A importância e actualidade do trabalho
de Lenine sobre o estado
Cem anos atrás, poucos meses antes da Grande Revolução Socialista de Outubro e em condições políticas particularmente difíceis e complexas, V.I. Lenine escreveu um trabalho de importância fundamental, "O Estado e a Revolução", o qual foi publicado pela primeira após a Revolução de Outubro, em 1918.
Neste trabalho, Lenine destacou a
natureza de classe do estado e a sua essência. "O estado é um produto e
uma manifestação da irreconciabilidade dos antagonismos de classe. O estado
ascende onde, quando e na medida em que antagonismos de classe objectivamente
não podem ser reconciliados. E, inversamente, a existência do estado prova que
os antagonismos de classe são irreconciliáveis". [1]
Lenine também estabelece neste trabalho
a necessidade e actualidade da revolução socialista e do estado dos
trabalhadores.
Foi baseado nas visões de Marx e Engels
quanto à questão do estado, as quais foram formuladas em vários trabalhos, tais
como "O 18 de Brumário de Luís Bonaparte", "A guerra civil em
França", a "Crítica do Programa de Gotha", carta de Engels a
Bebel sobre o 18 de Março de 1875, a introdução de Engels às terceiras edições
de "A guerra civil em França" de Marx em relação à ditadura do
proletariado. As conclusões que Marx e Engels extraem do estudo e generalização
da experiência e das lições da revoluções era que a classe trabalhadora só pode
adquirir poder político e estabelecer a ditadura do proletariado através da
revolução socialista, a qual destrói o aparelho de estado burguês e cria um
novo aparelho de estado. Assim, podemos caracteristicamente referirmo-nos ao
facto de que Marx no seu trabalho "Crítica do Programa de Gotha"
enfatizou que: "Entre a sociedade capitalista e a comunista está o período
da transformação revolucionária de uma para a outra. Correspondendo a isto está
também um período de transição política no qual o estado não pode ser senão a
ditadura revolucionária do proletariado". [2]
Lenine destacou a importância
fundamental desta questão para aqueles que compreendem a existência e o papel
determinante da luta de classe no progresso social, notando que "deveria
ser dada atenção particular à observação extremamente profunda de Marx de que a
destruição da máquina de estado burocrática-militar é "a condição prévia
para toda revolução popular real" [3] e enfatizou que "Só é marxista
quem estende o reconhecimento da luta de classe ao reconhecimento da ditadura
do proletariado". [4]
Além disso, Lenine procurou descrever as
características da formação social-política comunista, aspectos básicos do
estado socialista, enquanto criticou severamente visões da direita oportunista
e anarquista em relação ao estado.
Naturalmente, este trabalho específico
de Lenine, e isto é verdadeiro para o resto de toda a titânica colecção das
suas obras, não pode ser apartado dos seus outros trabalhos, tais como por
exemplo "A Revolução Proletária e o renegado Kautsky" e deve sempre
ser abordado num relacionamento dialéctico com os desenvolvimentos históricos.
Seja como for, contudo, a abordagem leninista do estado é um enorme legado para
movimento comunista internacional, o qual deve ser utilizado de um modo
adequado a fim de repelir visões social-democratas e oportunistas acerca do
estado, as quais têm penetrado e continuam a penetrar o movimento comunista internacional.
Consequentemente, o objectivo desta intervenção não é apresentar as posições
leninistas ou citações apropriadas de Lenine, mas fornecer uma resposta baseada
no entendimento marxista-leninista do estado às visões oportunistas
contemporâneas. Isto é ainda mais relevante hoje, quando muitas visões que
Lenine combateu no seu tempo estão a reemergir em formas velhas e novas.
O entendimento "neutral" não classista do estado
As forças do oportunismo europeu
constituíram a ferramenta básica para a nova diluição das características
comunistas dos partidos comunistas e de trabalhadores. Trata-se de forças que
são veículos para a ideologia burguesa no interior do movimento dos
trabalhadores. Na Europa, elas estabeleceram o seu próprio centro ideológico-político
e organizacional: o Partido de Esquerda Europeu (PEE), ao qual aderiram alguns
PCs que no passado foram profundamente influenciados pelo eurocomunismo, tais
como os PCs da França e da Espanha. O SYRIZA nele participa por parte da
Grécia. Trata-se de um partido que contém forças influenciadas pela corrente
eurocomunista que se separou do KKE em 1968, assim como forças que se separaram
do KKE em 1991, sob a influência do "Novo pensamento" de Gorbachev.
