quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

O caos nas urgências dos hospitais públicos

Pode dizer-se que não há palavras para descrever a pouca vergonha que se está a passar nos serviços de urgência dos hospitais do SNS e a forma como o governo e ministro estão a lidar com o problema. Em menos de um mês oito cidadãos morreram aparentemente por falta ou deficiente atendimento após, ao contrário do que mandam as regras nestas situações, muitas horas de espera nos serviços de urgência. A imprensa fala em mais de 1900 mortes no período do Inverno, particularmente frio este ano, devido a diversas morbilidades; todas elas estarão relacionadas com a descida da temperatura e do aparecimento da gripe sazonal, fazendo fé no que a imprensa diz, número que aparentemente não estará longe do que ocorre em outros anos. O que tem sido fora do normal são as mortes de pessoas, quase todas idosas, que esperam muitas horas por cuidados que não são prestados em tempo útil.

Ainda estamos todos lembrados da epidemia da legionella que há pouco mais de dois meses fez 12 mortes e infectou 375 pessoas, tendo o governo levado bastante tempo a identificar o foco causador e a tomar medidas. Foi a terceira maior epidemia no mundo, bem reveladora da política seguida pelo governo PSD/CDS-PP quanto à Saúde Pública, quer no que concerne às medidas de fiscalização e prevenção quer à resposta em termos de cuidados de assistência. A mesma política encontra-se agora ilustrada nas mortes nos serviços de urgência hospitalar que não têm conseguido dar resposta como seria de esperar, sabendo-se antecipadamente que as idas às urgências aumentam substancialmente nesta época do ano. O governo desculpa-se com o “frio”, com a “reforma antecipada dos médicos” e acusa as notícias de “alarmismo” infundado e de “falsidade” na análise das mortes ocorridas e promete medidas salvíficas do género “alargamento dos horários de funcionamento dos centros de saúde”, “contratação directa de novos médicos”, “proibição (!?) de médicos e enfermeiros tirarem férias no período do Carnaval”, “abertura de mais camas de internamento (!?, este governo acabou com 700 camas)… e da possibilidade das “urgências privadas poderem vir a tratar doentes do Serviço Nacional de Saúde em alturas de maior afluência aos hospitais”, segundo despacho assinado, curiosamente de forma muito discreta em 9 de Janeiro, pelo secretário de Estado Adjunto do Ministro da Saúde.

E terá sido esta medida que trouxe mais alguma luz sobre as verdadeiras razões do caos que se vive nas urgências dos hospitais públicos, que fazem mover o ministro especialista em cobrança de impostos e que dão para entender o escarcéu feito por alguma imprensa de referência situada mais à direita. Não há dúvida de que as mortes por legionella e as mortes ocorridas nas urgências, e que poderiam ter sido perfeitamente evitadas, são devidas à política de austeridade levada a cabo nos últimos três anos e meio, o mesmo tempo de mandato deste governo fascista, que tem cortado na Saúde e na Administração Pública em geral com a redução de pessoal e corte brutal nos salários. Mas, mais do que isso, são a consequência lógica de uma estratégia, que vem de há muito, desde o 1º governo de maioria absoluta do PSD/Cavaco, de privatização da Saúde e concomitante destruição do SNS. Só com a degradação do SNS, com o seu subfinanciamento, a não contratação de pessoal, o encerramento de serviços e diminuição do número de camas, ao mesmo tempo que se financia por diversas maneiras o negócio da medicina privada, é que este terá possibilidade de se instalar e progredir. O privado já possui 30% dos internamentos e das consultas, só faltavam as urgências, o “frio” e a “gripe” (o negócio das vacinas parece que já deu o que tinha a dar) deram o mote, o “caos das urgências” confirma a necessidade, a imprensa do regime faz a propaganda… e a medida (o oportuno e "silencioso" despacho feito por uma figura menor do governo) já está tomada.

E, assim, o negócio da Saúde em Portugal vai de vento em popa, enquanto o povo vai morrendo, à fome e à falta de cuidados médicos. É o que acontece quando um governo sem legitimidade continua em funções e tem pressa em acabar a missão para que foi investido: privatizar tudo o que seja passível de ser privatizado, empobrecer o mais possível o povo português, no processo imparável de acumulação e concentração do capital. Não basta demitir o ministro, como muito boa gente tem defendido, mas todo o governo, que há muito deveria ter sido lançado borda fora.

Apelo do Comité Central do KKE para as eleições de 25 de Janeiro de 2015



É NECESSÁRIO QUE NO DIA APÓS AS ELEIÇÕES O KKE ESTEJA FORTE!


OPOSIÇÃO POPULAR FORTE, UNIDADE E LUTA PELO DERRUBE DO SISTEMA!

Trabalhadores, empregados, trabalhadores independentes, desempregados, camponeses, reformados, jovens e mulheres de familias populares.

Apelamos a que apoiem e fortaleçam decisivamente o KKE nas eleições gerais. 

Pensem que após as eleições, o novo governo, a União Europeia e os memorandos permanentes, as velhas e novas medidas antipopulares exigidas pelo capital, para tornar mais competitivo o mercado capitalista mundial, vão continuar a torturar o povo.

Continuarão a existir as leis anti laborais que foram votadas por todos os governos e que não vão ser suprimidas.

Continuará a existir a dívida insuportável que é reconhecida pela ND, PASOK, SYRIZA e  todos os partidos da União Europeia, que pedem ao povo que a pague embora não tenha sido ele quem a criou, nem deva nada.

Continuará a existir as contradições e as disputas na zona euro sobre a gestão do défice  da dívida, que foi criada pelos capitalistas, e é paga com o fim de aumentar os lucros capitalistas, de acordo com a lei do mais poderoso, sempre à custa dos interesses populares.

Acima de tudo, continuará a existir o capital, os monopólios nacionais e estrangeiros que têm o controle da economia, e o poder real permanecerá, e exigirá ainda mais privilégios na fase de recuperação, sempre à custa do povo. Para investir exigirão que a força de trabalho seja ainda mais barata e subjugada. O desemprego continuará, mesmo que se façam alguns investimentos.

Continuará a existir o poder do capital, o estado que serve fielmente os interesses dos monopólios à custa do povo e define o papel de cada governo.

Independentemente do curso das negociações com a Troika e da transição para uma nova fase de supervisão, os monopólios exigem novas medidas antipopulares, tal como o completo desmantelamento do sistema de segurança social, novos cortes nos salários e nos rendimentos do povo, privatizações, e a restricção da actividade sindical. Portanto, em tempo de crise como em tempo de recuperação, o povo não será aliviado sem luta, sem entrar em conflito com os interesses do capital.

Por isso, no dia após as eleições, o povo trabalhador precisa de um KKE forte no parlamento, e em toda a parte, uma força de resistência e contra ataque operário e popular.

É a garantia contra a insegurança e a incerteza em que a classe operária e o povo se podem apoiar.

Um KKE forte para se abrir caminho para a única solução favorável ao povo, o cancelamento unilateral e completo da dívida, a saída da União Europeia e da NATO, a socialização dos monopólios, para a prosperidade do povo, com a classe operária no poder, por uma perspectiva socialista. O povo precisa do  seu próprio governo, o governo do poder operário e popular, e com o KKE a desempenhar um papel de liderança. Para se tornarem realidade os ideais e valores do povo por uma sociedade sem exploração do homem pelo homem.

Um KKE forte para que o povo não se deixe enganar novamente pela chantagem e as ilusões. Porque o KKE estará contra os governos de uma ou de outra versão da gestão burguesa que não só não garantem a recuperação das enormes perdas do povo, como  seguem o mesmo caminho que conduz a maiores riscos e tratarão de enganar novamente o povo com migalhas. O KKE desempenhará um papel importante dentro e fora do Parlamento, para que exista uma oposição militante, que exerça uma verdadeira pressão popular. Isso não tem existido até agora devido a vacilações ou a ilusões.

