sexta-feira, 20 de setembro de 2013

FINAL-Não é uma relíquia marxista ,mas um guia para a acção"

A educação da actividade revolucionária das massas

«A consciência da classe operária não pode ser uma verdadeira consciência política se os operários não estão habituados a reagir contra todos os casos de arbitrariedade e opressão, de violência e abusos, de toda a espécie, quaisquer que sejam as classes afectadas;» – sendo que devem reagir com uma visão socialista e não outra qualquer. «A consciência das massas operárias não pode ser uma verdadeira consciência de classe se os operários não aprenderem, com base em factos e acontecimentos políticos concretos e, além disso, necessariamente de actualidade, a observar cada uma das outras classes sociais em todas as
manifestações da sua vida intelectual, moral e política; se não aprenderem a aplicar na prática a análise materialista e a apreciação materialista de todos os aspectos da actividade e da vida de todas as classes, camadas e grupos da
população. (…) O conhecimento de si própria [da classe operária] está inseparavelmente ligado a uma clara compreensão não só dos conceitos teóricos…
ou melhor: não tanto dos conceitos teóricos, como das ideias elaboradas com base na experiência da vida política sobre as relações entre todas as classes da sociedade actual».

Esta recomendação de Lénine, de não confundir a política com a pedagogia, deve ser lembrada hoje, em particular, àqueles que repetem obstinadamente que os operários não têm compreensão, não têm consciência nem disposição para a luta, que são corruptos, devassos, aproveitadores, etc.

As «denúncias políticas que abarcam todos os aspectos da vida são uma condição indispensável e fundamental para educar a actividade revolucionária das massas».

Por isso, a nossa tarefa, a tarefa dos comunistas de hoje, é aprofundar, ampliar e intensificar as denúncias políticas e a agitação política. A nossa tarefa é dar mais daquilo que a experiência «económica» e fabril nunca ensinará aos operários, designadamente, conhecimentos políticos. Estes conhecimentos só os intelectuais socialistas podem adquirir, e é seu dever, se forem socialistas não só em palavras, fornecer este conhecimento aos operários, não só sob a forma de raciocínios,
brochuras e artigos (que frequentemente são um pouco maçudos), mas sob a forma de denúncias vivas sobre o que fazem no presente o governo e as classesdominantes em todos os aspectos da vida, sob a forma de respostas e reacções a estes actos.

As acusações de passividade e reaccionarismo dos operários não são mais do que indicadores da passividade, inacção e inconsistência dos próprios ideólogos e dirigentes que não cumprem o seu papel e limitam a sua actividade. Conclui-se pois que em vez de se queixarem da pouca actividade das massas e serem tão pouco exigentes em relação a si próprios, em relação à sua actividade, os comunistas devem antes elevar o seu papel de organizadores e revolucionários conscientes. Não é a direcção da luta económica que nos é exigida, mas a direcção da agitação política em todos os aspectos – eis o que transforma a luta profissional no movimento revolucionário de classe. É possível fazer muito mais para a luta económica se não restringirmos os nossos objectivos políticos às necessidades da luta exclusivamente económica ou exclusivamente parlamentar.

Como vemos a crítica de Lénine no livro Que Fazer? atinge de todas as formas a fuga aos verdadeiros deveres dos revolucionários: a organização e condução de uma agitação política diversificada, em que se deve ir a todas as classes da população, como teóricos, como propagandistas e como organizadores (pois «os comunistas apoiam todo o movimento revolucionário»).

E este trabalho teórico «deve orientar-se para o estudo de todas as particularidades da situação social política das diferentes classes». Disto, como salienta Lénine, ninguém deve duvidar.

Sobre os princípios organizativos     

Atrás já referimos que a estreiteza do trabalho de organização está inquestionável e inseparavelmente ligada (embora com frequência de modo inconsciente) com a restrição da teoria marxista e dos objectivos políticos dos comunistas. A inconsciência limita o nosso horizonte, incute-nos medo de nos afastarmos do carácter e nível do trabalho do partido, semi-de-massas, acessível,
habitual e tradicional.