Este partido posteriormente fundiu-se com forças que vieram do PASOK
social-democrata.
Tal partido argumenta que: "O
estado, contudo, não é uma fortaleza mas sim uma rede, arena de relacionamento
estratégico para a luta política. Ele não muda de um dia para o outro, mas ao
contrário sua necessária transformação pressupõe batalhas constantes e
contínuas, o envolvimento do povo, democratização contínua". [5]
Como se verifica acima, eles não
consideram que o estado burguês constitua por sua própria natureza um órgão
para a dominação da classe burguesa, mas sim uma colecção de instituições que
podem ser transformadas numa direcção a favor do povo. Com base nesta visão,
argumenta-se que o carácter das instituições do estado burguês, o estado
burguês como um todo, pode ser adequadamente modelado desde que existam
"governos de esquerda".
Isto é claramente uma visão enganosa,
porque na prática destaca o estado da sua base económica, das relações
económicas dominantes. Cria ilusões entre os trabalhadores de que o papel do
estado burguês e suas instituições (ex. parlamento, governo, exército, polícia)
depende das forças políticas ("esquerda" ou "direita") que
os dominam.
Analogamente, visões perigosas estão a
ser hoje cultivadas num certo número de países latino-americanos, através do
conceito de "progressismo", por meio de vários governos
"progressistas" e "de esquerda", os quais após as suas
vitórias eleitorais tentam semear ilusões entre o povo de que o sistema pode
mudar através de eleições burguesas e referendos.
Contudo, na realidade não há
"neutralidade" de classe por parte do estado burguês e suas
instituições. O estado, como o marxismo-leninismo tem demonstrado, tem um claro
conteúdo de classe, o qual não pode ser usado através de processos eleitorais e
soluções governamentais burguesas em favor da classe trabalhadora e da mudança
social.
Acerca da visão respeitante ao "Estado Profundo"
A emergência do SYRIZA como partido
governante na Grécia levou a celebrações de muitas forças oportunistas por todo
o mundo. Na verdade, sua cooperação no governo com o partido nacionalista ANEL
foi interpretada por alguns como uma tentativa de controlar o estado profundo
da Grécia através desta aliança política governamental. [6]Analogamente, alguns
apresentaram as declarações feitas por A. Tsipras ainda antes das eleições,
quando afirmou directamente que a Grécia "pertence ao ocidente" e que
a retirada da Grécia da NATO não estava na agenda, como sendo um movimento
inteligente. [7]
Qual é o objectivo desta visão que separa
as funções do estado burguês umas das outras como "fatias de salame"?
Naturalmente, no interior do aparelho de estado do estado burguês há estruturas
com diferentes funções e tarefas. Contudo, isto confirma a visão que separa o
estado em secções "duras" e "moles". Assim, por exemplo, as
municipalidades, os serviços locais são uma parte integral da administração
burguesa, pois os governos locais também são encarregados de implementar a
estrutura legal reaccionária e anti-povo que é aprovada por cada governo
burguês e a sua maioria parlamentar. Os comunistas no nosso país são activos
nos governos locais, procuram ganhar a maioria nas municipalidades e hoje
alcançaram isto em cinco municipalidades do país, as quais incluem a 3ª maior
cidade na Grécia, Patras. Contudo, eles não promovem ilusões entre os
trabalhadores acerca do carácter desta secção do estado burguês. Procuram, como
oposição ou como maioria na administração das municipalidades, utilizar sua
posição para desenvolver a luta de classe e não para "limpar" o
capitalismo, o que é aquilo que defendem o SYRIZA e outras forças oportunistas.
Estas forças oportunistas acham
conveniente a separação do estado burguês em secções. Acima de tudo, porque
isto pode ocultar que todo o aparelho de estado, apesar das diferentes funções
das suas secções, está ao serviço da classe burguesa. Em segundo lugar, porque
deste modo semeiam a ilusão entre os trabalhadores de que gradualmente,
começando da "periferia" do estado burguês e marchando para o "centro",
para as suas "profundidades", eles podem limpá-lo, transformando-o
num estado que será a favor do povo.
