fascismo e mudou o seu nome para BUF. O novo partido foi formado com seis
deputados trabalhistas e um deputado conservador, e lançou um apelo às massas
patrióticas para passar à acção.
O Partido Comunista da Grã Bretanha era
o único que advertiu a todos sobre as tendências fascistas implícitas no
Memorando Mosley. Por sua vez, a esquerda trabalhista ratificou o seu apoio. O
órgão do Partido Trabalhista Independente (ILP), The New Leader, escreveu sobre
Mosley: “Em geral, como é conhecido, o seu programa segue as linhas gerais do
ILP” (10 de Outubro de 1930, citado em R. Palme Dutt, op. cit. p. 266).
Em 7 de Novembro de 1930, Fenner
Brockway, um dos dirigentes do Partido Trabalhista Independente, escreveu no
The New Leader:
“Entre as ideias do Partido Trabalhista
Independente e o pequeno grupo de Mosley há muito em comum...
Dentro de pouco
tempo podemos esperar uma rebelião por parte dos membros mais jovens de todos
os três partidos contra os métodos e o espírito da geração mais velha”.
O Manifesto de Mosley de Dezembro de
1930, no qual se rejeitou formalmente o socialismo e pediu uma ditadura para
levar a cabo uma política agressiva de reconstrução capitalista, contou com
assinaturas de pelo menos 17 deputados trabalhistas, incluindo cinco do ILP.
A BUF de Mosley foi capaz de ganhar
algum terreno graças à conivência e apoio directo do Estado, de altos escalões
da polícia e sectores da grande burguesia. Esta é a experiência de qualquer
outro país imperialista. Em cada caso, o fascismo foi nutrido e auxiliado em
seu crescimento, em alguns países para assumir o poder, não contra os desejos
da burguesia e do Estado, mas com o seu amor, carinho e assistência.
Desenvolveu-se graças às formas da democracia burguesa, através do reforço
sistemático, metódico e passo-a-passo do aparato coercitivo do Estado, foi
posto em marcha medidas de emergência de restrição dos direitos da classe
operária, em um processo acelerado poderosamente pelas ilusões reformistas
geradas pela socialdemocracia que paralisaram a vontade da classe operária em
resistir. Quando o terreno foi totalmente preparado nas condições da democracia
burguesa e do movimento operário interrompido e desorganizado, então se deu o
golpe final da burguesia com o estabelecimento de uma ditadura fascista.
“Fascismo”, disse Clara Zetkin, em 1923,
“é a punição ao proletariado por não levar adiante a revolução iniciada na
Rússia”. Mas por mais que tente o fascismo não pode resolver as contradições do
capitalismo e, portanto, não pode impedir o seu colapso. A chegada do fascismo
no cenário político representa a extrema agudização das contradições do
capitalismo e é uma indicação da extensão do seu parasitismo, decadência e
moribunda natureza. Incapaz de conservar o seu poder mantendo as formas
parlamentares, o capitalismo tira a sua máscara e, deixando de lado as formas
“democráticas”, combate a classe operária com a sua ditadura aberta, nua e
terrorista, em um esforço para prolongar a vida de um sistema historicamente
condenado. Fazendo isto, a burguesia oferece uma excelente lição da luta de
classes, já que se vê obrigada a pregar as massas o desprezo pelos métodos
pacíficos e legalidade, que até então tinha sido a melhor protecção do
capitalismo. Revelando-se então as verdades que antes ocultava a burguesia e a
sua corte socialdemocrata, liberal e conservadora, a saber, que o verdadeiro poder
de classe reside fora do parlamento; que todas as frases suaves, hipócritas e
refinadas sobre o poder das reformas e do parlamento, com as quais a burguesia
até então embalava a classe trabalhadora para dormir, foram “na verdade, palha
para enganar o povo” (Lenine, The Constitutional Crisis in England, 1914). O
parlamento pode ser derrubado bruscamente pela burguesia, em cujas mãos residem
o poder real.