Lénine exige a máxima consciência no trabalho organizativo, mostrando de que modo a estreiteza da concepção da luta teórica está ligada não só à estreiteza de vistas na luta política, mas também à restrição das tarefas revolucionárias. Com tal estreiteza de concepções e o culto da inconsciência «é absolutamente desnecessária uma organização centralizada (…) (que, por isso mesmo, não pode formar-se no decorrer de tal luta), uma organização que reúna num único impulso comum
todas as manifestações de oposição política de protesto e indignação, uma organização formada por revolucionários profissionais e dirigida por verdadeiros líderes políticos de todo o povo.»Tal organização não pode formar-se porque «o carácter da estrutura de qualquer instituição é determinado, natural e inevitavelmente, pelo conteúdo da actividade política dessa instituição.»

A existência de organizações cuja consciência se inclina perante a espontaneidade; «o prosternar-se perante formas de organização que surgem espontaneamente, o não ter consciência de como é estreito e primitivo o nosso trabalho de organização (…) a falta desta consciência é uma verdadeira doença do nosso movimento. Não é evidentemente uma doença própria da decadência,
mas do crescimento», considera Lénine.

Não terá o actual movimento comunista essa mesma doença? Esta conclusão impõe-se por si própria. Qual é o grau de consciência do trabalho de organização dos comunistas hoje? Não defendem por vezes alguns dirigentes partidários e organizadores atrasados formas estreitas de organização, directamente herdadas por nós do PCUS e ajustadas e adaptadas à legislação burguesa? Identificando esta doença no movimento do seu tempo, Lénine exigiu a mais intransigente luta contra toda a defesa do atraso, contra toda a legitimação da estreiteza de vistas; exigiu de cada qual que participa no trabalho prático a decisão inquebrantável de se desembaraçar desta estreiteza e do trabalho à moda antiga.

– Mas – dirão os que discordam – Lénine falava sobre o trabalho artesanal e a sua superação, enquanto nós temos um partido amadurecido, com história. – Pois aí é que está o problema – retorquimos nós. – Caminhamos por um trilho já aberto, fazemos tudo como de costume, sem pensarmos qual é a organização de que temos hoje necessidade. Aliás, Lénine entendia por trabalho artesanal uma organização insuficiente: o reduzido alcance de todo o trabalho revolucionário em geral, a falta de preparação e a falta de habilidade prática, a falta de continuidade e organização
entre determinadas frentes de trabalho, a falta de sistematização da propaganda e da agitação e, sobretudo, as tentativas de justificar esta estreiteza e erigi-la em «teoria» particular, isto é, o culto da espontaneidade. O último está de resto inseparavelmente ligado a uma concepção estreita da teoria marxista, do papel dos revolucionários e das tarefas políticas que se colocam ante eles.

Não será isto semelhante ao desejo de uma parte importante do aparelho do partido e de parte dos militantes de se agarrarem às estruturas partidárias existentes e habituais e, a partir delas, procurar uma base social e um eleitorado?

Não será isto semelhante à atitude burocrática para com a organização do partido e o seu trabalho, que continua a grassar na vida interna partidária desde o tempo do PCUS? O livro de Lénine obriga-nos a pensar nestas questões e induz-nos a reflectir sobre os resultados: «Arrastar [-se] na cauda do movimento, [é] coisa inútil no melhor dos casos e, no pior, extremamente nocivo para o movimento», avisa Lénine.

Ao resolver a primeira e mais urgente tarefa prática – criar uma organização de revolucionários –, Lénine mostrou a absurdidade e a nocividade de a misturar com a organização dos operários.

 Afirma que não pode haver movimento revolucionário sólido sem uma organização estável de dirigentes, que assegure a continuidade; que quanto mais extensa for a massa espontaneamente integrada na luta, massa queconstitui a base do movimento e que nela participa, mais premente será a necessidade de semelhante organização, e mais sólida deverá ser ela (já que será fácil aos demagogos de toda a espécie arrastar as camadas atrasadas da massa); que tal organização deve ser formada, fundamentalmente, por pessoas entregues profissionalmente às actividades revolucionárias; que a centralização das funções mais clandestinas não debilitará, antes reforçará a amplitude e o conteúdo da actividade de uma grande quantidade de outras organizações destinadas ao grande público e, por consequência, o menos regulamentadas e clandestinas possível.

Pode parecer que estas teses foram elaboradas para a Rússia autocrática e que o seu significado se limita a esse contexto. No entanto, Lénine insistiu que elas têm uma importância geral, como se constata no seu trabalho de 1919, Sobre As Tarefas da III Internacional.