Forças oportunistas promovem visões
utópicas semelhantes igualmente acerca das uniões capitalistas inter-estatais,
tais como a imperialista UE. Na verdade, elas apregoam que através de
referendos ou da emergência da esquerda, governos social-democratas,
alegadamente uma "estrutura democrática para o continente" pode ser
criada com "respeito pelos direitos democráticos e soberanos dos povos"
[8] . Na realidade, tais afirmações contornam o carácter de classe desta união
inter-estatal, a qual decorre do carácter de classe dos estados burgueses que a
constituem e que, desde o seu nascimento em 1952, como "Comunidade
Europeia do Carvão e do Aço", foi criada para servir os interesses do
capital.
A expansão da democracia no estado burguês como um "passo" para o socialismo
Lenine entrou em conflito agudo com
aqueles, como Bernstein, que argumentavam ser possível a reforma do capitalismo
e a gradual transformação reformista da sociedade.
Posteriormente, as visões do
eurocomunismo ganharam um bocado de terreno, visões a argumentarem que
comunistas podem transformar o estado numa direcção a favor do povo através da
via parlamentar e da expansão da democracia.
O KKE, o qual combateu e continua hoje a
combater tais visões, considerou que avaliações semelhantes feitas pelo PCUS
fizeram um grande dano ao movimento comunista internacional. Estas visões
chegaram a dominar o movimento comunista internacional principalmente após o
20º Congresso do PCUS e falavam de uma "transição parlamentar" [9] .
Consequentemente, consideramos serem problemáticas visões desenvolvidas nesta
base e que argumentam em favor da violação de princípios básicos da revolução e
da construção socialista, como por exemplo conversas acerca de "uma
variedade de formas de transição para o socialismo" ou o assim chamado
"caminho de desenvolvimento não capitalista".
O KKE extraiu conclusões e rejeitou as
"etapas para o socialismo", as quais atormentaram e continuam hoje a
atormentar o movimento comunista, pois devido a estas "etapas" eles
por um lado negam o papel dos PC como força para o derrube do capitalismo em
nome de tarefas "actuais" no quadro do sistema (ex. o objectivo de restaurar
a democracia burguesa nas condições de ditadura) e por outro lado semeiam
ilusões acerca da "transição parlamentar" para o socialismo.
O KKE estuda sua história, extrai
conclusões valiosas das lutas heróicas dos comunistas nas décadas passadas. O
CC do KKE notou entre outras coisas na sua declaração recente sobre o 50º
aniversário da Junta na Grécia: "O KKE e o movimento dos trabalhadores e
do povo procuram e lutam por funcionar nas melhores condições possíveis, as
quais facilitarão sua luta e mais geralmente expandem suas intervenções contra
o capital e o seu poder. Eles lutam por liberdades e direitos, a fim de remover
obstáculos à sua actividade, a fim de restringir – tanto quanto possível – a
repressão estatal". [10] No entanto, nosso partido, ao estudar a sua história,
avalia que: "A ditadura forneceu nova experiência que demonstra o carácter
sem fundamento da avaliação que existia no Movimento Comunista Internacional e
no KKE, de que o caminho da luta por uma democracia burguesa avançada é terreno
fértil para a concentração de forças e que aproxima o processo revolucionário,
que a luta pela democracia está dialecticamente conectada à luta pelo
socialismo. Esta avaliação impediu o partido de pôr em relevo a ditadura
militar como uma forma de ditadura do capital, impediu a orientação da luta
popular como um todo contra o inimigo – a ditadura da classe burguesa e suas
alianças imperialistas, como a NATO". [11]
Hoje, visões erradas semelhantes estão a
ser promovidas dentro das fileiras do movimento comunista. Trata-se de visões
que ou falam de "etapas" na estrada para o socialismo ou de
comunistas a "penetrarem" o poder, com o objectivo em ambos os casos
de expandir a democracia, como uma primeira etapa para o socialismo.
Na prática, tais visões adiam a luta
para o derrube da exploração capitalista para um futuro distante, armadilha e
restringe o movimento dos trabalhadores dentro do quadro de apenas lutar por
melhores condições para a venda da força de trabalho, negando a orientação da
luta para radicalizar o movimento dos trabalhadores, reagrupá-lo, concentrar
forças sociais, as quais têm um interesse em confrontar os monopólios e podem
lutar pelo derrube do capitalismo e a construção da nova sociedade
socialista-comunista.