Um KKE forte porque é a força que, sem contrariedades nem recuos, desempenha um papel importante na organização da luta do povo pela abolição de todas as leis relacionadas com o memorandum e a recuperação das perdas do povo. Esforça-se de forma consequente e desinteressada pela justa causa  dos trabalhadores, dos empregados, pelos direitos dos jovens, das mulheres, dos desempregados, dos trabalhadores independentes, dos camponeses pobres, para organizar a solidariedade do povo.

Um KKE forte porque luta contra a participação da Grécia nas alianças e guerras imperialistas que estão em curso ou se estão a preparar para servir os interesses dos grandes grupos empresariais. Defende os direitos de soberania do país contra a NATO e a UE, contra os que enganam dizendo que  as organizações imperialistas protegerão os direitos soberanos, a paz e a segurança do povo. Luta pela saída da Grécia da NATO, para que a Grécia deixe de apoiar e participar em intervenções militares à custa dos povos.

Um KKE forte para que se reavive o movimento operário e popular, para que se estabeleça e se reforce a aliança social popular contra os monopólios e o capitalismo. Luta pelo isolamento e derrota da ideología e da actividade fascista do Amanhecer Dourado.

Trabalhadores, jovens, desempregados, reformados. 

Face à batalha eleitoral, o governo de coalizão ND-PASOK e funcionários da União Europeia investem novamente na propaganda alarmista e na extorsão, para enganar o povo e conseguir o seu consentimento para a continuação desta política antipopular. Invocam a estabilidade e a suposta  necessidade de não colocar em perigo os sacrifícios do povo grego. Os dilemas de intimidação não se dirigem principalmente à disputa bipartidária com o SYRIZA. O governo sabe muito bem que o SYRIZA não questiona a UE nem o sistema capitalista. A extorsão e os dilemas  dirigem-se sobretudo ao povo e têm como objetivo assegurar a submissão do povo ao caminho antipopular e aos tormentos que traz.

O governo mente quando afirma que as novas medidas antipopulares se podem evitar se houver estabilidade política e se apaziguem os credores. Porque as velhas e novas medidas  não são apenas uma exigência dos credores. São directivas da União Europeia desde há anos, parte integrante da estratégia do grande capital na Grécia e na Europa, para que a força de trabalho se torne ainda mais barata. Em todos os países da UE e da zona euro se realizam essas reformas antipopulares tanto com governos de direita (p.ex. na Alemanha) como social democratas (p.ex. em França, em Italia).

Portanto, o governo e outros centros do poder burguês (a Federação Helénica de Empresas, meios de comunicação etc.) falam constantemente da “necessidade de continuar com as reformas, inclusivamente por vontade própria”. O SYRIZA está a esconder esta realidade do povo. As reformas que propõe estão na lógica da União Europeia e dos empresários.

O SYRIZA não é uma alternativa favorável ao povo. Está a tentar ganhar as eleições e por isso  tem-se transformado rapidamente num partido de gestão burguesa anti operária. Oculta as causas da crise económica capitalista e esconde a cara da exploração do capitalismo, o poder do capital.

A liderança do SYRIZA não só oferece garantías aos credores, à União Europeia, aos “mercados” que não vai actuar unilateralmente, antes lhes pede que confiem e apoiem um governo do SYRIZA porque pode servir melhor os seus interesses (reuniões com fundos de investimento na City de Londres). Além disso, mesmo a nivel de slogans, abandonou as declarações acerca da “anulação” e “abolição” do memorandum e sobretudo das leis de compensação para a recuperação das prejuízos do povo, o restabelecimento do 13º e 14º salário, da 13ª e 14ª pensão para os reformados, e a abolição dos pesados impostos. Não questiona os mecanismos de vigilância da UE, os orçamentos equilibrados, os semestres europeus, quer dizer “os memorandos permanentes” à custa dos povos. Neste contexto, está a promover alianças com antigos dirigentes, ministros e deputados do PASOK, da Izquierda Democrática etc. que apoiaram os memorandos e as medidas antipopulares.

Ao mesmo tempo, o SYRIZA está a utilizar a falsa retórica “radical” de forças oportunistas no seu interior, sobretudo da chamada “Plataforma de Esquerda”, tratando de apanhar as pessoas de esquerda, os trabalhadores jovens que estão preocupados e têm uma posição política militante. Repete-se a táctica conhecida da social democracia, do PASOK, que tem uma tendência “esquerda” que supostamente está a exercer pressão sobre a liderança, quando na realidade lhe oferece um alibi de esquerda. No mesmo sentido, as alianças eleitorais formadas por ANTARSYA estão a desorientar o povo já que têm alguns objetivos de luta como “a saída do euro” sem romper com o quadro actual de controle da economía pelo poder do capital.

O SYRIZA, sobretudo nos últimos dois anos, tem-se mostrado útil para o capital com o fim de minar o movimento operário e popular. Não só não utilizou a sua alta percentagem eleitoral para o fortalecimento da mobilização do povo, como promoveu a ideia da “espera”, a ideia de confiar o seu futuro a outros, restringindo a intervenção popular à participação nas eleições e na decisão de que governo vai implementar a política antipopular. Isto também mostra que não está disposto a entrar em conflito com os interesses capitalistas na Grécia e na Europa. A vida  demostrou que o aumento da percentagem eleitoral do SYRIZA, será à custa da luta operária e popular.

Trabalhadores, jovens, desempregados, reformados.

Nos últimos tempos, tornou-se ainda mais claro que a disputa entre o governo e o SYRIZA se centra nos “mercados”, ou seja, sobre qual dos dois ganhará o “favor” do capital. Estão tratando de assumir o papel do negociador mais capaz para os interesses do capital e não para os interesses do povo. Ambos falam de “consenso nacional”, que significa a paz social e de classes, a submissão do povo aos interesses do capital.

As suas diferenças têm que ver com a fórmula de gestão do desenvolvimento capitalista. Ambos embelezam o seu conteúdo antipopular e de classe. O SYRIZA está a pedir o  relaxamento da disciplina fiscal rigorosa, unindo forças com a França e a Itália que estão continuamente  a tomar medidas à custa dos seus povos, para exercer uma maior pressão sobre a Alemanha.

No entanto, ao mesmo tempo, o governo e o SYRIZA estão a ocultar que nem o ajuste da dívida nem o relaxamento da disciplina fiscal vai levar ao alívio do povo mas ao aumento do apoio estatal aos grupos empresariais nacionais, e dos investimentos. A redução da dívida, seja pela proposta da ND ou pela do SYRIZA, será feita através de um acordo com os parceiros e será acompanhada por novos compromissos impopulares, tal como aconteceu com o “corte” do PSI em 2012, e noutros países.

No entanto, nenhuma mudança na forma de gestão pode impedir a eclosão da crise, nem levar a um desenvolvimento capitalista favorável ao povo. Isto foi demonstrado pelo exemplo dos EE.UU. e do Japão.

O governo de coalizão da ND-PASOK e SYRIZA, apesar das suas diferenças, enganam o povo prometendo-lhe o mesmo: que se a economia capitalista se fortalecer, o povo beneficiará. Isto é mentira. Qualquer forma de recuperação capitalista será construída nas ruínas dos direitos dos trabalhadores, não dará trabalho decente para os milhões de desempregados. As chamadas vantagens “comparativas” para a reconstrução da economia do país, invocadas pelo governo e pelo SYRIZA, têm a ver com as capacidades das grandes empresas de conseguir ainda maior rentabilidade.

Mesmo que a recuperação, se alcance, será fraca num período em que a recessão em alguns países capitalistas fortes ou o sobre endividamento de estados pressagiam um novo ciclo de crises mais profundas. Portanto, o capital insiste num “consenso nacional” que não é rejeitado nem por ND-PASOK, nem pelo SYRIZA, amarrando o povo aos interesses do capital. A sua disputa tem que ver com quem vai chegar à frente.