 «Para vencer de facto o oportunismo(...) é preciso     

Primeiro, conduzir toda a propaganda e agitação do ponto de vista da revolução, em oposição às reformas, explicando sistematicamente às massas essa oposição, teórica e praticamente, a cada passo do trabalho parlamentar, sindical, cooperativo, etc. Em caso nenhum recusar (salvo em casos especiais, a título de excepção) a utilização do parlamentarismo e de todas as “liberdades” da
democracia burguesa, não recusar as reformas, mas encará-las apenas como resultado acessório da luta de classe revolucionária do proletariado. (…)

Segundo, deve-se combinar o trabalho legal e o ilegal. Os bolcheviques sempre o ensinaram e com particular insistência (…) Disto troçavam os heróis do oportunismo infame, exaltando fatuamente a “legalidade”, a “democracia”, a “liberdade” dos países e repúblicas da Europa Ocidental, etc. (…) 

Não há um único país no mundo, a mais avançada e a mais “livre” das repúblicas burguesas, onde
não reine o terror da burguesia, onde não esteja proibida a liberdade de agitação a favor da revolução socialista, de propaganda e de trabalho organizativo precisamente nessa direcção. Um partido que até ao presente não reconheceu isto sob a dominação da burguesia e não realiza um trabalho ilegal sistemático,mglobal, apesar de todas as leis da burguesia e dos parlamentos burgueses, é um partido de traidores e de miseráveis, que com o reconhecimento verbal da
revolução enganam o povo.

Terceiro, é necessária uma guerra constante e impiedosa para expulsar completamente do movimento operário os chefes oportunistas (…) Os partidos que em palavras são pela revolução mas na prática não realizam um trabalho constante pela influência precisamente do partido revolucionário, e só do partido revolucionário, em todas a espécie de organizações operárias de massas, são partidos de traidores.

Quarto, não se pode admitir que em palavras condenem o imperialismo, mas de facto não travem uma luta revolucionária pela libertação das colónias (e das nações dependentes) da sua própria burguesia imperialista. Isto é hipocrisia. É a política dos agentes da burguesia no movimento operário. (…)

Quinto, é uma enorme hipocrisia este fenómeno típico dos partidos (…) [oportunistas]: reconhecer em palavras a revolução e alardear perante os operários frases pomposas acerca do seu reconhecimento da revolução, mas de facto ter uma atitude puramente reformista para com os rudimentos, os germes, as manifestações de crescimento da revolução que constituem todas as acções de massas que quebram as leis burguesas, saem de toda a legalidade, por exemplo, as greves de massas, as manifestações de rua, os protestos dos soldados, os comícios entre as tropas, a difusão de panfletos nos quartéis e acampamentos, etc.


Se perguntarmos a qualquer (…) [oportunista] se o seu partido realiza esse trabalho sistemático, ele responder-vos-á ou com frases evasivas, que dissimulam a ausência desse trabalho – inexistência da organização e do aparelho necessário, incapacidade do seu partido para o realizar –, ou com declamações contra o “putschismo”, o anarquismo, etc. E é nisto que consiste a traição à classe operária (…)


Mas só hipócritas ou idiotas podem não compreender que os êxitos particularmente rápidos da revolução na Rússia estão ligados a um trabalho de muitos anos do partido revolucionário no sentido indicado, em que durante muitos anos se criou sistematicamente uma aparelho ilegal para dirigir as manifestações e as greves, para trabalhar no seio das tropas, se estudou em pormenor os meios, se redigiu literatura ilegal que fazia o balanço da experiência e educava todo o partido na ideia da necessidade da revolução, se formava os chefes das massas para semelhantes casos, etc., etc.»

Pensamos que estas teses de Lénine sobre a construção da organização de revolucionários podem também hoje servir de orientação aos comunistas. Pelo menos deve-se formar uma atitude consciente em relação a elas. Só então se poderá prosseguir na resolução das tarefas que se colocam ante o movimento operário.

Lénine, por mais de uma vez, expressou o desejo de que seria preferível ler menos os clássicos do marxismo, mas lê-los de forma mais aplicada, melhor, reflectindo mais seriamente sobre o que se lê. Não declamar simplesmente certas teses marxistas, mas saber resolver primeiro teoricamente os problemas para depois convencer a organização, o partido a as massas da justeza da decisão – eis o
que se exige de um revolucionário marxista.




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