A nacionalização de negócios capitalistas como um passo para mudar a natureza do estado
Existe confusão semelhante quanto a
questões relativas à economia. Durante muitos anos o movimento comunista
internacional, o qual esteve e em grande medida continua a estar preso na
lógica de etapas para o socialismo, viu o reforço do sector estatal do estado
burguês como um passo para o socialismo.
Na verdade, hoje alguns compreendem mal a posição leninista de que "o capitalismo monopolista de estado é uma preparação material completa para o socialismo, o patamar do socialismo, uma fase na escada da história entre a qual e a fase chamada socialismo não há fases intermediárias" [12] a fim de justificar o apoio activo e a participação de comunistas na gestão burguesa com um sector estatal ampliado da economia. Mas deste modo eles entendem erradamente capitalismo monopolista de estado como sendo a existência de um sector estatal forte na economia e não como imperialismo, a etapa superior de capitalismo, tal como descrita por Lenine.
A vida tem demonstrado que o
capitalismo, de acordo com as suas necessidades, pode admitir que uma grande
secção da economia do país seja administrada pelo estado. Assim, por exemplo,
nas décadas de 1970 e 1980 a maior parte da economia grega estava nas mãos do
estado, contudo isto não mudou de todo o carácter do estado burguês. Nem,
naturalmente, significou que uma política de nacionalizar gradualmente negócios
privados, que habitualmente significa simplesmente capitalistas a passarem suas
dívidas para o estado, pudesse levar a uma mudança do seu carácter. Desde que o
poder esteja nas mãos da classe burguesa, o estado (com um sector estatal mais
forte ou mais fraco) será burguês e a classe dominante actuará como o
"capitalista colectivo" da propriedade estatal.
O nome do estado como reflexo de como é encarada sua natureza
Lenine descreveu aspectos básicos do
estado dos trabalhadores. Não podemos fechar os olhos à análise de Lenine e
simplesmente orientar-nos para os adjectivos que acompanham o nome do estado.
Hoje, por exemplo, emergiram a "República Popular de Lugansk" e a
"República Popular de Donetsk". Qual é o carácter destas
auto-proclamadas "Repúblicas Populares"? E como um aparte a esta
discussão, podíamos ter em mente a existência, por exemplo, da chamada
"República Democrática do Congo", onde crianças pequenas trabalham
nas minas em condições terríveis de modo a que monopólios estrangeiros possam
adquirir minérios valiosos como o cobalto e o cobre.
Consideramos que não podemos julgar um
estado e a nossa posição em relação a ele exclusivamente com base em como ele
se auto-define e nas suas proclamações. Um critério básico deve ser qual classe
possui os meios de produção e mantém o poder no estado específico, que espécies
de relações de produção são predominantes no país específico. E isto é assim
porque o estado, para marxistas-leninistas, é uma "máquina
repressiva", o qual objectivamente na nossa era, no século XXI, na era da
passagem do capitalismo para o socialismo, anunciada pela Revolução de Outubro,
ou estará nas mãos da classe burguesa ou da classe trabalhadora. Não há caminho
intermédio!
Não devemos esquecer que como sempre, e
os dias de hoje não são excepção, as classes burguesas procuram ocultar seus
objectivos, ocultar o carácter de classe do seu estado. Assim, por exemplo, um
método clássico que a classe burguesa utiliza para camuflar o estado é a
projecção do seu carácter "nacional", apresentando seu estado como um
"arma" para defender todo o país. O burguês hoje não hesita em
utilizar também outras "armas" de propaganda a fim de subordinar o
movimento dos trabalhadores "sob as suas bandeiras". Os comunistas, o
movimento dos trabalhadores como um todo, devem demonstrar alto nível de
vigilância quando políticos burgueses, que contribuíram para a restauração
capitalista na antiga URSS, hoje utilizam o "cartão" anti-fascista.