Na nova festa do capital somente haverá migalhas para o povo. O governo e o SYRIZA competem entre si e prometem dar migalhas para a “pobreza extrema” que resultam da hemorragia de outros trabalhadores e se desvanecem no dia seguinte devido às medidas antipopulares. Ambos promovem a política da União Europeia e do capital com medidas de tipo “recolher dinheiro dos pobres para apoiar os indigentes”, que não custam nada ao capital. Servem o objetivo do capital de que a base dos salários e das pensões deve ser o miserável rendimento mínimo garantido.

A ND distribui o “dividendo social” e o SYRIZA promete cantinas e a recuperação do 13º mês para os reformados mais necessitados. Mesmo a proposta do SYRIZA de restaurar o salário mínimo é uma frase vazia porque não afeta milhares de trabalhadores, sobretudo os jovens que trabalham com relações laborais flexíveis e nem sequer recebem o salário mínimo reduzido. Na essência, fomenta a conhecida  propaganda reacionária, sobre trabalhadores privilegiados e não privilegiados que abre o caminho para um ataque contra a maioria dos trabalhadores com maiores salários. Além, em muitos países da União Europeia o aumento dos salários mais baixos  separadamente, sem a recuperação das convenções colectivas, foi utilizado para a diminuição do salário médio.

Não devemos conformar-nos com migalhas. O critério da postura e luta do povo devem ser as suas próprias necessidades e as dos seus filhos. O critério deve ser também o grande potencial de desenvolvimento que oferecem a tecnologia, a ciência, o potencial de desenvolvimento do país, para a satisfação das necessidades das pessoas, se tudo isto estiver ao serviço do povo.

Trabalhadores, jovens, desempregados, reformados.

Dirigimo-nos a vós entendendo o vosso desejo de se livrarem dos memorandos, das políticas injustas e dos governos antipopulares. Sentimos a  vossa ansiedade pelo futuro, pelos vossos filhos, por viver dias melhores.

Confiamos no povo e no seu poder. O povo tem a força e a responsabilidade de não ser espectador passivo, de não ser enganado pelos ataques antipopulares levados a cabo pelos governos da União Europeia e do capital. O povo pode tirar conclusões e não permitir que se repita o sistema bipartidário antipopular do passado.

O KKE tem de ser forte em todos os lugares, porque é o único verdadeiro opositor dos monopólios e do seu poder, da UE, dos memorandos permanentes, dos governos antipopulares.

Haverá um governo após as eleições. Na verdade, há vários partidos e formações dispostos a contribuir para isso. Para o povo o que é importante é que o KKE seja forte, para que o povo também seja forte.

Vocês sabem que o KKE é uma força estável e firme contra todos os ataques anti operários e anti populares. Sabem o que o KKE fez durante 96 anos e que foi a única força da oposição operária e popular dentro e fora do parlamento nos últimos 3 anos, a partir das eleções de 2012. Em toda a parte se nota a contribuição e o impacto da luta dos comunistas. No entanto, também viram que a redução da influência eleitoral do KKE teve um impacto negativo na dinâmica e no carácter de massas do movimento operário e popular. No entanto, como sabem o KKE não se deu por vencido. Apoiou os trabalhadores assalariados, os  camponeses, os trabalhadores independentes, os reformados, os alunos e os estudantes pelo direito à saúde, à segurança social, à pensão, à educação, à protecção da renda e da habitação, das instalações para os trabalhadores independentes e os camponeses contra empréstimos usurários e impostos insuportáveis. O KKE nunca mentiu ao povo.

Dirigimo-nos sobretudo aos que pensam justificadamente que a situação não pode continuar assim, que “eles têm que ir”. Há que rejeitar o governo actual ao rejeitar a estrategia da União Europeia e do capital, e não eleger outro governo que vá aplicar a mesma estratégia com algumas diferenças insignificantes para o povo. Cada uma e cada um deve pensar que: nos anos anteriores  alternaram governos de um só partido e governos de coalizão, extorquindo o voto do povo, fomentando o medo do “pior” e ilusões sobre o mal “menor”. Mas o que mudou para o povo? Enquanto o país permanece preso nas cadeias da União Europeia e do caminho de desenvolvimento capitalista que ficou antiquado e obsoleto, a armadilha do “mal menor” levará a outros governos anti populares. O povo deve libertar-se dos governos anti populares e da sua política, e tomar ele mesmo o poder. A situação actual na Grécia e a nível internacional não permite perder mais tempo.

Dirigimo-nos a vocês que se sentem radicais, de esquerda, progressistas, que tendes experiência e memória, que tomaram parte nas lutas e que hoje pensam votar SYRIZA, com um peso no coração e pouca esperança, na lógica do “mal menor”.  Hoje, podem ver mais claramente que a liderança do SYRIZA dá credenciais ao capital e aos organismos imperialistas e corta todos os laços com a história do movimento popular. Dá oportunidade às forças mais reacçionárias de caluniar as tradições combativas do nosso povo. Rapidamente está a ocupar o lugar da social democracia, adoptando uma versão pior que antes porque a situação do capitalismo é pior e a situação do movimento operário é também pior.

Dirigimo-nos a vocês que mesmo não concordando com o KKE em tudo ou que têm reservas quanto a algumas posições, entendam, no entanto, que o KKE é o apoio firme do povo. Tudo o que o povo ganhou, ganhou-o com lutas e com o KKE na primera linha. Quando o movimento e  KKE se viram debilitados, o povo também teve perdas.

Pensem que força estará amanhã ao lado do povo, na primeira linha da luta pelos salários, o trabalho, e seus direitos.

O KKE faz um chamamento a todos os jovens preocupados, aos trabalhadores, aos reformados, a todas e todos que não se conformam com a pobreza e o derrotismo a unir forças com ele.

Convida-os a votar e fortalecer o KKE em toda a parte. Para que se fortaleça o povo, a resistência e a luta popular, a aliança popular contra os monopólios e o capitalismo, para abrir o caminho na perspectiva do poder operário e popular.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Entrevista de Giorgos Marinos, membro do Bureau Politico do CC do KKE, ao jornal UZ do Partido Comunista Alemão, sobre as eleições do próximo dia 25 e a ingerência imperialista na actual situação económica e politica na Grécia


UZ: Os recentes acontecimentos na Grécia conduziram a eleições gerais em 25 de Janeiro. Como actuará o KKE nesta luta eleitoral? Será capaz de enfrentar com sucesso a polarização prevista em torno do cenário “a favor” ou “contra” a UE?


Giorgos Marinos: A polarização que descreve (em relação à UE) não é a que se previa dado que ambos os partidos que aspiram a formar o próximo governo (a ND e o SYRIZA) estão comprometidos com a UE. De facto, o presidente do SYRIZA, A. Tsipras, declarou explicitamente: “Pertencemos ao Ocidente[…] à UE e à OTAN. Isto é indiscutível.” Assim pretendem criar uma polarização entre, por um lado, o medo fomentado pela ND de que se não prosseguirmos a actual política antipopular , será um desastre e, por outro, a exploração da indignação do povo e as ilusões de gestão que o SYRIZA fomenta, que mesmo com o seu grande resultado eleitoral não  contribuiu para o desenvolvimento das lutas operárias.

O nosso partido tem levado a cabo importantes lutas, e um trabalho de educação das massas, demostrando aos trabalhadores que qualquer que seja a forma de gestão burguesa seguida no âmbito da UE, e da OTAN, o caminho do desenvolvimento capitalista, nunca será em beneficio dos trabalhadores e das outras camadas populares. A solução é fortalecer o KKE em toda a parte, inclusivamente no parlamento, para que se fortaleça a luta do povo e se prepare o caminho para mudanças radicais.

 UZ: Os meios de comunicação na Alemanha dizem, de uma forma alarmista, que a Grécia entrará em colapso se a “esquerda radical”, quer dizer, o SYRIZA, ganhar as eleições. A UE já se envolveu na luta eleitoral. Quais são as suas expectativas em relação à política que se espera que Alexis Tsipras virá a seguir?

Giorgos Marinos: Na Alemanha há alguns que falam de forma alarmista, tal como faz o partido governamental da ND na Grécia; no entanto, outros sectores do capital manifestam-se de modo diferente e apoiam abertamente um possível governo do SYRIZA. 