Dado o fato de que as condições para a
instituição do fascismo são criadas pela classe dominante dentro da casca da
“democracia” burguesa, a luta contra o fascismo não pode ser protagonizada por
uma classe trabalhadora que deposita sua confiança nesta “democracia” burguesa
como uma defesa contra o fascismo. Esta luta só pode ser travada com sucesso
por uma unida e determinada classe trabalhadora contra todos os ataques do
capital financeiro no campo económico e político: contra as leis anti sindicais
e cortes salariais, contra a chamada legislação antiterrorismo, contra a leis
racistas de imigração e asilo, que são exclusivamente destinadas a semear
divisões na classe trabalhadora, deslocando a culpa pelos males do capitalismo
para as costas das infelizes vítimas da pilhagem, banditismo e guerras
imperialistas; contra restrições ao direito à liberdade de expressão e de
reunião, e assim por diante.
Quanto mais forte é a resistência da
classe operária contra os ataques do capital financeiro, mais difícil se torna
para o último instalar o fascismo, com a vantagem de que essa resistência é
decisiva para conquistar para o seu lado as vacilantes camadas
pequeno-burguesas da população. Enquanto luta com grande determinação e
tenacidade pelo direito democrático de organizar-se dentro da ordem existente,
a classe trabalhadora não deve perder de vista nem por um só momento a dura
realidade de que a democracia burguesa é simplesmente a máscara com que a
burguesia disfarça sua ditadura, e que é dentro das formas democráticas
burguesas que o movimento fascista é sistematicamente empurrado para frente
pelo capital financeiro. A democracia burguesa, em certas circunstâncias e
condições, cria o fascismo. Quanto maior for a fé colocada pela classe operária
na legalidade burguesa e sua formas democráticas e quanto maior forem os
sacrifícios feitos por ela em defesa da ordem existente como um “mal menor”,
mais fortemente os capitalistas golpearão e garantirão o avanço do fascismo.
Esta lição da Alemanha e da Itália, que destroem o a fraude do lema “Democracia
contra Ditadura”, nunca deveria ser esquecida pela classe operária. A classe
operária pode, deve e vai ganhar, desde que, rejeitando a mentalidade escrava –
a marca ideológica do reformismo – e segurando firmemente a bandeira do
marxismo revolucionário, avance com determinação para cumprir sua missão
histórica – derrubar o capitalismo e colocar o socialismo em seu lugar. Assim,
a escolha para a classe operária é simples e clara: a ditadura do proletariado
ou a barbárie fascista.
O grande sonho da burguesia, por meio do
fascismo se necessário, é exterminar o socialismo e o movimento da classe
operária revolucionária. Durante os passados 150 anos, houveram dúzias de
tentativas neste sentido. Cada vez que os seus opositores declararam que estava
vencido, o socialismo voltou a renascer com novo vigor. Apesar das enormes
perdas dos anos 80 e 90, não será diferente desta vez. Como disse Marx:
“Onde quer que seja, sob que forma e sob
que condições for que a luta de classe ganhe qualquer consistência, só é
natural que membros da nossa Associação estejam na primeira linha. O solo a
partir do qual ela cresce é a própria sociedade moderna. Ela não pode ser
esmagada pela maior das carnificinas. Para a esmagarem, os governos teriam de
esmagar o despotismo do capital sobre o trabalho — a condição da própria
existência parasitária que é a deles.” (Guerra Civil na França)
Sejam quais forem as torturas que a
burguesia inflija à classe operária, independentemente da destruição que ele
provoca, quaisquer que sejam as dificuldades da luta, enfrentamos o futuro com
a confiança, certeza e optimismo de uma classe em ascensão destinada a
conquistar o poder. Abordamos o futuro com total desprezo pelas ações grotescas
do inimigo condenado, decadente e parasita – o capitalismo financeiro – para o
grito de guerra do proletariado internacional: “Bem unidos façamos nesta luta
final. Uma terra sem amos, A Internacional”.
original, em inglês, em Stalin Society
https://www.novacultura.info/single-post/2015/05/15/Harpal-Brar-Democracia-
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