Hoje, quando a classe burguesa também
está a reforçar forças fascistas, algumas da quais procuram mesmo desempenhar
um papel no governo, tais como por exemplo na Ucrânia, os apelos a novas
"frentes anti-fascistas" e por alianças mesmo com forças políticas
burguesas, e mesmo estados burgueses que aparecem sob um manto anti-fascista,
estão a intensificar-se. Contudo, como o KKE avaliou na Declaração do CC do KKE
sobre os 70 anos desde o fim da 2ª Guerra Imperialista Mundial e da grande
vitória anti-fascista dos povos: "O estado reaccionário burguês não está
nem desejoso nem é capaz de enfrentar a raiz e os ramos do nazismo; nem tão
pouco o podem as chamadas "frentes anti-fascistas", alianças de
movimentos populares e dos trabalhadores em cooperação com forças políticas
burguesas. Só a aliança do povo, o desenvolvimento da luta de classe com o
objectivo de derrubar o poder dos monopólios, o sistema capitalista, pode
enfrentar o nazismo". [13]
Além disso, o KKE considera que hoje o
objectivo de poder dos trabalhadores não deve ser posto de lado por algum outro
objectivo governamental no terreno do capitalismo, em nome da deterioração da
situação da classe trabalhadora e dos extractos populares, devido à profunda e
prolongada crise económica, à guerra imperialista, ao terror aberto contra o PC
e o movimento dos trabalhadores por organizações nazi-fascistas, provocações, a
intensificação da violência do estado. [14]
A construção socialista e o estado sob o socialismo
Durante décadas sociais-democratas e
oportunistas têm estado a executar, dentre outras coisas, um esforços
sistemático para negar toda abordagem científica do socialismo e seu estado.
Lemos, por exemplo, no material do centro oportunista da Europa, o PEE, que ele
defende as "perspectiva de um socialismo democrático". E esta
"perspectiva socialista" é definida pelo PEE como "uma sociedade
de justiça fundada na combinação (pooling) da riqueza e dos meios de produção,
e na soberania da escolha democrática, em harmonia com os recursos limitados do
planeta". Confusões semelhantes e abordagens anti-marxistas da sociedade
socialista têm-se multiplicado em anos recentes com os vários "socialismos"
da América Latina. Desde o "Socialismo para o Século XXI" de Chavez
aos "socialismo do buen vivir " no Equador, onde o dólar
estado-unidense é utilizado como a divisa nacional.
Para nós, eles têm como objectivo
ignorar o facto de que na base de toda formação sócio-económica está um modo
específico de produção, a qual é a unidade dialéctica das forças de produção e
das relações de produção. As relações de produção como um todo em toda fase do
processo de reprodução-produção, distribuição, intercâmbio, consumo constituem
a base económica da sociedade. Abordando a questão cientificamente, Lenine
sublinhou que: "Na produção social da sua vida, os homens entram em
relações definidas que são indispensáveis e independentes da sua vontade,
relações de produção as quais correspondem a uma etapa definida do
desenvolvimento das suas forças produtivas materiais. A soma total destas
relações de produção constitui a estrutura da sociedade, a fundação real, sobre
a qual ascende uma superestrutura legal e política e à qual correspondem forma
definidas de consciência social". [15]
J.V. Staline notou: "Há dois tipos
de produção: a capitalista, incluindo o estado-capitalista, em que há duas
classes, em que a produção é executada para o lucro do capitalista; e há o outro
tipo, o tipo socialista de produção, em que não há exploração, em que os meios
de produção pertencem à classe trabalhadora e em que as empresas são dirigidas
não para o lucro de uma classe alheia, mas para a expansão da indústria no
interesse dos trabalhadores como um todo". [16]
Eis porque o KKE rejeita várias
interpretações de socialismo que nada têm a ver com a visão marxista-leninista.
E como tem sido sublinhado em relação às visões do PEE, ou aos vários
"socialismos" da América Latina, o que temos em essência é a promoção
de posições oportunistas acerca da "humanização" do capitalismo,
"a utopia acerca da democratização do estado burguês, enquanto a economia
capitalista "mista" está a ser apresentada como um novo modelo de
socialismo. "A lógica de especificidades nacionais constitui um
instrumento do "eurocomunismo" a fim de negar as leis científicas da
revolução e da construção socialista e hoje o problema manifesta-se com os
mesmos argumentos ou semelhantes. (...) a fim de [tentar] confirmar a
substituição do caminho revolucionário pelo parlamentarismo, o abandono do
socialismo por mudanças governamentais que administrarão a sociedade burguesa,
como por exemplo fazem o Fórum São Paulo e outras forças. A construção do
socialismo é um processo unificado, o qual começa com a conquista do poder pela
classe trabalhadora a fim de formar o novo modo de produção, o qual prevalecerá
com a completa abolição de relações capitalistas, relações capital – trabalho
assalariado. A socialização dos meios de produção e a planificação central são leis
da construção socialista, condições necessárias para a satisfação da
necessidades do povo". [17]
O KKE, estudando a experiência da
construção socialista avaliou as reformas económicas de 1965 na URSS como
erradas. Trata-se de reformas que deram prioridade a "reformas de
mercado" e trouxeram de volta para a economia socialista o papel do lucro.