É verdade que os dois partidos (ND-SYRIZA) têm divergências que expressam as diferenças existentes entre os países da zona euro e os diferentes sectores dos grupos monopolistas, da burguesía, e dos empresários. A opinião dominante na Comissão, na UE, na Alemanha, traduz uma linha política restritiva, a continuação das medidas de austeridade para que o país consiga sair da crise e para que a zona euro no seu conjunto não entre em crise. Por outro lado, existe uma opinião que fala de uma política mais expansiva - disse-o inclusivamente o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi-, quer dizer um relaxamento fiscal para que se gere liquidez e se proporcione dinheiro aos empresários para investimentos. Afirmam que desta maneira a economia “respirará”, como defende o SYRIZA. No entanto, esse dinheiro não é para o povo mas para os diversos sectores da plutocracia, para os monopólios.

Assim, quando o SYRIZA discute com a ND sobre quem dará maior impulso à rentabilidade do capital, à “competitividade” da economía, ao pagamento da dívida, não pode haver expectativas de que um governo do SYRIZA, que se transformou num partido social democrata, implementará uma política favorável ao povo. Demostrou-se na práctica que os “governos de esquerda”, tanto na Grécia como na Europa, foram as “pontes” que levaram a políticas mais “direitistas”.

UZ: Que caminho propõe o KKE que o país siga no que respeita à dívida e à UE?

Giorgos Marinos: O KKE demostrou que o povo não têm a culpa da dívida; a culpa é do capital e dos governos que o apoiam. Em suma, a dívida deve-se à adesão do país à CEE e à UE, que destruiu sectores tradicionais da economia, e em geral ao caminho de desenvolvimento capitalista uma vez que o Estado pediu empréstimos para servir a rentabilidade do capital e agora pede aos trabalhadores que paguem. Nòs apelamos às pessoas para que não reconheçam a dívida.

Além disso, repare que tanto o plano da ND para o “alargamento” do pagamento da dívida, que é aceite también por quadros do SYRIZA, como o objetivo oficial do SYRIZA e do FMI do “corte” da dívida, para que volte a ser “sustentável”, não liberta o povo desta carga financeira insuportável, não dá lugar à recuperação dos percas nas receitas que o povo sofreu desde a eclosão da crise capitalista; Nem impedem a continuação das medidas antipopulares.

O que o povo deve fazer é criar condições na sociedade a fim de preparar  o caminho para o cancelamento unilateral da dívida, a retirada da Grécia da UE e da OTAN, o desenvolvimento de uma economia baseada nas necessidades do povo e não na rentabilidade do capital. Esto requer o poder operário e popular. A condição prévia para isso é o reagrupamento do movimento operário e popular, a formação da aliança popular da classe operária com as outras camadas populares, algo que pode ser levado a cabo através do fortalecimento decisivo do KKE.

UZ: O KKE rejeita a participação no Partido da Esquerda Europeia (PEE). Quais são as razões que levaram a essa decisão? Não existem razões que favoreçam esse tipo de cooperação?

Giorgos Marinos: O KKE tem 96 anos de actividade incessante. Desde a sua fundação, o nosso Partido foi e continua a ser um partido internacionalista. Há 16 anos, o KKE tomou a iniciativa de começar os Encontros Internacionais de Partidos Comunistas e Operários, em Atenas. Responde activamente aos convites de outros partidos, toma iniciativas de coordenação de actividades a nivel mundial e regional. Portanto, as nossas diferenças com o PEE não têm que ver com a questão de haver  coordenação da actividade, mas em que direcção deve ser essa coordenação.

Ou seja, o KKE considera que é necessário fortalecer a actividade conjunta contra a guerra, e as intervenções imperialistas, contra o desenvolvimento capitalista, contra as medidas anti operárias e anti populares, contra as organizações imperialistas da UE e da OTAN, contra qualquer organização imperialista. O nosso objetivo deve ser a criação duma estratégia revolucionária contemporânea a nível internacional.

Isto não pode ser feito pelo PEE que foi formado com base nas decisões da própria União Europeia. Todos os chamados “partidos europeus” (o PEE também) aceitam obrigatoriamente nos seus documentos, e apoiam, esta “construcção” imperialista da UE, da qual recebem apoios.

O KKE promove a nível europeu uma nova forma de cooperação e reunião de partidos comunistas e operários com base em principios comuns. Até agora na “Iniciativa para o estudo, o desenvolvimento dos assuntos europeus e a coordenação da acção” participam 29 partidos que não são membros ou  membros plenos do PEE e baseiam-se nos principios do socialismo científico, unidos pela visão de uma sociedade sem exploração do homem pelo homem, sem pobreza, sem injustiça social, sem guerras imperialistas.

Ao mesmo tempo estamos claramente comprometidos com a luta contra a UE, que é uma opção do capital e promove medidas a favor dos monopólios, reforça as suas características como bloco económico, político e militar imperialista, contra os intereses da classe operária, dos sectores populares, aumenta o armamento, intensifica o autoritarismo e a repressão estatal. Acreditamos no direito de cada povo a escolher soberanamente o caminho do seu desenvolvimento , incluindo o direito de retirar-se das várias dependencias da UE e da OTAN, e o direito à opção socialista.

Em nossa opinião, cada partido comunista europeu que queira cumprir com a sua missão histórica, como partido da classe operária, com uma perspectiva socialista, será práticamente obrigado a tomar parte na nossa frente comum contra os monopólios, o capitalismo e as suas organizações, como a UE e a OTAN. De outra forma, deslizará de forma aberta ou encoberta na intenção inútil de “humanizar” a UE e o capitalismo, perderá a sua identidade comunista. Consequentemente, responderá erradamente ao dilema “socialismo ou barbarie”, “reforma o revolução”, colocado pela revolucionária alemã Rosa Luxemburgo nos seus escritos. Ou seja, estará na margem oposta dos interesses operários e populares, onde hoje se encontra, entre outros o PEE.

 UZ: Desejamos sucesso nas eleições e nas lutas que 2015 trará!

sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Em “sucessivos enganos” os EUA continuam fornecendo armas ao Exército Islâmico



Parlamentares iraquianos querem denunciar na ONU a coalizão liderada pelos Estados Unidos, que continua sistematicamente entregando armas aos terroristas do EILL.

Deputados do Parlamento do Iraque pediram nesta quinta-feira  ao governo em Bagdád que apresentasse um relatório para as Nações Unidas (ONU) denunciando o fornecimento de armas pelos EUA ao grupo EILL.

Em um comunicado à imprensa estrangeira, o parlamentar iraquiano, Alia Nasif, considera que o lançamento de armas pelos aviões norte americanos em áreas de conflitos são intencionais e as armas sempre acabam em mãos de terroristas, o que contradiz o direito internacional e, portanto, o governo iraquiano tem que denunciar perante a ONU.

O deputado reafirma que por diversas vezes a ação americana vem-se repetido e é feita intencionalmente, o que viola as regras do direito, e a comunidade internacional deve condenar os Estados Unidos, que vem fingindo combater os terroristas quando na verdade, sistematicamente, vem fortalecendo o grupo do Estado Islâmico com o envio de armas.

Awad al-Awadi, outro parlamentar iraquiano, disse que as forças da chamada coalizão internacional anti-EIIL, liderada pelos Estados Unidos, constantemente enviam ajuda armamentista ao grupo takfiri, mas sempre alegam ter feito por engano.

Os Estados Unidos apoiam o Estado Islâmico no Iraque e na Síria, e de forma explícita o denominado Exercito Livre Sírio (ELS) e a oposição armada síria, afirmou o parlamentar.

No dia anterior, Al-Awadi havia denunciado que os Estados Unidos já ajudaram terroristas em Tal Afar e Sinjar, províncias situada a noroeste de Nínive, e o caso mais recente dessa ajuda ocorreu perto da cidade de Balad, localizada na província central de Salah al-Din.

Em 8 de agosto do ano passado, os EUA e seus aliados lançaram ataques aéreos no Iraque, sob a bandeira da coalizão internacional chamada anti-EIIL, com o objetivo de acabar com este grupo terrorista. No final de setembro, eles se espalharam pelo território sírio com o objetivo de derrubar o presidente Bachar al Assad e contam com a ajuda já não mais disfarçada do governo de Barack Obama.

Os analistas políticos questionam os objetivos de Washington nesta nova luta contra o terrorismo no Oriente Médio, e nos lembram que os grupos extremistas que diz combater, como o EIIL, nasceram com ajuda financeira de países como os EE.UU,
Turquia, Arábia Saudita e Qatar.

Informação do Hispan TV

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Socialismo e capitalismo de Estado. Por: Tatiana Khabarova


Num primeiro olhar superficial, socialismo e capitalismo de Estado parecem praticamente a mesma coisa, o que explica a «tensão» teórico-ideológica que surgiu nos últimos tempos em torno desta questão. Tanto num como noutro, os principais meios de produção estão nas mãos do Estado.

Em que reside então a diferença? A resposta mais genérica é a seguinte: A diferença consiste, antes de mais, na natureza de classe do Estado que tem nas suas mãos os meios de produção.

Mas esta resposta ainda é muito abstracta. É preciso examinarmos mais em concreto como precisamente o Estado (no papel de proprietário dos meios de produção) revela ou realiza a sua essência de classe na esfera das relações económicas.

Os meios de produção por si só não têm qualquer interesse. No entanto, a parte de leão do rendimento criado na produção social pertence a quem os detém. Isto é o mais importante de tudo e temos de ter permanentemente em conta que qualquer forma de propriedade funciona sempre apenas «em parceria» com o correspondente mecanismo de acumulação e de distribuição do rendimento.

Mas as relações que «dirigem» a formação e a distribuição do rendimento na economia são as relações de mercado (ou relações de valor monetário-mercantis),que se agregam em torno da lei do valor. Com efeito não é possível obter qualquer rendimento da actividade produtiva enquanto o produto final não é vendido no mercado.

De que forma as relações monetário-mercantis cumprem esta sua função económica e ao mesmo tempo de classe de encaminhar o rendimento criado rigorosamente para as mãos do proprietário dos meios de produção? Se observarmos com atenção é fácil ver que o rendimento está sempre «empacotado» de uma tal forma no processo económico que só pode ser extraído e utilizado realmente por quem possui
o factor produtivo decisivo (o complexo de meios de produção) em cada situação histórica concreta.


Assim, no regime feudal, praticamente todo o rendimento criado pela sociedade é auferido, em última análise, pelo proprietário da terra. Aqui, o rendimento adquire a forma específica historicamente concreta de renda feudal.

Na sociedade burguesa o rendimento é auferido pelo proprietário dos meios técnico-materiais utilizados na produção e adquire a forma de lucro sobre o capital. É característico que a lei capitalista da «taxa média de lucro» não actue no quadro do regime feudal, tal como como o rendimento no capitalismo não pode ser extraído sob a forma de renda feudal, ou seja, a corveia [trabalho gratuito] e o tributo.

O mecanismo de formação e distribuição do rendimento (o mecanismo do «mercado» ou, como nós o designamos, «modificação da lei do valor») desempenha na economia um papel não menos importante do que o tipo em si de propriedade dos meios de produção. Num determinado tipo de «mercado» não tem grande importância se o proprietário dos meios de produção é individual ou colectivo (associado).

Assim, numa série de países, os mosteiros da idade média constituíam uma espécie de senhores feudais colectivos. O próprio Estado feudal, como por exemplo na Rússia, era muitas vezes um «senhor feudal associado», dispondo de servos «estatais» e de terras. Seguramente que todos compreenderão que do facto de os camponeses pertencerem ao Estado, e não a um senhor feudal individual, decorre que também aqui existia um certo tipo de propriedade estatal, mas de tudo isto não resultou qualquer «socialismo». É totalmente errado relacionar a propriedade estatal dos meios de produção, predominantemente (ou até exclusivamente), com o socialismo.

Não se pode ver em todos os tipos de propriedade estatal um embrião do socialismo, ou, inversamente, se pode negar e esbater a especificidade do socialismo com o argumento de que a propriedade estatal também está presente noutras formações.

No modo de produção capitalista podemos observar uma situação análoga à examinada na propriedade feudal. Caso se conserve o mecanismo de formação e distribuição do rendimento «proporcionalmente ao capital investido», segundo o princípio «lucro sobre o capital», então, mais uma vez, é indiferente se «na outra ponta» desta ligação está um capitalista individual ou colectivo. E neste caso, precisamente como o capitalista pode ser associado, também o Estado burguês pode ser o proprietário
dos meios de produção. Porém, sublinhamos, daqui não resulta nenhum «socialismo», tal como não era «socialista» a propriedade estatal da terra e dos camponeses na Rússia de Pedro e de Catarina.

Assim, o que é o capitalismo de Estado?

O capitalismo de Estado é a propriedade estatal dos meios de produção, numa economia em que vigoram as leis capitalistas do lucro e da formação de preços, ou seja, em que o rendimento é extraído segundo o esquema «lucro sobre o capital», proporcionalmente à grandeza do capital investido. Ou, ainda se pode dizer, numa sociedade em que a lei do valor actua na sua modificação capitalista.

Podeis agora sem grande dificuldade formular a definição, por exemplo, do «feudalismo de Estado»: é a propriedade estatal dos principais requisitos da produção, desde que o rendimento seja consolidado e extraído na sociedade segundo o princípio da renda feudal.

E neste plano como são as coisas no socialismo?

O socialismo é a propriedade estatal dos principais meios de produção, na condição de que a lei do valor actua na sua modificação específica socialista, ou seja, o rendimento acumula-se e é extraído proporcionalmente não ao capital, mas ao trabalho vivo; na condição de que o direito ao trabalho constitui uma  das principais garantias constitucionais dos cidadãos e que o desemprego foi
completamente extinto.

Podemos formular isto de forma ainda mais curta: O capitalismo de Estado é a propriedade estatal dos meios de produção quando a formação e distribuição do rendimento na sociedade se efectuam segundo o capital; enquanto o socialismo é a propriedade estatal dos meios de produção quando a formação e distribuição do rendimento se efectua segundo o trabalho.

Em trabalhos anteriores examinámos várias vezes a questão da modificação socialista da lei do valor, ou seja, o mecanismo de formação do rendimento proporcionalmente ao trabalho vivo. Vimos que a aproximação histórico-concreta mais nítida à modificação socialista do valor foi «o sistema de duas escalas de preços», que foi criado e aplicado na economia nacional da URSS no período entre os finais dos anos 30 e a primeira metade dos anos 50. Neste trabalho abordaremos apenas alguns
aspectos fundamentais desta questão.

De que forma o sistema de duas escalas de preços permitia a «transfusão» da maior parte do rendimento social precisamente para o bolso do trabalhador comum, representante das massas laboriosas?

Antes de mais, efectuava-se através do mecanismo de redução periódica e substancial dos preços de retalho nos produtos alimentares básicos e artigos industriais de amplo consumo. Efectuava-se ainda através alocação prioritária e não «residual» de recursos do orçamento do Estado para o financiamento das necessidades sociais, em primeiro lugar, da Educação e da Saúde.

Por seu turno, a redução sistemática dos preços de retalho era possível porque ao longo de toda a cadeia social-tecnológica se seguia rigorosamente a orientação para a redução do preço de custo da produção. Não era permitida a obtenção de lucro em proporções minimamente significativas através dos preços do produto social intermediário (isto é, praticamente toda a produção destinada ao processo técnico-produtivo).

A taxa de rentabilidade nos preços de venda das empresas, regra geral, era baixa (na ordem de alguns pontos percentuais sobre o custo de produção) e praticamente uniforme em toda a economia nacional, em todo o sortido de artigos. A fixação de uma taxa de rentabilidade baixa e bastante rígida nos preços e a manutenção da produção técnica praticamente ao nível do «preço de custo» extinguiam o interesse
do produtor em manipular os preços, pois por essa via não era possível «melhorar»
significativamente os indicadores de desempenho.