Em consequência emergiram nas empresas interesses especiais (vested interests).
As reformas erradas na economia foram combinadas com direcções erradas semelhantes
na superestrutura política (ex.: o estado de todo o povo) e na estratégia do
movimento comunista internacional (ex.: política de "coexistência
pacífica"). Naturalmente, nosso partido discorda das avaliações de PCs que
foram arrastados para a corrente danosa do "maoismo" e consideraram
que de um momento para outro, imediatamente após o 20º Congresso, o estado dos
trabalhadores deixou de existir ou na verdade que estava alegadamente
transformado em "social-imperialismo" e assim participaram na
propaganda anti-soviética. Em contraste, nosso partido, o qual defende a
contribuição da URSS como o fez o movimento internacional comunista e dos
trabalhadores, considera que o socialismo foi construído na URSS. Contudo,
também considera que o 20º Congresso do PCUS foi um ponto de viragem, devido a
um certo número de posições oportunistas que foram adoptadas sobre questões
relativas à economia, à estratégia do movimento comunista e a relações
internacionais.
Hoje, avaliamos que 30 anos após a
contra-revolução na URSS, Europa Central e do Leste, a capitalização da China
avançou. Ali existem relações de produção capitalistas. Ao mesmo tempo
observamos o contínuo reforço de relações capitalista em países que procuraram
a construção socialista, tais como Vietname e Cuba. [18]
Alguns camaradas de outros PCs
argumentam que os desenvolvimentos nestes países são resquícios da NEP na era
de Lenine. Em outros textos [19] , destacámos as diferenças entre a NEP e as
mudanças que se verificam nestes países e com cujos resultados nosso partido
está preocupado, baseado no seu longo estudo da experiência da URSS. E isto é
assim porque a socialização dos meios produção concentrados, a planificação
central na distribuição da força de trabalho e dos meios de produção, a
erradicação da exploração do homem pelo homem para a maioria dos trabalhadores
são condições básicas e necessárias, não só para o começo da construção
socialista como também para a sua continuação.
Além disso, com observou Lenine, "a
ditadura do proletariado não é apenas a utilização da força contra os
exploradores e nem mesmo principalmente a utilização da força. O fundamento
económico desta utilização de força revolucionária, a garantia da sua eficácia
e êxito está no facto de que o proletariado representa e cria uma organização
social do trabalho de tipo superior em comparação com o capitalismo. Isto é que
é importante, isto é a fonte do fortalecimento e a garantia de que o triunfo
final do comunismo é inevitável". [20] Está claro que esta
"organização social de tipo superior" nada pode ter a haver com o
nepotismo. Como foi observado no Relatório do CC do KKE ao 20º Congresso do
partido, "a Coreia do Norte tem prosseguido o reforço das chamadas
"zonas económicas livres", o "mercado". O Partido dos
Trabalhadores da Coreia abandonou por alguns anos o marxismo-leninismo e
promove a idealista teoria "Juche", fala de
"kimilsunguismo-kimjongunismo", violando todo conceito de democracia
socialista, do controle dos trabalhadores e do povo, num regime de
nepotismo". [21]
Ao invés de um epílogo: Devemos acabar com as "evasivas" da 2ª Internacional
O KKE efectuou um estudo profundo das
causas que levaram ao derrube do socialismo na URSS, seguindo o caminho de
muitos anos de estudo e discussão no interior do partido e dedicando o 18º
Congresso (em 2009) a apresentação de respostas abrangentes sobre esta questão,
extraindo conclusões valiosas para o futuro. Com base neste esforço, baseado no
marxismo-leninismo, nosso partido enriqueceu o seu entendimento programático do
socialismo, algo que está reflectido no novo Programa adoptado no 19º Congresso
(2013).