O grosso do volume do rendimento social formava-se no mercado de consumo final, nos preços dos produtos de consumo geral, adquirindo aqui a forma de rendimento líquido centralizado do Estado («imposto sobre transacções»). Uma vez que os artigos de amplo consumo não são mais do que meios de reprodução da força de trabalho, destinados a compensar os seus gastos e a garantir o seu desenvolvimento, resultava então que o rendimento social se formava, de facto, «segundo o trabalho»,
proporcionalmente à «transfusão» verificada à época de gastos de trabalho vivo.

A incorporação de um importante imposto sobre transacções nos preços de consumo dava ao Estado margem de manobra para aplicar com segurança e determinação a sua política social de classe: em primeiro lugar, embaratecer aqueles produtos que determinam o nível de vida das massas. A redução dos preços era feita em parte à custa do rendimento líquido centralizado do Estado, o qual era entregue à população precisamente através dessa forma específica. 

Em suma, pode-se dizer que na época em que vigorou o sistema de duas escalas de preços, a propriedade estatal no nosso país conjugava-se com a modificação «laboral» socialista do valor, isto é, o socialismo existia nos seus traços básicos, mesmo que numa forma ainda «por polir».

O quadro alterou-se radicalmente (no mau sentido) em resultado da «reforma económica» de 1965-1967. Mas o problema não está no facto de a reforma ter permitido uma «política de aumento do lucro». O lucro é na sua essência rendimento, e sem rendimento, sem aumento dos resultados da economia em relação aos gastos, nenhuma produção, nem capitalista nem socialista, pode funcionar. O rendimento – na sua forma de rendimento líquido do Estado acrescido do lucro das empresas – também era obtido, naturalmente, no período de Stáline, no período do sistema de duas escalas de preços, e a sociedade estava igualmente interessada no seu aumento, não na sua diminuição.

A essência do problema é outra. No «socialismo de Stáline» o rendimento social acumulava-se – como mais uma vez acabámos de verificar – em proporção directa com os gastos de trabalho social vivo. Era isso que na altura tornava a propriedade estatal dos meios de produção autenticamente socialista. No processo da dita «reforma económica» de 1965, não seguiu uma «política de aumento do lucro», mas mudou-se o princípio de formação de rendimento (formação de lucro).

O sistema de duas escalas de preços foi rompido, desapareceu a delimitação que lhe era característica entre os preços do mercado de consumo e os preços «produtivos».

O rendimento começou a ser formado por toda a parte, à semelhança do «lucro sobre o capital» no capitalismo, extraído proporcionalmente ao valor do capital fixo e dos meios materiais circulantes, isto é, no essencial, proporcionalmente ao valor dos gastos materiais e não de trabalho.

Em resultado, a propriedade estatal socialista dos meios de produção foi então combinada com uma modificação disforme, «pseudo capitalista», das relações monetário-mercantis.

A estrutura híbrida que surgiu afastou-se bruscamente do socialismo em direcção ao «capitalismo de Estado». Pôs-se fim à construção do socialismo enquanto tal (as premissas para isso formaram-se ainda nos anos 50), iniciou-se uma degeneração gradual e, subsequentemente, o desmantelamento aberto das estruturas socialistas criadas na economia e na política, num sentido burguês. Foi precisamente o processo pernicioso e inteiramente regressivo da degeneração da propriedade social socialista, num certo tipo, verdadeiramente bastardo, de propriedade capitalista de Estado, que levou o país primeiro à estagnação e depois à crise contra-revolucionária mais profunda e perigosa da nossa história (que se desenrolou sob a bandeira da «perestroika»).

Assim, «o capitalismo de Estado» existiu na URSS, em primeiro lugar e em determinada medida, no período da NEP, durante o qual não havia apenas «privados sob o controlo do Estado», mas praticamente toda a indústria da altura era «capitalista de Estado». Nessa época ainda não surgira a modificação socialista da lei do valor. Os trusts, como principal forma de organização da produção durante a NEP, tinham amplos direitos no domínio da realização da produção final, no abastecimento
e ao mesmo tempo na formação de preços. Nestas condições, naturalmente, o mecanismo das relações monetário-mercantis actuava espontaneamente, como antes, à maneira capitalista, e a formação e distribuição do lucro efectuava-se segundo a grandeza do capital investido. A remuneração do trabalho gravitava em torno do valor da força de trabalho como mercadoria, e todo este «conjunto» era 
logicamente completado com o desemprego, ao qual hoje alguns tendem «a não atribuir significado particular».

Mais tarde, no período dos «quinquénios de Stáline», a modificação socialista do valor (isto é, a construção geral do «mercado socialista»), como já repetimos muitas vezes, foi descoberta teoricamente e na prática. Por isso, nessa altura, a nossa estrutura económica já não tinha nada a ver com «capitalismo de Estado». Na transição dos anos 40 para os anos 50 podia-se caracterizar inteiramente como «socialismo construído no fundamental».

A partir de meados dos anos 50 iniciou-se obstinadamente a demolição e a mutilação desta estrutura socialista, e no decurso da reforma de 1965-1967 concretizou-se o «segundo advento» do capitalismo de Estado. Tal aconteceu em resultado, como já se explicou, da substituição da modificação socialista do valor pela «pseudo capitalista» (ou capitalista não declarada), da substituição do princípio da formação do rendimento «proporcionalmente aos gastos de trabalho vivo» pelo princípio da formação
de rendimento «proporcionalmente ao valor do capital produtivo», isto é, na prática por analogia ao «lucro sobre o capital».

Desde essa altura e ao longo de um quarto de século, a nossa economia foi «corroída» na sua base por um profundo desequilíbrio estrutural: o modo de produção socialista, em vez de se desenvolver normalmente na direcção comunismo, teve de se debater penosamente com a forma de distribuição capitalista não declarada, compulsivamente «cravada» no conjunto da economia.

Foi daqui que decorreram todas as nossas desgraças e não de todo do inventado «sistema de comando administrativo», que não existia no nosso país durante o socialismo – o que existia era um sistema próprio ao regime socialista de direcção planificada centralizada territorial e por ramos de actividade da economia nacional.

A este propósito, como temos assinalado nos nossos trabalhos, os fenómenos negativos que asfixiam hoje a economia soviética surgiram todos em datas precisas, e todas essas datas, da primeira à última, remontam não à época de Stáline, mas à segunda metade dos anos 50 e anos subsequentes.

Assim, na segunda metade dos anos 50, começou o declínio duradouro da generalidade dos indicadores do nosso crescimento económico – processo que hoje não podemos parar.

Veja-se o que escreveu V. Trapeznikov em 1982:

«A passagem em 1957 do sistema de direcção por ramos da economia para o nível territorial (sovnarkhozi – sovietes de economia nacional) provocou a ruptura de uma multiplicidade de ligações económicas e o desmembramento dos complexos produtivos. Em consequência, logo em 1958 degradaram-se bruscamente os indicadores do rendimento nacional, o rendimento dos investimentos e os ritmos do progresso científico-técnico. O regresso em 1965 ao sistema de direcção por ramos de actividade produziu uma viragem no bom sentido. No entanto, não se conseguiu atingir os ritmos observados em 1958 devido às dificuldades em restabelecer as ligações económicas destruídas (…) A partir de 1959 os ritmos de crescimento começaram a baixar. Em 1980 tinham baixado três vezes. (…)
«Tornou-se habitual o incumprimento dos planos de criação de nova maquinaria (…) Apesar do aumento dos investimentos, assistiu-se à redução dos resultados.

A partir de 1958 até 1980 o retorno dos investimentos caiu de 0,48 para 0,31. Em 1958, os novos investimentos tinham um retorno de 0,52. Em 1980 esse retorno era de 0,16. Por conseguinte, se em 1958 o investimento de um rublo se traduzia em 52 kopeques de crescimento do rendimento nacional, em 1980 o resultado era de apenas 16 kopeques».

Veja-se o que escreveu V. Kulikov em 1986:

«Os ritmos de crescimento não sofreram uma mera queda. No início dos anos 80 chegaram a um nível crítico. Nesse período o crescimento dos rendimentos reais da população praticamente estagnou, e a posição da URSS na competição económica com os EUA, ao longo de uma série de anos, não só não melhorou como, em alguns indicadores, piorou.»

D.A. Smoldipev, em 1980:

«Até 1940 o crescimento do rendimento nacional era superior ao crescimento do capital fixo [instalações e meios de produção]. Durante os anos 40-50 até 1956-1958, o retorno dos investimentos aumentou persistentemente, mas no período entre 1959 e 1965, esse retorno começou a diminuir.»

P.N. Fiodosséiev, em 1980:

«A redução dos ritmos de crescimento do rendimento nacional verifica-se em simultâneo com o crescimento incessante e significativo do volume de capital fixo e de capital circulante utilizado na economia nacional. Assim, se a relação do crescimento do rendimento nacional e do crescimento do capital fixo no período do oitavo quinquénio foi de aproximadamente 1:2, já no nono quinquénio esta relação foi de 1:3,4, e nos primeiros anos do décimo quinquénio subiu para 1:4,2. Isto mostra a
que ponto tem baixado o retorno dos investimentos.»

Por sua vez, a diminuição crónica do retorno dos investimentos é sinónimo do carácter gastador da actividade económica. A consolidação final do «mecanismo» gastador na nossa economia foi, mais uma vez, uma consequência da reforma de 1965, quando o esquema de formação do lucro foi reorientado «do trabalho vivo para o capital», da grandeza dos gastos sociais de força de trabalho para a grandeza dos meios materiais envolvidos na produção. Num contexto em que não havia concorrência no investimento de capital, isto só podia conduzir à situação em que as actividades mais lucrativas eram aquelas cujo tipo de trabalho e produção permitiam consumir mais trabalho social. 

(Podemos ver por aqui que a maior e indiscutível vantagem da economia socialista – a planificação do processo de investimento – ao ser conjugada com uma modificação do valor alheia, não orgânica ao socialismo, transformou-se numa «insuficiência». Aliás, todas as outras insuficiências da organização
da economia socialista, em torno das quais os actuais economistas adeptos do mercado fazem grande alarido, têm a mesma origem. Trata-se de enormes vantagens inquestionáveis do socialismo que não podiam revelar-se à devida altura unicamente porque foram colocadas sob a mesma canga ao lado de uma construção das relações monetário-mercantis que não lhe corresponde.)

Prosseguindo. Devido ao facto de em 1965-1967 terem «esburacado» a rígida barreira estrutural existente no sistema de duas escalas entre os preços de consumo e os preços para a produção (entre o dinheiro para remunerar o trabalho e o dinheiro «contabilístico», segundo a terminologia de B.M. Iakuchev), começou a conversão de dinheiro nominal em numerário, violando-se a correspondência entre a massa monetária na posse da população e o volume de bens de consumo colocados no mercado.

O desequilíbrio monetário-mercantil começou a aumentar acentuadamente e a inflação veio acompanhá-lo. (Isto é aliás bem ilustrado pelos cálculos de E.T. Ivanov sobre a dinâmica das poupanças da população e as reservas de mercadorias, os quais testemunham que, entre 1970 e 1985, os depósitos nas caixas de poupança aumentaram quase cinco vezes, enquanto a produção de mercadorias apenas duplicou.)

No sistema de duas escalas de preços nada disto era possível de acontecer, uma vez que o Estado entregava aos trabalhadores o seu «dividendo» anual sob a forma de redução dos preços dos bens realmente colocados à venda, e não através de montantes monetários inflacionistas, sem correspondência com o volume produzido de mercadorias.

Prosseguindo. Os frutos das «reformas económicas» de Bréjnev-Kossíguine demonstram à exaustão quão infundadas são as esperanças depositadas numa dada empresa (ou num «bloco» de empresas) enquanto unidade estrutural auto-suficiente «capaz de resolver todas as questões» do processo de produção social. Apesar de tudo, por muitas voltas que se dê, não são as empresas que expressam os interesses de classe trabalhadora, mas sim o Estado socialista operário-camponês. A tarefa consiste
em depurar o aparelho do Estado socialista das «distorções burocráticas» (V.I.Lénine), mas não de todo em forjar contrapesos às funções estratégicas do poder estatal, através, por exemplo, «do poder directo dos colectivos laborais». Isto nunca levou e não levará a outra coisa senão à devassidão do egoísmo de grupo («colectivo»).

Apenas o Estado pode ser o garante fiel de que no conjunto da economia se concretiza precisamente o interesse de todo o povo, isto é o interesse progressista de classe.

Vejamos deste ponto de vista o que foi o «reformismo» económico dos anos 60.

Se antes a parte predominante do rendimento social era constituída sob a forma de «rendimento líquido centralizado do Estado», (em 1952 o RLCE representou 69 por cento das receitas do Estado), posteriormente o peso do RLCE diminuiu incessantemente, caindo no 11.º quinquénio para menos de um quarto das receitas do Estado (para 1986 previa-se que o RLCE proporcionasse uma receita de 102,5 mil milhões de rublos, de um total de 414,4 mil milhões de receitas). Planeava-se no futuro
substituir totalmente o RLCE («imposto sobre transacções») pela tributação do lucro das empresas e o pagamento do capital fixo.

Deste modo, uma vez que o rendimento social começou, no essencial, a ser formado não pelo Estado no mercado de consumo, mas directamente pelas empresas e (naturalmente) pelos ministérios, «na sua casa», o resultado foi, em primeiro lugar, o crescimento brusco, como já se assinalou, da massa monetária sem correspondência com a produção de mercadorias e, em segundo lugar, a acumulação de fundos na esfera produtiva, sendo tanto mais significativa quanto mais próximo se estava da
cúpula da direcção económica.

Quais foram os ganhos para o povo desta «redistribuição do poder económico»?

Antes de mais, o emagrecimento do orçamento do Estado e a consequente redução dos programas sociais, que passaram a ser financiados segundo o princípio do «remanescente».
O orçamento do Estado passou muito rapidamente a ser deficitário.
Sublinhe-se: passou, pois antes não era.

«As receitas orçamentadas diminuíram» – reconheceu abertamente o antigo presidente do Gosplan da URSS, N.K. Baibakov, entrevistado pelo Vetchernaia Moskva em 1989. «Os recursos fora absorvidos pelos fundos das empresas, enquanto as despesas continuaram a ser suportadas pelo Estado. Logo na elaboração do plano para 1967 e 1968 (…) não se conseguiu fazer um Orçamento do Estado equilibrado com base nas receitas correntes.»
Assim, «ganho número um» – défice orçamental.

«Ganho número dois» – o rápido alastramento do fenómeno que hoje designamos por «departamentalismo». Com efeito, para que os departamentos (ministérios), em grau não menor às grandes empresas, começassem a sobrepor os seus interesses de grupo aos interesses gerais, aos interesses do Estado no sentido próprio, precisavam de ter uma poderosa base económica. E ela formou-se após a reforma com a passagem de uma parte enorme do rendimento social para a posse das células produtivas e dos seus estados-maiores de ramos de actividade.

Mas será que as empresas e os ministérios usaram esses recursos, como inicialmente se pressupunha, no reequipamento da produção e na melhoria das condições de trabalho e de vida dos operários? 

Infelizmente nada disso se verificou. Hoje há literalmente um grunhido em toda a nossa imprensa: praticamente todos se queixam de que na produção as máquinas e os equipamentos estão gastos até ao limite, pois não foram renovados nos últimos 20-25 anos. Desculpem, mas quem é que vos impediu
de o fazer? Conclui-se que viveram até hoje com aquilo que os amaldiçoados «comissários do povo stalinistas» deixaram ao país. Onde é que estão todos esses «investimentos descentralizados», esses «fundos de desenvolvimento da produção», etc.?