O Programa do KKE nota entre outras
coisas: "O poder socialista é o poder revolucionário da classe
trabalhadora, a ditadura do proletariado. O poder da classe trabalhadora
substituirá todas as instituições burguesas, as quais serão esmagadas pela
actividade revolucionária, com novas instituições que serão criadas pelo
povo". [22]
Além disso, o Programa do KKE descreve
em pormenor:
• A base material da necessidade do socialismo
na Grécia
• Os deveres do KKE para a revolução
socialista
• Seus deveres mais especificamente
sobre a situação revolucionária
• O papel principal do Partido na
revolução
• Socialismo como a fase primeira e mais
baixa do comunismo
• A questão da satisfação das
necessidades sociais
• Princípios fundamentais da formação do
poder socialista
O 20º Congresso do KKE, efectuado este
ano, de 30 de Março a 2 de Abril de 2017, colocou a tarefa abrangente do
endurecimento (steeling) ideológico-político-organizacinal do partido e da sua
juventude como um partido para o derrube revolucionário.
Cem anos atrás, no fim da sua obra
"O estado e a revolução", Lenine notou que a 2ª Internacional havia
caído em espiral dentro do oportunismo, que a experiência da Comuna fora
esquecida e distorcida e acrescentou que: "Longe de inculcar nas mentes
dos trabalhadores a ideia de que se aproxima o tempo em que devem actuar para
esmagar a velha máquina estado, substituí-la por uma nova e deste modo fazer do
seu domínio político o fundamento para a reorganização da sociedade, eles
realmente pregaram às massas exactamente o oposto e retrataram a
"conquista do poder" de um modo que deixava milhares de evasivas para
o oportunismo". [23]
Hoje, 100 anos após a Grande Revolução
de Outubro e um ano antes do 100 aniversário da fundação do nosso partido, o
KKE procura com suas posições e actividade barrar as "portas e
janelas" ao oportunismo. Isto é uma condição prévia para a realização dos
ideais de uma sociedade sem a exploração do homem pelo homem.
[1]
"State and Revolution", V.I. Lenin, Collected Works, V. 25
[2]
"Critique of the Gotha Programme", K. Marx
[3]
"State and Revolution", V.I. Lenin, Collected Works, V.25
[4]
"State and Revolution", V.I. Lenin, Collected Works, V.25
[5]
From SYRIZA's governmental programme.
[6]
The Real News Network, Interview (28/1/2015) with Leo Panitch, Professor of
Political Science at York University, Toronto, Canada. therealnews.com/...
[7]
Article of Paul Mason (1/9/2015), former BBC journalist and former economics
editor for Channel 4 www.irishtimes.com/...
[8]
5th Congress of the PEL. Political Document: "Refound Europe, create new
progressive convergence"
[9]
18th Congress of the KKE, Resolution on Socialism. February 2009
[10]
"Statement of the CC of the KKE on the Military Coup of the 21st of April
1967. Rizospastis, 5 March 2017.
[11]
Ibid
[12]
"The impending catastrophe and how to combat it", V.I. Lenin,
Collected Works, V.25
[13]
Declaration of the CC of the KKE on the 70 years since the end of the 2nd World
Imperialist War and the great anti-fascist victory of the peoples. April 2015
[14]
ibid
[15]
"Karl Marx", V. I. Lenin, Collected Works, V.21
[16]
J.V. Stalin, Works, V. 7
[17]
Speech of the KKE at the 16th International Meeting of the Communist and
Workers' Parties in Ecuador.
[18]
Theses of the CC of the KKE for the 20th Congress.
[19]
"The international Role of China", Komep 6/2010
[20]
"A great beginning", V.I. Lenin, Collected Works, V. 29
[21]
Report of the CC of the KKE to the 20th Congress of the party, March 2017.
[22]
Programme of the KKE, 2013
[23]
"State and Revolution", V.I. Lenin, Collected Works, V. 25
[*] Posição da secção de relações
internacionais do CC do KKE na 11ª Conferência anual "V.I. Lenine, a
Revolução de Outubro e o mundo contemporâneo".
A versão em inglês encontra-se em inter.kke.gr/...