A resposta é simples: os recursos foram empregues na «construção de instalações não produtivas de importância secundária»,9 na manutenção de uma burocracia «industrial» que se multiplicou a um ritmo sem precedentes e em ambiciosos projectos desmiolados, que pareciam servir apenas para justificar a «necessidade» da multiplicação ilimitada das fileiras burocráticas.

Basta dizer que, no início de 1989, o pessoal administrativo na esfera da produção, nas empresas e complexos industriais (sem contar com os ministérios), elevava-se a 13 milhões de pessoas, enquanto o chamado «sistema de comando administrativo», incluindo os órgãos dos sovietes e órgãos administrativos de direcção, empregava menos de dois milhões de funcionários administrativos. Como termo de comparação, refira-se que só o aparelho do Ministério da Agricultura dos EUA tem ao seu serviço cerca de 110 mil funcionários.

Assinale-se, entretanto, que o peso do pessoal administrativo das empresas soviéticas no universo de operários e empregados aumentou de 10,5 por cento em 1985 para 11,2 por cento em 1989. Neste período o número total de administrativos «na produção» cresceu de 12,5 milhões para 13,1 milhões de pessoas, enquanto o número de empregados e operários diminuiu um milhão. Eis pois os bons resultados das empresas que se arvoravam em «combatentes contra a burocracia»

A «transição para o capitalismo de Estado», entre a segunda metade dos anos 50 e meados dos anos 60, teve efeitos particularmente devastadores na situação da agricultura socialista.

«A partir aproximadamente dos meados dos anos 50» – escreve o conhecido economista soviético L.I. Maizenberg – «o desenvolvimento da produção kolkhoziana assentava na base técnico-material das estações de máquinas e tractores (MTS), que executavam a pedido dos kolkhozes toda a laboração que exigia a utilização de máquinas. Os serviços prestados pelas MTS eram pagos em produtos. Nestas condições a alteração dos preços grossistas dos meios de produção destinados à agricultura reflectia-se não no custo de produção dos kolkhozes, mas nos gastos e indicadores financeiros da actividade das MTS (…) Nestas condições, qualquer alteração, mesmo substancial, nos preços grossistas e de aquisição [de produtos agrícolas] reflectia-se não ao nível dos preços de retalho, mas na alteração das proporções do imposto sobre transacções. O imposto sobre transacções constituía uma espécie de amortizador, esbatendo as alterações dos preços grossitas dos meios de produção e dos preços de aquisição da matéria-prima agrícola.

«A situação começa a alterar-se radicalmente a partir da segunda metade dos anos 50. Com a extinção das MTS, a maquinaria agrícola foi entregue aos kolkhozes. Desde essa altura, o pagamento da maquinaria agrícola produzida pela indústria estatal passou a efectuar-se à custa dos rendimentos dos kolkhozes, e o nível e dinâmica dos seus preços transformaram-se num importante factor, determinando o custo da produção kolkhoziana.»

Na sequência da extinção das MTS, a venda da maquinaria agrícola representou para muitos kolkhozes (tal como tinha prevenido I.V. Stáline em 1952) uma catástrofe financeira e produtiva.

«A maioria dos kolkhozes não dispunha de serviços de manutenção e reparação, não tinha os técnicos necessários, nem os meios suficientes para renovar as máquinas. Tudo isto se reflectiu negativamente no desenvolvimento da produção agrícola.»

«Os kolkhozes foram obrigados a adquirir a pronto pagamento as máquinas e outros instrumentos de trabalho às estações de máquinas e tractores. Para muitos kolkhozes isto era demasiado oneroso. Em resultado deteriorou-se o nível de equipamento técnico da agricultura».

Daqui em diante passou a ser necessário subvencionar permanentemente a aquisição de maquinaria no campo, particularmente depois da reforma de 1965-67 que acabou com a política de baixos preços grossitas dos meios de produção e abriu caminho à produção em grande escala de maquinaria dispendiosa, com incorporação intensiva de material, mas pouco eficiente economicamente. Formou-se uma «bolha» de subvenções incomportáveis, nunca vista antes da época de Khruchov no sector kolkhoziano. Nestas condições, para garantir pelo menos a aparência de rentabilidade no sector agrícola foi preciso aumentar várias vezes os preços de aquisição [pelo Estado] da produção agrícola. 

A «vaga» de aumentos consecutivos dos preços grossistas da maquinaria provocou o aumento descontrolado do custo da produção agrícola e a formação de uma segunda «bolha» permanente de subvenções aos preços de retalho, já que os preços de aquisição chegavam a ser várias vezes superiores aos preços ao consumidor. Também isto não existia no nosso país «durante o socialismo».

Todos estes fenómenos nefastos, que provocaram esta «viragem» para uma economia subsidiada, são fruto da capitalização encoberta da economia nacional da URSS, da sua reorientação para os trilhos do capitalismo de Estado nos anos 50 e 60.

Poderíamos continuar a enumeração das consequências perniciosas de mais de 30 anos de «erosão capitalista de Estado» do nosso organismo económico nacional, mas julgamos que o quadro geral já é suficientemente claro. Agora é altura de responder à pergunta mais importante: Que fazer?

No plano estratégico a resposta é também clara: é necessário suspender a estúpida e pérfida «desestatização», que contraria as tendências objectivas da economia mundial.

É necessário travar imediatamente o «pogrom» da propriedade estatal dos meios de produção, mas na condição de se fundir a propriedade estatal não com a modificação capitalista da lei do valor, que assola hoje a nossa economia, mas com a modificação socialista, isto é, restabelecer nos seus traços essenciais e determinantes, o sistema de duas escalas de preços.

Se quisermos também podemos ver isto como uma certa forma de «transição para o mercado»: uma transição para o mercado socialista normal, em conformidade com as leis do desenvolvimento da economia, o qual nas últimas três décadas praticamente deixou de existir no nosso país. No mercado socialista, os meios de produção e a força de trabalho não constituem mercadorias, está excluído o desemprego e garantido o direito ao trabalho. O «estatuto» de mercadoria apenas é plenamente atribuído aos bens de amplo consumo da população.

No mercado socialista, como critério quantitativo, equivalente à taxa de lucro no capitalismo, toma-se o nível dos preços de retalho dos produtos de consumo básicos.

O critério de eficiência da economia nacional é o «velocímetro» da redução anual dos principais preços de retalho. O critério local de eficiência (para cada empresa) é a redução do preço de custo da produção, considerando-se (e recompensando-se) antes de mais a redução do preço de custo não «em casa própria», mas «na casa do vizinho do lado», isto é, a economia de gastos daquele que consome. 

Segue-se a linhada redução consequente e incessante da redução dos preços grossistas em toda a produção destinada ao processo técnico-produtivo, na base da redução do seu custo de produção. Os preços grossistas incluem uma pequena taxa de rentabilidade, uniforme em toda a economia nacional (na ordem de alguns pontos percentuais do preço de custo). O grosso do valor do sobreproduto é «vertido» para o mercado de consumo, onde é acumulado sob a forma de rendimento líquido centralizado do Estado. 

Rompe-se a dependência perversa da remuneração do trabalho do valor da produção.

O trabalho é remunerado consoante a qualificação do trabalhador, complexidade do trabalho e cumprimento dos objectivos planificados (isto é, em função da posição efectiva do trabalhador na emulação socialista). O lucro obtido acima do plano, graças à redução suplementar do custo de produção, em resultado de inovações científico-técnicas e aperfeiçoamentos, permanece à disposição do colectivo laboral.

O financiamento de investimentos estratégicos de grande escala é feito de modo centralizado através do orçamento do Estado.

As alavancas de elevação do bem-estar material e cultural dos trabalhadores são o aumento pecuniário do salário, estreitamente ligado ao aumento da produtividade do trabalho, a redução regular e substancial dos preços de retalho, a saturação máxima do mercado de consumo, o desenvolvimento dos fundos sociais de consumo e a passagem gradual de um conjunto crescente de bens vitais para a categoria de bens de consumo gratuito.

Tatiana Khabarova
Grupo Ideológico da Associação «Unidade» de Moscovo
Moscovo, Julho de 1990